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Publicado a: 20/02/2017

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[TEXTO] Amorim Abiassi Ferreira [FOTO] Direitos Reservados

Há dois anos, Jonwayne acordava num hotel com a garganta a arder, resultado da crescente dependência do álcool, e percebeu que tinha batido no fundo. Após ter perseguido o que sempre quis, o artista estava mais desequilibrado do que nunca, derrubando com ele um conjunto de oportunidades e relações na indústria e pondo cada vez mais a sua saúde em causa. Seguiu-se um exílio auto-imposto que o fez cancelar uma tour e desaparecer dos olhos do público sem grande justificação até ter feito o anúncio do novo projecto: Rap Album Two.

 


“I open up a vein and a let river run through it / You call it music (that’s close enough).” – “Ted Talk”


O MC sempre teve uma abordagem bastante crua à sua voz, evitando ad-libs e estilizações vocais. Neste disco, ele leva isso ainda mais longe, insistindo gravar todas as faixas em apenas um take, fruto de repetição exaustiva, tudo em nome do tema-chave: a empatia. Essa mesma empatia só é atingível com vulnerabilidade, assumida directamente em “Out of Sight”, faixa com um beat construído em torno da melodia de uma caixa de música ou, mais indirectamente, em “The Single”, tema em que se ouvem três takes falhados que nunca chegam a ser completados.

Sendo rapper e produtor, é tentador assumir que Jon Wayne, nome real do artista, é uma máquina que se move a solo. Este álbum não revela um elenco grande nos créditos – o número de convidados é bastante limitado. Contudo, a amizade é um foco do disco, crucial no processo de redenção. Todas as colaborações surgem naturalmente e é difícil imaginar este projecto sem elas. Com isso, é mais que justificado então que “These Words Are Everything”, uma conclusão em formato autobiográfico em que cada verso representa uma década, tenha sido produzido pelo amigo e mentor Dibia$e.

 



Rap Album Two é composto por muitos elementos poéticos e sónicos e nenhum se encontra fora do seu lugar. De momentos sentidos como “Afraid of Us”, até às cuidadas transições entre músicas que tiram proveito do formato conceptual do disco. Em “City Lights”, começa a chover e essa chuva persiste durante os primeiros segundos de “Rainbow”, justificando o nome da música. Existem outros momentos preciosos: a segunda parte de “Blue Green” em que Low Leaf canta: “I’ve been running through these hills now” e a forma como se transforma no interlúdio “Hills” em que Zeroh canta: “I’ve been running up the hill now” sobre a produção turbulenta de Jonwayne. E o álbum pode ter um nome genérico, mas a história não podia ser mais específica. E só poderia ser assim caso o ex-membro da Stones Throw Records pretendesse cumprir o seu objectivo: relatar de forma tão pessoal a sua queda que quem o ouve possa sentir como suas estas confissões. 

 


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