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Publicado a: 15/10/2016

Paul White: “Eu e o Danny Brown confiamos um no outro a 100%!”

Publicado a: 15/10/2016

[ENTREVISTA] Rui Miguel Abreu [FOTO] Direitos Reservados

 

Paul White é um produtor de mão cheia e o Rimas e Batidas teve a oportunidade de sublinhar o seu especial talento num artigo que procurou analisar a sua carreira até ao presente. No último par de anos, White tem estado particularmente activo, com o projecto colaborativo Golden Rules e com o álbum repartido com Open Mike EagleHella Personal Film Festival. Mas ter assegurado a fatia de leão da produção num dos registos que marcam 2016 de forma mais intensa, Atrocity Exhibition de Danny Brown, garante-lhe uma redobrada exposição que certamente terá consequências no futuro imediato. A partir de Inglaterra, o produtor fez o balanço dessa bem recheada carreira, desde os primeiros passos anónimos como produtor de música para séries educativas de televisão até ao momento em que, como o próprio admite, o telefone começa a tocar com maior frequência.

Senhoras e senhores, este é o cérebro púrpura de Paul White!

 


paul white


Em 2009 fazias muito trabalho de library music e produzias para a televisão britânica. Essa é uma tradição nobre em Inglaterra, com editoras como a KPM ou a DeWolfe que editaram toneladas de música muito inspiradora que a dada altura, aliás, foi importante para os produtores de hip hop que a começaram a samplar. Conhecias, certamente, essa tradição. Podes explicar-nos como foi essa fase da tua carreira?

Os discos de library music foram sempre uma parte significativa da minha colecção, tal como rock progressivo – foi essa a música que comecei por procurar enquanto digger e descobri nessas editoras e noutras muita música incrível, para samplar ou simplesmente para me dar ideias. Quanto à minha história no mundo da library music, tudo tem a ver com o facto do meu pai trabalhar em televisão, ele é realizador e editor, por isso a televisão e o cinema estiveram sempre muito próximos. Fiz música para séries da BBC e para séries de animação do Channel 4. O trabalho da BBC foi sobretudo para uma série educacional chamada L8R que ganhou mesmo um Bafta (British Academy of Film and Television Arts), foi uma das primeiras séries do género interactivas. O trabalho para o Channel 4 incluiu fazer música para uma série inteira sobre saúde mental. Foram experiências incríveis. Adoro o casamento entre música e imagens e a relação entre esses dois meios foi sempre evidente para mim. O meu sonho é fazer muito mais música para cinema. Gosto de diversificar e trabalhar em diferentes áreas por isso sinto-me capaz de fazer música para cinema.

 


https://www.youtube.com/watch?v=cEx8nAHghco


Tens editoras de library music favoritas ou produtores? Podes revelar um pouco mais dessas paixões?

Primeiro comecei por coleccionar montes de discos da Chappel Music, eles tinham uma série com capas azuis muito boa, com muita electrónica! Encontrei grandes cenas na Impress. A Studio G também é muito boa. Nunca me meti com aqueles de que toda a gente falava, como a KPM ou a DeWolfe, porque eram muito caros e já havia muitos produtores de volta deles. Gosto do facto de a library music ser muito construída à volta de pequenas ideias contidas, dos altos níveis de criatividade que tem e do facto de ter sempre um ambiente, uma disposição específica – música alegre, música triste, música para dramas, música para ficção científica, etc.

Como é que o teu álbum psicadélico, Purple Brain, aconteceu? Porque é que o fizeste em torno do trabalho do ST Mikael e o que é que ele achou do resultado final?

O meu manager, Alex Robinson, há anos que trabalhava para a Stones Throw e por isso ele conhecia o Egon muito bem. Foi o Alex que lhe apresentou o meu trabalho e ao princípio o Egon queria que eu escrevesse música para uma série de CDs de library que ele tinha, para tentar licenciar para tv e cinema, etc. Ele mandou-me um disco duro cheio de música de diferentes artistas que já tinham negociado os direitos para sampling e disse-me para escolher um e fazer um monte de beats a partir do trabalho dele. Por isso depois de ouvir muita música de diferentes artistas, o trabalho do ST Mikael saltou-me à vista. A música dele lembrava-me a minha própria música, muito livre, crua e com ideias criativas postas em primeiro plano em vez de soar como se se quisesse antes encaixar nalgum lado. Ele estava apenas a ser ele próprio e os álbuns variavam muito em termos de estilo. E por isso, entre as audições e terminar a música eu demorei apenas três semanas, porque eu queria impressionar o Egon. E fiquei muito satisfeito quando o Egon me disse que o queria editar assim mesmo, como um álbum. É essa a história do Purple Brain. E a parte mais incrível foi receber depois um email do ST Mikael a dizer-me o quanto tinha gostado do álbum e da criatividade que eu tinha investido no trabalho. Não era algo que eu estivesse à espera pois eu tinha mexido muito nos seus bebés musicais, portanto esse será sempre um ponto alto da minha jornada musical até agora, ter recebido esse email adorável dele. Um abraço para o ST Mikael!!

