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Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 13/12/2023

O colectivo berlinense celebra o legado da Strata Records nos palcos nacionais.

Jazzanova: “Nos últimos 10 anos assistimos a uma renovação do interesse pelo jazz”

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 13/12/2023

Stefan Ulrich, trombonista e director da banda que carrega o nome Jazzanova nos palcos, assumiu o lugar de outro Stefan, Leiserig, produtor e membro fundador do colectivo berlinense que há duas décadas e meia agita pistas e auscultadores por todo o mundo, e falou ao Rimas e Batidas para antecipar a tripla passagem do seu grupo por Portugal. Os Jazzanova apresentam-se no palco da sala Lisboa ao Vivo já esta sexta-feira, dia 15, seguindo depois para Guimarães para concerto no Centro Cultural Vila Flor, dia 16, e terminando o périplo na Casa da Música, no Porto, dia 17. Um presente de Natal antecipado não apenas para os fãs de longa data do colectivo alemão que deu um importante contributo para a redescoberta de muitas pérolas do jazz.

Recentemente, em colaboração estreita com o reputado coleccionador, curador e DJ Amir Abdullah, que tem vindo nos últimos anos a relançar a música do pequeno catálogo da editora de Detroit, Strata Records (não confundir com a Strata East), os Jazzanova pegaram em peças-chave das obras de Kenny Cox, da Lyman Woodard Organization ou Maulawi — originalmente apresentadas em raros registos hoje muito valorizados no mercado coleccionista global — e insuflaram-lhes nova vida com gravações que foram reunidas no álbum Strata Records (The Sound Of Detroit Reimagined By Jazzanova). Esse é o trabalho que o colectivo alemão trará até aos palcos portugueses.



Muito obrigado por tirares um tempo para falar comigo. Eu gostaria de começar por te perguntar qual vai ser a banda que vão trazer até Portugal para estes concertos? Quem vai estar no palco?

Neste momento, para estes espectáculos no âmbito do Strata Records (The Sound Of Detroit Reimagined By Jazzanova), temos 3 sopros, teclas, guitarra, bateria, baixo… Eu vou estar a tocar trombone, a dirigir a electrónica e a cantar. Somos 9 elementos. Por norma somos 10, mas o Stefan, o fundador de Jazzanova, está doente de momento e não se poderá juntar a nós. E é essa a razão pela qual estou eu a conceder esta entrevista — ele não consegue fazê-lo. Vou fazer os possíveis para te conseguir transmitir todas as informações, mas não sou um membro fundador de Jazzanova — sou, digamos, o líder da banda. Mas de certeza que te consigo passar umas coisas que serão úteis para esta entrevista.

Espero que o Stefan melhore o mais rápido possível.

Certamente.

É engraçado teres falado nisso, porque eu olho para Jazzanova como um “monstro” de três cabeças. Existem os produtores que passam mais tempo em estúdio, a banda que toca ao vivo e os DJs. Vocês conseguem apresentar-se em diferentes contextos e formatos. Em relação à banda que dá os concertos, em que medida é que ela é informada pelos outros dois registos dentro deste universo de Jazzanova? Até porque o projecto começou como um colectivo de DJs e, por isso, presumo que os discos tenham sido uma parte muito importante naquilo que foi o definir do universo de Jazzanova. Vocês têm o hábito de escutar discos juntos? Isso foi, por exemplo, importante para vos ajudar a inspirarem-se para este projecto da Strata Records?

Essas vertentes já não estão assim tão interligadas. Os DJs estão a fazer a sua cena, a tocar pelo mundo inteiro. Um dos produtores fundou o seu próprio estúdio, onde tem gravado grandes artistas internacionais e tem tido muito êxito. O Stefan compõe connosco. As coisas estão um bocado desconectadas. Diria que aquilo que as liga é o facto do Stefan ainda ser um fanático de discos e que faz questão de ir a todas as lojas de discos perto dos locais por onde passamos. Essa cena com os discos ainda existe.

Os músicos da banda que tu lideras, é tudo malta vinda de outros projectos da cena de Berlim? Como é que tu fazes para recrutar esses músicos com quem tocas?

As coisas começaram em 2009. O Paul Kleber, que é nosso baixista, julgo que tocou em alguns discos antes de entrar para Jazzanova. Foi ele quem recrutou a malta quando surgiu a oportunidade de levar Jazzanova para os palcos. Nessa altura, o director musical era o Sebastian Studnitzky. Eles andaram a falar com os músicos que conheciam e com quem já tinham trabalhado. Eu era um deles. Inicialmente, fui chamado como substituto para um outro trombonista. Ele foi para os Estados Unido da América e deu a entender que não voltaria para a Alemanha. Então, passados uns 3 ou 4 concertos, ficou claro que eu iria ser o trombonista principal. O resto do pessoal, julgo que já conheciam Jazzanova através de sessões de estúdio anteriores. Ao longo dos anos, foram sendo recrutados para a banda.

