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Texto: ReB Team
Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 27/04/2024

O EP conta com meia-dúzia de temas.

Faixa-a-faixa: HOMNiA, de FeMA., explicado pelo próprio

Texto: ReB Team
Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 27/04/2024

Dois anos após o seu EP de estreia, FeMa. lançou a 5 de Abril um novo disco, HOMNiA, um trabalho de grande fluidez entre géneros musicais que tanto vai ao cancioneiro popular português como ao hip hop, à electrónica e ao funk brasileiro.

A mensagem é parte essencial do projecto artístico de Diogo Félix, que apela a uma maior ligação entre humanidade e natureza, e se mostra revoltado com o ódio e a sociedade de consumo. Para colocarmos os pontos nos i’s, desafiámos FeMa. a assinar um faixa-a-faixa no Rimas e Batidas.


[“Dança”]

Esta primeira faixa é toda ela em si um contraste e um sentimento dúbio. A faixa chama-se “Dança” e de facto o ritmo da batida de funk brasileiro dá ênfase a esse movimento de dança, mas a melodia da voz dá-nos um sentimento de que esta dança é uma dança diferente. Esta música fala sobre a procura da resolução de problemas internos em prazeres e soluções externas. Na procura externa, mesmo quando “já chegou a dança”, interiormente a dança não chegou e continuamos a sentir o nó dentro de nós.

Fico extremamente feliz por ter conseguido trazer uma sonoridade nova para as minhas músicas, algo que procuro continuar a fazer em projectos futuros: juntar sonoridades que não costumam ser ouvidas juntas.


[“Feliz Mente In Feliz Pt.1”]

Esta nasce de uma situação caricata. Um dia acordei e o meu computador tinha encravado num loop de um segundo de uma música dos Radiohead, que neste momento não me recordo qual era. Gravei, manipulei e a intro da música nasceu. Depois, sem mais nem menos, saíram-me as palavras da boca “nasces, fazes, morres, repete”, talvez por me encontrar num momento reflexivo sobre qual seria o nosso sentido como humanos e o significado da nossa vida que, a meus olhos, se tem tornado mais controlada pela necessidade de produzir e não pela necessidade de viver, amar e simplesmente estar. Tanto este tema como o seguinte nasceram há dois anos num período em que o hip hop de artistas como Tyler, The Creator, Kendrick Lamar e Frank Ocean era o que estava mais presente nos meus dias, e assim nasceram duas faixas em que o hip hop é o elemento de referência.


[“Feliz Mente In Feliz Pt.2”]

Esta música foi a primeira a ser feita para este EP. Ao ouvi-la novamente, consigo notar imensas parecenças aos meus trabalhos anteriores. Toda ela tem um tom mais dark, lento e introspectivo. Foi em Outubro de 2022 que esta música nasceu, lembro-me de estar num estúdio que tinha criado na altura no sótão da minha avó e de ficar extremamente feliz quando a comecei a fazer, pois estava numa seca criativa de quase um ano e foi com uma guitarra em reverse que esta música nasceu. Nessa altura, com a ajuda da minha irmã mais velha, Sara Félix, a quem eu pedi para escrever um texto sobre depressão e ansiedade, saiu a letra deste tema, toda ela uma interpretação partilhada sobre a influência e poder que estas perturbações causam na nossa vida e como finalmente longe delas “deito as sentenças cá para fora”.


[“Vontade, vontadinha”]

Esta música nasceu de um texto escrito numa manhã após dormir no meio de uma serra na região alentejana no Pego das Pias. Nessa manhã, pelas seis da manhã (acordei cedo porque estava a acampar de forma selvagem e tinha medo que a polícia nos multasse) propus-me a sentar-me numa rocha, absorver a natureza e ao mesmo tempo comecei a divagar sobre a dualidade entre o medo do desconhecido e a sensação de liberdade e renascimento que o nascer do dia traz, sendo também uma divagação de como os nossos desejos e vontades nos controlam e uma reflexão de como esta procura será sempre algo que distancia o ser humano da natureza.

Esta música já nasceu de uma fase nova da minha criação musical, em que comecei a focar-me mais em sonoridades portuguesas e do tradicional português. O fado talvez seja a maior inspiração no momento de criação desta música, mas também o cancioneiro popular. O instrumental nasceu numa sessão nos estúdios Arda. Após ter gravado a melodia da voz, o João Valente que se apresenta artisticamente como Polivalente começou a pôr camadas de sintetizadores e beats e assim nasceu o lado mais electrónico desta música. Toda ela foi uma viagem incrível.


[“O Mudo”]

Talvez a música mais pesada em termos de mensagem deste EP. Lembro-me de que a primeira vez que a toquei ao vivo não consegui acabar de tocá-la porque comecei a chorar. Esta música nasce da minha revolta ao absorver diariamente o caos odioso que o mundo se tem vindo a tornar, as mortes inocentes para guerras de pessoas que já se esqueceram que todos somos humanos, o discurso odioso que tem vindo a proliferar na nossa sociedade, a destruição maciça que o ser humano tem feito no nosso planeta ignorando a natureza, etc. 

Esta música fala sobre “O Mudo”, e o mudo somos todos nós que ficámos sem voz e perdemos a capacidade de lutar pelo bem. O mudo são todas as pessoas que sabem o que está a acontecer mas deixam-se andar porque estão demasiado vidradas nas suas vidas. O mudo são também as pessoas a quem foram tirados os direitos de se poderem defender e lutar por elas. O mudo é quem está no poder e cala-se perante a luta de milhões de pessoas que sofrem e pedem por melhores condições e direitos. Enfim, o mudo é toda a humanidade que destrói a sua própria casa e todos os seres com quem a partilha.

“O Mudo” nasce de um sample de uma música de um amigo meu italiano que se chama “Butterflies”. Essa música fala sobre como o ser humano em comunidade é lindo, como o amor é o que nos une e como o futuro só poderá vir da partilha e comunhão entre humanos e natureza. Por contraste, “O Mudo” fala sobre os “gritos que ninguém nega” e de como “o Mudo lá sossega no papel principal” ignorando tudo e todos.


[“HOMNiA”]

Homónimo ao EP, “HOMNiA” termina o meu novo trabalho com um apelo à acção e à mudança, e não havia melhor forma de o acabar com “não somos o a seguir”. “HOMNiA” é uma marcha física que começa pela reflexão sobre o mundo atual e termina com um grito pela mudança, grito que sei que continuará a ser ecoado por todos nós.

Num ano que marca os 50 anos do 25 de Abril e, inserido no contexto atual do mundo, onde temas como guerra, falta de liberdade, privação de direitos e romantização do ódio são recorrentes, este tema nasceu da necessidade de gritar pela mudança — o ímpeto de lutar por um mundo mais empático, livre e comum. É a minha música mais interventiva e fico extremamente feliz por a ter lançado num mês que tanto representa a luta pela liberdade e igualdade.

Com sonoridades que misturam o shoegaze trazidos pela Camila — guitarrista e amiga que tem vindo a acompanhar o meu projecto ao vivo —, música de intervenção e o noise, com este tema procurei evocar um sentimento desconfortante, aliando-o às palavras de esperança por um futuro melhor… E também chorei na primeira vez que toquei esta música.


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