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Publicado a: 11/10/2016

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review octa push

 

[TEXTO] Amorim Abiassi Ferreira

Ter 16 convidados num disco de 10 faixas pode ser uma premissa que convida o caos a entrar. Pode também significar que a força das músicas varie demasiado, criando assim uma obra inconsistente. O número grande de participações pode até sobrepor-se à identidade dos artistas originais. Tudo isso pode acontecer, mas é aí que os Octa Push fazem a diferença, conseguindo segurar as rédeas de um projecto que é ambicioso, tem propósito e não se acanha. Os irmãos Guichon criaram uma viagem que nos leva através do tempo, numa reunião de artistas que já fizeram o que a dupla faz agora: misturar as várias sonoridades que os países africanos de língua portuguesa têm para oferecer com a cultura portuguesa. A experiência também tem sucesso porque a estratégia já tinha sido testada no álbum anterior, Oito. O que marca Língua como uma peça diferente é o foco que mostra na sua trip e despreocupação na criação do próximo êxito preparado para ir para a rádio.

Claro que uma viagem tão arriscada pode ter algumas paragens mais fracas, tal como no caso de “Intro / Fogo”, que parece sempre leve demais para o seu ritmo acelerado ou “Xilofone Teteté”, cujas vozes repetidas tornam-se cansativas. No entanto, momentos como a sequência de “Trips Makakas” e “Gaia Cósmica” mostram a influência que os convidados trazem para cada faixa. Passar do dobro de Tó Trips, com o seu som metalizado, que se coloca em primeiro plano no último minuto da música, para a voz suave e quente de Cachupa Psicadélica é certamente memorável. Merece também destaque “LGS – LX”, a mais nocturna das faixas do disco, que conta com uma firme participação de AF Diaphra e que mostra que, até em registos mais obscuros, a abordagem dos Octa Push tem muito por onde explorar.

A riqueza deste disco não está toda à superfície e, como é normal, tudo o que vá beber ao passado encerra em si camadas a descobrir. Um óptimo convite a voltar a visitar a obra que, com as repetidas escutas, vai assumindo contornos mais definidos. Os Octa Push mostram que podem mesmo ter oito braços para conseguir manter tantas influências em ordem. Língua é um álbum que, tocado pelo legado de Zeca Afonso, escreve a história de como — após mais de 40 anos de independência das colónias — há ainda tanto a descobrir na riqueza de sonoridades dos países de expressão portuguesa.

 


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