Para este projecto da Strata Records, tu ficaste responsável pela criação de alguns dos arranjos?

Sim. Eu liderei os músicos e ditei a direcção dos arranjos. Escrevi coisas e trabalhei com a banda. Para o Stefan foi uma coisa um bocado nova, mas fizemo-la juntos. Escolhemos as faixas das quais mais gostámos e vimos o que conseguíamos fazer com elas. Eu levei a banda para uma sala e ensaiámos, afinámos as coisas. É claro que a própria banda também deu o seu contributo. Por norma, o que se faz é: escreve-se, faz-se uma demo para que todos percebam qual a direcção a seguir e depois seguimos todos juntos a partir daí. Acaba sempre por ser um esforço conjunto.

Quando assistimos a um espectáculo vosso, quanto do vosso material está escrito? Há espaço para a improvisação?

A nossa abordagem é muito jazzística e tem muitos solos improvisados. Nós somos muito abertos nesse sentido. Podes contar com isso nas nossas actuações.

Imagino que já tenham dado muitos espectáculos em torno deste projecto da Strata Records. Como têm sido as reacções quanto tocam este reportório?

O reportório é um bocado obscuro e a editora não é assim muito conhecida. Por isso, tu notas mesmo quando as pessoas gostam deste tipo de coisas e quando estão mesmo a escutá-las com atenção. Por norma, as pessoas não sabem bem com o que contar. A nós, demorou um bocado até conseguirmos encontrar a linha certa para estes espectáculos, de modo a que eles sejam atractivos para um público que possa não estar tão ligado ao jazz e à profundidade da música de Detroit. Eventualmente conseguimos alinhar as coisas e elas funcionam muito bem.

Em que tipo de eventos em que vocês têm tocado? É muito à base de festivais de jazz ou também têm conseguido saltar para fora desse circuito?

Fizemos bastantes festivais de jazz, na verdade. Mas também temos muitos espectáculos em clubes. Quem nos agencia tem-se esforçado imenso para vender as nossas actuações e não tem sido fácil, porque as pessoas esperam algo diferente de Jazzanova. Mas tem sido uma experiência boa que tem funcionado muito bem. Acho que vocês também vão gostar muito. Estes vão ser os nossos últimos concertos neste registo. Para o ano vamos estar a fazer coisas novas.

Quem não vos apanhar agora, vai perder isto para sempre.

É isso [risos]. Diria que alguns dos temas possam transitar para espectáculos futuros. Não vamos propriamente riscar tudo e fazer algo inteiramente de raíz. Há coisas que vão sobreviver. Mas, como sabes, há alturas em que temos de reinventar as apresentações.

Apesar de não estares no projecto desde o início, os Jazzanova já cá andam há tempo suficiente para terem assistido ao desaparecimento e reaparecimento do jazz dos gostos de um público mais jovem. Em Portugal até é bastante recente esta ideia de poder ver um espectáculo do género do vosso num ambiente de clube. Nós apenas conseguíamos ver este tipo de coisas em festivais de jazz. Agora, as coisas estão a abrir-se e há uma audiência maior. Isso surpreende-te, o facto de o jazz se estar a renovar continuamente e a apelar a cada vez mais pessoas?

Não me surpreende. Há muitas pessoas a manter o jazz vivo e a trazer coisas novas. Nos últimos 10 anos, diria que tem havido uma grande renovação do interesse, com muita malta nova a trazer outras ideias, especialmente no Reino Unido — mas também um pouco por todo o mundo. Por isso, não estou surpreendido. E fico feliz por saber que isso também se está a enraizar em Portugal. É bom.

Mencionaste que estes serão dos últimos espectáculos que fazem em torno do projecto da Strata Records. O que é que 2024 vai trazer para Jazzanova?

Estamos neste momento a construir um novo alinhamento que orbita em torno do In Between, que celebrou o seu 20º aniversário no ano passado. Agora queremos focar-nos nisso. Também espero que 2024 traga outras coisas novas que estão um bocado dependentes do estado de saúde do Stefan Leisering. Agora estamos a trabalhar neste espectáculo que revisita o In Between e tem sido um grande desafio, porque esta música foi construída no estúdio com um computador Atari e um sampler. Há algumas que são fáceis, mas há outras muito complicadas e intrincadas, coisas muito bem produzidas que nos trazem algumas dificuldades no momento de as transpormos para arranjos para serem tocados por instrumentos reais. É preciso equacionarmos outras abordagens para chegarmos ao ponto em que tudo funciona em palco. Esse é o desafio que nos espera para as próximas semanas.

Espero que também consigam trazer esse concerto até Portugal num destes dias.

Absolutamente!


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