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Publicado a: 14/11/2018

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[TEXTO] Moisés Regalado [ARTWORK] Deck 97

“Bed-Stuy, Flatbush, Brownsville, Crown Heights, where the music feels good and it sounds right”. O novo longa-duração de Masta Ace, inteiramente produzido por Marco Polo, não começa exactamente por lá mas é nos bairros de Brooklyn que se desenrola. A história — ou não fosse este um disco de Masta Ace, que as conta como ninguém — tem início em Toronto, cidade natal do produtor de serviço, e, antes de homenagear um dos icónicos five boroughs, resume o percurso do jovem Marco Bruno, com partida no Canadá e paragem definitiva numa das incubadoras do movimento hip hop — porque o parto foi no Bronx.

Para lá do bairrismo que une as peças, a força de A Breukelen Story está nas homenagens, aos da terra mas não só: “Gimme Prem, Marcos or gimme Dres/Gimme Pete Rocks or gimme Blaze/Big up Jazz Jeff, he from Philly where Gillie stays”. “Still Love Her” trata o hip hop por tu e no feminino, “Corporal Punishment” dá nova vida a uma das icónicas colaborações entre Phat Kat e J Dilla, há samples de Method Man e referências a Gang Starr, B.I.G. ou Spike Lee.

Também há espaço para a crítica, que nunca fica demasiado feroz ou despropositada. Tudo bem que Masta Ace diz coisas como “She started sippin’ syrup, started poppin’ E” mas remata sempre com tiradas como “But I really can’t treat her like my property”. Nada mau para quem, em actividade desde os anos 80, já viu tantas transformações e respectivas consequências na primeira pessoa, sem nunca abandonar a fila da frente. Mas o conteúdo, concorde-se ou não, só interessa e tem relevo porque a forma não desilude.

As palavras até podiam ser outras mas não há enganos possíveis. Nota-se a léguas que Marco Polo cresceu a ouvir o que então se fazia por Nova Iorque e, sobretudo, que Masta Ace cresceu a fazê-lo. Há muito que a caneta de Duval Clear está domesticada e não é preciso ir muito longe para perceber a origem do seu flow, quando, à quarta faixa de A Breukelen Story, começa a desfilar o mais típico dos raps nova-iorquinos:

“Can’t stop, you got shot, the doc bandagin’
Meanwhile, I’m in Spain up in a Spanish inn
Bad cutie with the tannest skin, then
We tellin’ the bartender give us ya best brand of gin”

A Breukelen Story não é o melhor disco de Masta Ace ou Marco Polo mas talvez venha a ser uma obra essencial nas discografias de ambos e nas estantes de quem os segue. Os momentos menos marcantes, e que são poucos — como “Sunken Place” e “God Bodies” –, não tiram significado algum a viagens no tempo como “American Me” ou “Count Em Up”, tão yankees quanto possível, ou a surpresas como “Wanna Be”, com a participação de um desconhecido mas acutilante Marlon Craft.

Mas o melhor só está, como pede qualquer clássico, no fim. Em “The Fight Song”, que entra directamente para o top de qualquer ouvinte dedicado, há espaço para Masta Ace brilhar, papel de que até se costuma abstrair, sem que isso tire protagonismo à excelente prestação de Pharoahe Monch, que este ano também já tinha feito das suas em “I Keep On”, com Apathy e Pete Rock. Se é verdade que o rap está hoje mais plural do que nunca, é bonito ver que a diversidade parte, também, da raiz. Nada contra Chicago ou Atlanta, longe disso, mas não há estórias como estas.

 


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