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Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 02/06/2023

Meu Kamba Jazz, Volume Um foi lançado há uma semana.

Rocky Marsiano: “Foi a primeira vez que fiz um disco a pensar como é que o iria apresentar ao vivo”

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 02/06/2023

O projecto de Rocky Marsiano soma quase 20 anos e Marko Roca lançou há uma semana o mais recente capítulo da saga, Meu Kamba Jazz, Volume Um. Em entrevista ao Rimas e Batidas, o músico descreve o novo disco como símbolo de um “círculo completo”, como “ponto de encontro” entre a origem de Rocky Marsiano — uma fusão entre hip hop e jazz e tudo aquilo que os álbuns de Marsiano se tornaram desde então, com música africana e latina de diversas latitudes.

Tratava-se de uma ideia com algum tempo e que acabou por nascer com um concerto em 2022. “Tal como aconteceu com o Gingando na MPC, que comecei a fazer para apresentar ao vivo e depois resolvi fazer um disco, o mesmo aconteceu com este álbum quando fui convidado para fazer uma atuação nas Noites Azuis do Rui Miguel Abreu”, explica. “Pensei que tinha de fazer uma coisa nova, original e diferente. Comecei a brincar e a estruturar alguns dos temas que depois acabaram por estar no álbum. A pensar como é que iria fazer isto, um casamento feliz entre baixos de jazz mas ao mesmo tempo com uma bateria afrobeat. Como é que isto pode acontecer de maneira orgânica para apresentar ao vivo? Não estava a pensar no disco. Foi a primeira vez que fiz um disco a pensar como é que o iria apresentar ao vivo. O que me acontecia antigamente é que fazia um disco e depois é que pensava: ‘eh pá, como é que vou fazer isto ao vivo? Tenho demasiados samples, não há muito espaço para os músicos’. Agora foi ao contrário. Foi fazer a parte do ao vivo primeiro, ver quais temas é que funcionam ou não ao vivo…”

Rocky Marsiano considera-o o seu “melhor disco” até à data, até por representar “um passo numa direção nova”. Por exemplo, foi a primeira vez que o artista trabalhou com um baterista, Alex Figueira. “Trabalhei sempre com percussão, sopros ou guitarra, mas a parte da bateria era sempre programada ou samplada. Desta vez, mais de metade do disco é tocado com bateria orgânica. Por isso é que também o considero o meu melhor disco, por os temas serem bastante diferentes uns dos outros, mas ao mesmo tempo haver elementos como a bateria tocada ou os sopros, que fazem com que soe como um álbum, como uma unidade.”

Os samples continuam presentes, mas não são evidentes nem têm a preponderância de outrora. “É um disco com muitos samples mas onde os samples não são o disco, como foi nas The Pyramid Sessions, em que os samples é que contavam a história do disco. Aqui os samples são uma parte importante, mas ao mesmo tempo há muitas linhas de baixo que toquei ou programei. Há muitos acordes que programei. E obviamente a inclusão dos instrumentistas faz com que os samples que lá estão sejam mais um elemento que faz parte de um todo. Já não é como antigamente, em que tinhas um sample e depois construías tudo à volta disso.”

Além do baterista Alex Figueira, Rocky Marsiano trabalhou com o guitarrista Vicente Booth e o percussionista Toni Duarte, enquanto Francisco Bettencourt esteve a cargo dos sopros, como o saxofone e a flauta. Fumi e Georgi Milev também gravaram guitarras para o disco, e Bruce James cantou e tocou algumas teclas. Na base estiveram os samples ou acordes tocados por Rocky Marsiano, que depois convidou os instrumentistas para acrescentarem camadas sonoras.

“O groove é o ponto de partida aqui. Às vezes pode ter nascido de samples cortados com coisas que programei e coisas que foram tocadas. Construí um groove e a partir daí é que a importância do sample foi diminuindo ou aumentando, ou a importância do baixo… Cada tema teve uma origem completamente diferente e separada do outro, isso também foi engraçado. Porque, como os construí para os fazer ao vivo e para cada tema ter uma vida própria, decidi traduzir isso para o disco. Nalguns temas a percussão foi tocada antes de estar lá a bateria, e também é uma coisa que aconteceu organicamente… Por exemplo, com o Alex eu não lhe disse: ‘vou-te mandar um tema e quero que toques uma bateria assim ou assado’. Foi: ‘Alex, eu sei quem tu és, toma lá este tema, tens carta branca, faz a tua cena’. E depois ele mandava-me e eu ficava sempre surpreendido pela positiva. Portanto, nalguns temas havia só linhas de baixo. Depois foi tocada percussão. As flautas, as guitarras e os saxofones foram a última sessão que fiz, isso já foi tudo gravado em cima dos temas quase acabados. Mas o resto foi um bocado um híbrido entre um esboço e algo mais acabado. O meu trabalho final foi fazer com que tudo soasse como se tivéssemos gravado ao mesmo tempo no estúdio.”

A mistura, adianta, foi um “desafio” particular tendo em conta o número de elementos sonoros que se cruzam nestas 10 faixas. “O desafio maior na mistura foi a bateria, porque não estava habituado. Mas o importante é encontrar um equilíbrio que faça sentido.”

Perguntamos-lhe, também, como procura a tão desejada diversidade num álbum como este. “É como eu sou. Depois destes anos todos, já não sou o D-Mars que faz os beats e dá umas rimas. Sou o D-Mars que é o Rocky Marsiano que é o Marko Roca. E no meu dia a dia oiço house, muito hip hop, música brasileira, faço o programa na Oxigénio que me obriga a procurar música nova do mundo… Depois a onda toda do jazz que se tem feito nos últimos anos por gente nova… Obviamente muitos deles cresceram a ouvir hip hop e se calhar até descobriram o jazz através do hip hop, fusão no qual fui pioneiro em Portugal em 2005. Mas no fundo o hip hop vai sempre continuar a ser a raiz. Não só porque foi assim que descobri o jazz, através do sampling, mas foi como cresci enquanto artista. O resto foi nascendo dali.”

Agora, existe a clara vontade de levar este disco para mais palcos, existindo já uma banda montada. “Agora é uma questão de ter tempo, paciência e alguém que possa levar o projecto ao vivo de uma maneira mais aprofundada. No início de Rocky, tocámos muito ao vivo, quando tinha a MPC antiga. Só que agora consigo fazer muito mais coisas, tenho a experiência do passado, de saber o que não quero repetir e manter sempre muito o elemento da improvisação ao vivo, para que cada concerto seja diferente. Existem muitas coisas que se podem fazer. Podemos convidar MCs, alguém para fazer scratch, alguém para tocar som nalguns temas como músico extra convidado…”

Como o próprio disco dá a entender, um segundo volume já se encontra a ser preparado. A ideia passa por “levar isto para um sítio ainda mais inesperado” e contar com mais vozes. “Quero experimentar outras coisas. Para já estou a levá-lo para um certo lugar mas de repente pode dar-me na cabeça e fazer um U-turn… Estou a curtir a direção, mas não quero que o disco todo soe só a alguma coisa. Quero que seja parecido ao volume 1 nessa característica, de de repente estar lá um tema de jazz house que acho que ninguém esperava ouvir neste álbum… Ainda por cima é o meu preferido.”

Questionamos também Rocky Marsiano sobre se a série de trabalhos Meu Kamba, no fundo, pode ser infinita, repleta de possibilidades criativas sem fim. “Claro que sim. Acho que depois disto o que vou fazer é o Meu Kamba Rap, fazer o álbum onde convido MCs para rimarem por cima de beats que nem sei como vão soar [risos].”


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