 



Foi por causa desse álbum que primeiro te ligaste ao mundo do hip hop americano e dos MCs através da primeira colaboração com o Guilty Simpson, certo?

Certo! Eu já tinha estabelecido contacto na internet com o House Shoes que, como certamente saberás, tem muitas ligações. Mas o Egon estava a trabalhar com o Guilty Simpson também e arranjou maneira dele rimar em cima do tema “Ancient Treasure”. Foi um sonho ter trabalhado com um dos rapazes do Dilla. O Guilty tem um talento enorme. O Egon pediu-me para fazer uma remistura, mas como eu estava mesmo decidido a impressioná-lo fiz três e acabaram todas naquele 12” bónus que saiu com o LP do Purple Brain. Essa experiência motivou-me muito.

Fiquei sempre à espera que tivesses editado mais coisas na Stones Throw, mas isso nunca aconteceu. Alguma razão especial para isso?

Porque o meu manager trabalhava tão de perto com eles que acabámos por decidir que o melhor seria eu trilhar o meu próprio caminho e construir uma identidade para lá da Stones Throw e na altura isso foi complicado porque eu adorava a stones Throw. Mas penso que acabou por ser a decisão certa e tudo acabou por funcionar, o Alex estabeleceu a One-Handed Music e o resto é história, como se costuma dizer. As coisas acabaram por resultar maravilhosamente. Ainda realizei o meu sonho e tive uma edição na Stones Throw com o Homeboy Sandman, por isso tudo fantástico!

 



A participação do Danny Brown no Rapping With Paul White foi a primeira vez que os vossos caminhos se cruzaram ou já lhe estavas a mandar beats para o XXX?

Foi isso mesmo, foi essa a primeira vez que nos cruzámos, no Rapping With. Tinha ouvido a faixa dele “Greatest Rapper Ever” através do Alex e decidimos entrar em contacto com o Danny. A nossa relação começou logo com uma enorme sintonia, clicámos imediatamente. Fizemos uma troca: enviei-lhe beats para o XXX e ele apareceu no meu álbum. E desde então temos tido uma relação incrível.

Quando produzes costumas distinguir entre beats que é suposto serem apenas instrumentais e outros que aches que deveriam ter MCs a rimar em cima?

Na verdade, quando escrevo música não penso em mais nada a não ser na criatividade, ponto final. Nunca penso em como um beat poderá terminar ou em quem poderia rimar nele, nada disso. Tento desligar o cérebro, já que é um orgão muito analítico, muito dependente do ego. Para a criatividade penso que há outras partes do corpo que funcionam melhor, por isso penso o mínimo possível quando estou a escrever! Depois, nunca dá para adivinhar onde cada beat vai terminar e na verdade gosto da surpresa e de deixar todas as opções em aberto.

Quando envias beats para alguém como o Homeboy Sandman, por exemplo, mandas cenas específicas que possas ter feito com ele na ideia ou agarras simplesmente num monte de beats para que possa ser ele a escolher?

Como acabei de explicar, nunca penso em ninguém quando produzo, tentei fazê-lo mas isso não resulta. Tento apenas divertir-me e apreciar o processo criativo pelo que ele é. Por isso, quando algo resulta com a música que eu fiz acabo por ter um prazer redobrado. Faço CDs todos os meses ou em meses alternados, dependendo daquilo em que tenho as mãos metidas. Depois mando às pessoas uma tonelada de ideias para beats, para que elas possam escolher e o tema final é feito depois de eles escolherem o que gostam.

 


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Como é que se faz um projecto como Golden Rules funcionar quando há um oceano pelo meio a atrapalhar?

São as maravilhas da internet. Tenho muito amor e também muito ódio pela internet, mas o facto de permitir que algo como Golden Rules exista é um aspecto positivo. Através do Dropbox posso estar ligado a qualquer pessoa em qualquer parte do mundo e isso é incrível.

