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Publicado a: 25/03/2015

THEESatisfaction: são apenas raparigas cósmicas

Publicado a: 25/03/2015

Stasia “Stas” Irons e Catherine “Cat” Harris-White são amigas desde 2005. Depois de se conhecerem, tornaram-se cúmplices e formaram uma banda. Quando dizemos cúmplices, queremos dizer mesmo com a cumplicidade de namoradas, mas daqueles romances free spirit que convidam a escolher no Facebook a opção “Numa Relação Aberta”. Tão free spirit que da mesma forma tranquila que o romance começou, também tranquilamente findou sem comprometer a amizade e a relação profissional que criaram entretanto.

O Bandcamp das THEESatisfaction é um belíssimo espólio do trabalho discográfico de Stas e Cat. Recuamos até 2008, data do primeiro registo gravado das duas artistas: a mixtape That’s Weird, um título que podia funcionar como a autodefesa da banda: duas raparigas de Seattle a fazer hip hop? É estranho, sim. Se lermos as taglines que as THEESatisfaction utilizam para caracterizar a sua música vamos ler: hip-hop/rap jazz rap soul cosmic r&b psychedelic. Confirmamos. “We sound weird / In fact we are not from here / We come from there /From outer spaces / Deep spaces / Those places”, cantam em “We Sound Weird”. Mas a verdade é que nem soam de forma tão estranha: são sintetizadores que apontam para viagens intergalácticas, com beats experimentais, melodias vocais e lírica ao estilo clássico do spoken word.

É neste som mais cósmico e psicadélico que está a marca na sonoridade de Cat e Stas. O primeiro disco das THEESatisfaction, awE naturalE, também marcou a estreia da dupla na editora Sub Pop, entrando para um catálogo onde, do universo do hip hop, só constavam os Shabazz Palaces (e, já agora, para sermos precisos, tinham constado os The Evil Tambourines, em 1999). É também por isso que Cat e Stas têm uma afinidade grande com o cérebro dos Shabazz, Ishmael Butler, com quem têm partilhado a produção de álbuns. “Ele é o nosso mano mais velho”, sorri Stas. E é curioso verificar o ritmo de produção tanto dos Shabazz Palaces como o das THEESatisfaction: Ishmael e Tendai Maraire editaram o primeiro disco, Black Up, em 2011. As THEESatisfaction estrearam-se em 2012. Os Shabazz lançaram o segundo trabalho, Lese Majesty em 2014. Agora, em 2015, foi a vez das raparigas. “O ‘Ish’” – assim lhe chama Cat – “tem sido bastante constante nas edições de discos, mixtapes e projectos secretos. Sinto que fazemos o mesmo porque chegámos a editar três mixtapes por ano! Acho que estamos apenas sincronizados. Não é intencional, mas apenas algo natural.”

EarthEE, o segundo longa-duração das THEESatisfaction, segue a linha que têm vindo a traçar desde que formaram a banda. “Tem muita ligação ao disco anterior. É como se fosse um primo, um irmão ou irmã. A ideia foi desenvolver muito mais o nosso trabalho de produção e também de composição”, explica Stas. “Acrescentámos alguns novos elementos, como os instrumentos tocados ao vivo”, que conferem um outro lado mais orgânico, sem deixarem de soar a hip hop experimental e cósmico.

Stasia ‘Stas’ Irons

Música no espaço, a mente na terra

Se, por um lado, a música das THEESatisfaction tem um lado celestial que as aproxima do universo do R&B de Erykah Badu ou do jazz experimental de Sun Ra, não deixa de se sentir uma ligação às matérias terrenas, às causas ambientais que, na óptica de Cat, estão intimamente relacionadas com questões sociais e ambientais. “Gostamos de abordar essas temáticas porque são-nos muito familiares, impressionam-nos e marcam a nossa vida. É difícil não tratar desses assuntos.”

[Earth EE] Tem muita ligação ao disco anterior. É como se fosse um primo, um irmão ou irmã.

