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Fotografia: Humberto Magro
Publicado a: 17/02/2021

Entre quatro paredes com Ableton Live, SP-404 e Microkorg.

Dirty Bungalow sobre Home Alone: “É a banda sonora do dia a dia de uma pessoa confinada”

Fotografia: Humberto Magro
Publicado a: 17/02/2021

Sozinho, mas bem acompanhado: Home Alone é o álbum de estreia de Dirty Bungalow pela 1980Lyfers e conta com as participações de PZ, Minus & MRDolly, Logos (dos Conjunto Corona) e Carlos.

Inspirado pela estética das batidas criadas com recurso a artefactos de outras eras — como a SP-404, da Roland, que usa como uma das suas ferramentas — António Almeida estreou-se há quase quatro anos, no SoundCloud, com a beat tape Meat Salad. Em 2018, recuperou o projecto para uma edição física pelos galegos da Língua Nativa com direito a bónus — Vegetarian Duck encurtou o caminho para um primeiro contacto entre o ReB e o produtor de de Leiria.

Hoje, Dirty Bungalow é já um nome com créditos dados dentro da cena lo-fi tanto dentro como fora do nosso país, tendo marcado presença em compilações da slow habits e visto dois dos seus projectos, Hot Slime e Bublegum Beats, serem alvos de edições por parte da francesa La Maison Venturi e da alemã Vinyl Digital, respectivamente.

Home Alone assinala o ingresso do beatmaker na portuense 1980Lyfers, naquele que é também o seu primeiro grande lançamento em nome próprio através de uma label nacional. O álbum funciona quase como uma terapia auto-induzida por alguém que tem vindo a enfrentar os últimos meses de confinamento a sós entre quatro paredes. Ontem, na última adição à coluna Oficina Radiofónica, Rui Miguel Abreu apontava os elementos que que compõem o guião para este filme tão peculiar:

“E o que Dirty Bungalow nos propõe é uma banda sonora para degustar de auscultadores, de robe e cuecas, como se sugere no artwork de Oker, permitindo que a música nos transporte para um qualquer filme imaginário que possa cruzar Shaft, a Rua da Cedofeita, cenas avulso de alguns filmes de Tarantino entrecortadas por frames roubados ao Duarte & Companhia, numa amálgama que, por estranho que possa parecer, faz pleno sentido. O ritmo é dolente, como se o “baterista” de serviço tivesse sido obrigado a tocar debaixo de água, os samples não disfarçam o pó que o vinil carrega após anos na secção de saldos, as guitarras são funky, os órgãos são jazzy, nos filmes porno aqui samplados ainda ninguém se depilava e o veludo nos sofás dos cabarés onde esta “banda” poderia tocar já está bastante coçado. Tudo certo, portanto.”

Numa troca de impressões com o ReB, António Almeida abordou o processo criativo deste seu novo LP e deu a conhecer a origem da ligação com a 1980Lyfers.



Além do título, que influência teve o confinamento na criação deste álbum?

O confinamento deu-me o conceito do álbum, que no fundo é a banda sonora do dia a dia de uma pessoa confinada. Neste caso o Dirty Bungalow vai deambulando por vários espaços da sua casa onde vai compondo e por vezes encontra um herói para dar voz aos seus devaneios, nos três video-loops do álbum é possível perceber este conceito. Todas as músicas foram escolhidas e organizadas de maneira a compor um todo que faça sentido com este período de tempo e tentei também associar algumas músicas a heróis de pantufas da literatura, como é o caso do Oblomov, Gregor Samsa ou o Charles Pooter, que apesar de não saírem de casa, vão sonhando, e isso é o mais importante: estamos fechados, mas pela imaginação ninguém nos priva de sair e criar.

O Home Alone foi criado inteiramente neste cenário ou o plano já estava em marcha antes da pandemia?

O confinamento deu-me mais tempo para tornar pequenos beats em músicas mais completas, mas o plano para esta edição começou algum tempo antes, quando conheci o Fred “Nave Mãe” da 1980Lyfers. Trocámos à volta de 50/60 beats, escolhemos os que faziam mais sentido em conjunto e trabalhámos o álbum tendo por base o conceito do isolamento.

Passaram dois anos desde o Hot Slime e acredito que algumas coisas mudaram na forma como trabalhas — seja na metodologia ou na aquisição de novo hardware/software. De que forma é que trabalhaste este disco?

Em termos de hardware e software usei exatamente o mesmo que tinha usado nos álbuns anteriores — Ableton Live, SP-404 e Microkorg. A metodologia foi também a que usei em álbuns anteriores, começando pela procura do sample, corte e edição, construção de baterias e depois o acrescento de instrumentos novos e camadas de som. A grande diferença para os álbuns anteriores foi que aqui, em vez de um beat curto de um a dois minutos, construí músicas de três a quatro minutos, o que me fez trabalhar mais a estrutura da música e dar espaço para a parte vocal.

Se a memória não me falha, moram aqui as tuas primeiras faixas com vozes de outros artistas. Como é que o Logos e o PZ, por exemplo, surgem nesta equação?

Não foi difícil, pois assim que tínhamos os beats escolhidos e em desenvolvimento não tínhamos dúvidas que eles podiam beneficiar com as vozes de alguém que estivesse próximo deste universo. O Logos e o PZ são duas personagens perfeitas para este contexto. O PZ de pijama e o Logos de roupão e chinelos são os convidados ideais para irem a casa do Dirty Bungalow.

Outra curiosidade neste Home Alone é o facto de este ser o teu primeiro projecto carimbado por uma label portuguesa. Como se deu esta ligação?

A ligação deu-se quando conheci o Fred “Nave Mãe”, no Porto, depois de uma noite fortíssima do Conjunto Corona no Hard Club. Fiquei de lhe enviar uns beats, pois tive conhecimento que ele e o Tugalife tinham uma editora (1980Lyfers) e que editavam também hip hop instrumental. Então enviei-lhe uma grande coletânea de beats da qual ele fez uma criteriosa selecção e o resto é história.

Fiquem bem, fiquem Home Alone.


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