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Publicado a: 25/07/2017

Tyler, The Creator: um futuro cada vez menos estranho

Publicado a: 25/07/2017

[TEXTO] Gonçalo Oliveira [FOTO] Direitos Reservados

Tyler Okonma é, sem dúvida, um dos mais raros e especiais casos de sucesso na industria musical. Flower Boy foi o álbum que editou na passada semana, agora que conta 26 anos, e é mais um grande feito na sua já considerável carreira.

Já passou mais de uma década desde que o mentor da Odd Future começou a delinear as primeiras batidas. E embora o seu seu currículo aponte para “apenas” 5 projectos editados a solo, é importante destacar o extenso trabalho de bastidores que Tyler tem vindo a desenvolver e, claro, o enorme peso que cada uma dessas edições representa na cultura do hip hop.

O seu percurso tem sido bastante peculiar facto que se tornou evidente logo com Bastard. Sem meias medidas, Tyler introduz o seu projecto de estreia com uma dose de “fuck’s” dirigidos a algumas das publicações do universo do hip hop que constantemente lhe negavam atenção. Um statement bastante forte, que só poderia vir de alguém que estava disposto a romper com os mais convencionais caminhos da industria através de uma plataforma 100% self-made. Tyler, juntamente com Hodgy, Left Brain, Jasper e Casey Veggies, tinha recentemente criado o colectivo agitadir Odd Future, e o mercado do hip hop independente nunca mais foi o mesmo.

 



A sua liderança, e posterior ascensão, estão directamente ligadas ao aparecimento de outras pequenas grandes estrelas que circulam na orbita mais desalinhada da música norte-americana. Sem ele poderiam-nos ter escapado do radar nomes como o do mágico e enigmático Frank Ocean, a eterna lenda do liricismo Earl Sweatshirt ou o reinventor do boom bap Domo Genesis. Bem como um sem número de ideias protagonizadas pela Odd Future que vieram mudar por completo as regras do jogo do rap.

Actualmente, falar em OFWGKTA deixou de ser sinónimo de falar apenas de música. Do grupo nasceu uma editora, e da editora nasceu uma marca. Hoje a Odd Future detém trunfos em vários segmentos do mercado: da roupa às edições musicais, da televisão aos festivais, das aplicações para smartphone às redes sociais. E “o Criador” tem um peso determinante em tudo isso. É dele que nascem os conceitos visuais para muitas capas, vídeos e peças de vestuário. É ele quem mexe os “cordelinhos” ao ponto dos grandes nomes do hip hop se quererem associar ao movimento. Tal como é ele que marca presença em inúmeras edições musicais da Odd Future Records, enquanto rapper ou mesmo como produtor.

E se Bastard vinha denominado como mixtape, a verdade é que o projecto de estreia de Tyler teve um sabor bastante idêntico ao de um álbum. Muito por culpa do próprio Tyler, que não abdicou de nenhum pormenor técnico só por Bastard se tratar de uma mixtape, e não poupou na produção e no detalhe que empregou no trabalho que o viria a colocar debaixo de olho de algumas das principais publicações musicais. A Pitchfork, por exemplo, foi uma das entidades a jogar na antecipação e a oferecer a Tyler um bom começo, com a atribuição do 32º lugar na lista anual de melhores projectos referentes a 2010.

 



Uma das fortes imagens de marca na produção de Tyler, The Creator é o toque minimal com que aborda os seus instrumentais, sem nunca comprometer o brilho e a qualidade do beat onde a sua voz vai assentar. O computador ganha destaque ao correr contra os instrumentos e as peças de maquinaria musical. Os softwares e plugins de instrumentos virtuais fazem o uso dos samples passar para um segundo plano, abordando a arte do beatmaking de uma outra perspectiva. O resultado nota-se logo em Bastard, com o seu registo a posicionar-se num estranho mas doce limbo entre a electrónica mais experimental e o hip hop mais tradicional.

Também na arte da escrita lhe conseguimos desde cedo encontrar algumas diferenças para com o restante rap que se vinha a praticar. Algo que o próprio Tyler vai referindo nos seus temas e entrevistas. Uma atitude bastante punk, a de ir contra as tendências que se começavam a tornar enfadonhas. Não estaríamos já todos um pouco cansados de ouvir rimas de ostentação onde se louvam carros, jóias e mulheres? Tyler decidiu arranjar algo para relatar que só ele conseguiria proferir: rimar sobre o seu próprio ser. Da piada mais mórbida e nonsense que a sua parvoíce alcança, à mais profunda das desgraças da sua vida onde aponta ao seu défice de atenção ou à ausência do pai que nunca chegou sequer a conhecer.

A sua estreia a solo seria tão boa, ao ponto de um dos mais importantes selos para a música electrónica independente se apressar a convencê-lo a editar o primeiro álbum. Goblin viria carimbado pela prestigiada XL Recordings e o mundo rendeu-se ao talento do jovem Tyler. “Yonkers” foi um clássico instantâneo para o hip hop da nova geração, tema de maior destaque em toda a sua carreira. Polémicas à parte, com as referências a B.o.B. ou Bruno Mars, todo o tema vem envolto numa espécie de horrorcore, acompanhado por um dos mais minimais e brilhantes vídeos desta era digital.

 



Wolf marcou a sua estreia pelo seu próprio selo editorial, depois de, em 2011, o colectivo Odd Future ter evoluído para o formato de editora, numa parceria feita com a Sony e a RED Distribution. O sucesso já acompanhava Tyler e isso reflectiu-se nas vendas do álbum, que o elevaram ao último lugar do pódio da tabela da Billboard 200 na semana do lançamento. Sonicamente já podíamos sentir o rapper e produtor mais maduro, bem mais próximo dos seus registos actuais. O cunho experimental e obscuro dava lugar a composições mais floreadas e melódicas, com um maior sentido de orientação no que toca a fazer temas. Além de nomes já habituais como Frank Ocean ou Earl Sweatshirt, na lista de convidados já começavam a surgir outros protagonistas de maior dimensão como Pharrell ou Erykah Badu.

Antes de chegar a Flower Boy, Tyler manteve a fasquia de um álbum a cada dois anos para nos dar Cherry Bomb, que saiu em 2015. Terá sido o seu projecto com mais convidados até à data, com ScHoolboy Q, Kanye West ou Lil Wayne a fazerem as delicias dos ouvintes e a ajudarem à imposição da figura de Tyler num outro campeonato. De lá surgiram singles fortes como “Fucking Young” e “Deathcamp”.

No caminho até ao seu mais recente trabalho, Tyler tem dado uma certa relevância à parceria que tem estabelecido com a A$AP Mob. Em especial à amizade que tem vindo a partilhar com Rocky que, inclusive, é um dos destaques de Flower Boy. Além das inúmeras fotos e vídeos que foram surgindo nas redes sociais, Rocky esteve presente no motim que Tyler protagonizou em estúdio quando revisitou “What The Fuck Right Now”. O mentor da Odd Future foi ainda um dos convidados de luxo em Cozy Tapes Vol.1: Friends.

O presente e futuro de Tyler são agora cada vez menos estranhos. O rapper e produtor marcou uma geração ao trazer para novas sonoridades para a mesa e tendências que irão perdurar na indústria musical. Agora dedica toda a sua perícia e engenho a moldar temas com uma conotação mais mainstream e é um dos mais importantes artesãos da canção à escala global.

 


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