EarthEE arranca com o tema “Prophetic Perfection”, cuja primeira frase pode ser uma metáfora para uma necessidade de respeito em todas as acções que se praticam: “Said the bird to the water/‘may I take a sip?’/May I dip my toes in it?”. O alerta continua com “Planet For Sale” ou “Nature Candy”. “A Stas mudou-se, há uns tempos, para Nova Iorque, onde cada vez faz mais frio; e aqui em Seattle, onde eu estou, todos os anos o tempo fica mais quente. O aquecimento global é algo que não podemos ignorar.” Até porque, pelo menos na parte ocidental do globo, os problemas, com maior ou menor gravidade, acabam por ser. “Falamos muito sobre isso. O mundo está a mudar de forma rápida, sobretudo o ambiente. Andamos a destruir o planeta há muito tempo e isso provoca más vibrações nas pessoas. Tentamos usar a nossa música para iluminar, passar boas vibrações e alterar para a necessidade de mudança de acções”, vinca Stas.

A comunidade em torno das THEESatisfaction também cresce e aparecem caras novas a colaborar com Cat e Stas. “Entre o primeiro e o segundo disco fomos apresentadas a muitos músicos novos, por isso tivemos a oportunidade de estar com pessoas com quem sempre quisemos trabalhar”, revela Stas. Já Cat diz ser apenas uma questão numérica: “Na verdade, são só mais duas pessoas”, ri-se. “Já tínhamos tocado com os Shabazz Palaces e com o Erik Blood no awE naturalE. Depois temos mais duas pessoas: a Meshell Ndegeocello [que aparece em “Universal Perspective” e “WerQ”] e o Taylor Brown.”

Catherine ‘Cat’ Harris-White

Se Meshell é já conhecida por estar mais ligada ao movimento do neo-soul – “foi magia de Internet, com contactos feitos através do Twitter”, conta Stas – Taylor Brown é um desconhecido. “É um teclista e produtor incrível e quisemos ajudar porque não tem tido muita atenção”, explicam. “Conhecemo-lo em 2009, numa manhã em que ele acordou no nosso sofá depois de uma festa daquelas bem longas e loucas”, riem-se as duas raparigas enquanto Stas recorda a história. “Estava a dormir lá na sala e não sabíamos quem era! Bom, ficámos a saber que era músico e acabámos por ficar amigos. Mas já colaborámos em mixtapes e vários temas, mas esta é a primeira vez que ele aparece como instrumentista.”

Mas as THEESatisfaction não se dedicam apenas a intervenções sociais. Há o outro lado da socialização, do intimismo e hip hop suave, a piscar o olho ao R&B. Caso de “Badland”, tema que dividem com Ishmael Butler (que aparece aqui rimar forte); na sensual “Nature’s Candy”, ou na psicadélica e distorcida “Fetch/Catch” [com Taylor Brown]. Por outro lado, ouvem-se as influências afro-futuristas, que conferem a EarthEE um lado mais místico e terreno: “Post Black, Anyway” e “Recognition”, esta última com batuques a compasso que podia muito bem ser a dança de acasalamento de uma tribo descoberta numa expedição a Júpiter.



Nesta altura, a banda encontra-se a trabalhar de forma separada. Stas a morar em Nova Iorque e Cat em Seattle. “Não há problema nenhum! Parece até que atacamos mais frentes. A Cat anda para trás e para a frente, ente Seattle e Los Angeles, a trabalhar com vários artistas. E eu, em Nova Iorque, vou conhecendo montes de gente, que me inspira bastante. Depois encontramo-nos para fazer reuniões e concertos!” É uma oportunidade para as duas compositoras crescerem ainda mais dentro desta panela de influências que são as THEESatisfaction. “Em Nova Iorque a música é muito mais acelerada, muito dançante. Há muitos artistas a pegar no hip hop e a torná-lo em algo mais EDM. Mas também muita gente a querer regressar ao estilo mais clássico do hip hop, como o caso do Joey Bada$$”, diz Stas. “Em Seattle é o oposto”, explica a colega de banda. “A música é mais relaxada, tranquila, psicadélica. Os artistas fazem música que parece mais spacey, com sintetizadores espaciais. Há muita música electrónica a surgir, mas a partir de diferentes sonoridades, efeitos nas percussões, com sons como boing e bleep”, ri-se. E em mais uma coisa as THEESatisfaction estão de acordo: independentemente de estarem a trabalhar separadas por 4600 quilómetros, continuam as duas a sentir-se garotas de Seattle: “Somos muito chilled [relaxadas] e green [verdes]. Em todos os sentidos!”

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