Projectos como Golden Rules ou o disco que fizeste com o Open Mike Eagle parecem ter uma certa conceptualização sonora por trás. Discutiste o tipo de beats ou de samples que irias usar com o Biddines ou com o Mike Eagle?

Penso que quando se começa um álbum com alguém dá logo para perceber o vibe muito rápido e o tipo de relação musical que vais ter com essa pessoa, por isso quando não se começa logo com a decisão de seguir numa direcção determinada, não se demora muito a perceber que naturalmente se começa a seguir para um determinado ponto e nesse momento é uma questão de nos focarmos. Gosto sempre de deixar todas as portas abertas e perceber naturalmente e organicamente qual a melhor direcção e depois focar todas as energias nesse caminho.

 



És uma parte muito importante do novo álbum do Danny Brown que na nossa opinião aqui no Rimas e Batidas é um sério candidato a álbum do ano. Como é que abordaste o trabalho em Atrocity Exhibition? O Danny deu-te algumas ideias do que pretendia antes de te atirares ao trabalho?

Obrigado! Eu e o Danny confiamos um no outro a 100% por isso nunca trocamos sugestões de direcção, simplesmente confiamos na criatividade um do outro e é quando isso acontece que o melhor trabalho conjunto sempre aparece, há que confiar no parceiro de trabalho de uma forma natural. Nós apenas trilhamos caminhos similares, mesmo em termos da música que ouvimos. Parece que temos inspirações semelhantes e temos idênticos espaços mentais nas mesmas alturas. É maluqueira, eu sei. Alguns daqueles beats eu já os tinha feito há alguns anos, o Danny já os tinha na mão há algum tempo! Depois de irmos para o estúdio e dele gravar as vozes naquelas 10 faixas minhas, voltei aos beats e trabalhei muito neles para os elevar a patamares ainda mais altos. Eu já tinha investido o meu coração e a minha alma e o meu sangue e as minhas lágrimas naquelas ideias de beats, mas depois dele gravar em cima delas voltei a agarrar neles com força porque sabia que o Danny iria estar do meu lado fosse o que fosse que eu fizesse com eles e tal como eu previa ele adorou tudo o que eu fiz, não teve uma reclamação a fazer! E eu até ordenei as minhas faixas da mesma maneira que ele, sem saber qual a ordem que ele queria!

Tens material inédito que tenha sobrado dos teus projectos com o Danny? Irão alguma vez ver a luz do dia?

Sim, temos bastantes coisas que têm sobrado, talvez uns 15 temas. Mas duvido que alguma vez vejam a luz do dia, infelizmente. Tenho um single em meu nome com o Danny para sair em breve na R&S. Por isso há mais coisas a acontecerem comigo e com o Danny!

 



Consegues combinar sampling e instrumentação real de uma forma muito particular. Quais são os instrumentos em que te sais melhor?

Adoro baterias, sempre adorei, sinto-me natural a tocar bateria, mas na verdade também adoro tocar piano, guitarra, baixo e o que mais aparecer, tudo o que faça barulho eu adoro, ou seja quase tudo! Cada instrumento tem o seu próprio mundo e o seu som e o seu toque. Mas também é possível olhar para todos eles como a mesma coisa, coisas que fazem o ar vibrar. Estou a tentar melhorar na guitarra e no piano, de maneira a que as pessoas nem saibam o que é um sample ou um instrumento. Metade das canções que fiz no Atrocity Exhibition nem têm samples nenhuns!

Há uns tempos, depois de editares o Shaker Notes confessaste a tua admiração pelos Tame Impala. Que mais anda aí que te inspire e que te desafie?

Gosto muito do novo álbum da Solange, também ando a ouvir muito a Kimbra, curto bastante os Hiatus Kaiyote. O Anderson .Paak é fantástico. Vi os Flaming Lips no Bestival há um par de anos e adorei por isso comecei a ouvi-los muito. As Warpaint são incríveis, há muita coisa aí agora que me inspira. Costumava ouvir apenas música antiga, mas agora oiço coisas antigas e novas, há coisas incríveis em todas as eras à espera de serem descobertas. Quero ser capaz de trabalhar com qualquer pessoa em qualquer estilo, por isso neste momento estou a experimentar de tudo no estúdio.

O teu telefone tem tocado mais desde que saiu o Atrocity Exhibition? Podes revelar um pouco do que está para vir?

Mais, sem dúvida! Continuo a trabalhar com toda a gente com que trabalhei até aqui e a fazer novas ligações neste preciso momento! Deixo o futuro como uma surpresa por agora porque me parece que assim é mais excitante. Tanto para vocês como para mim!

 


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