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Texto: ReB Team
Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 07/10/2023

Conexão ibérica.

#ReBPlaylist: Setembro 2023

Texto: ReB Team
Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 07/10/2023

Por vezes diz-se por aí que “menos é mais”. E se o “mais” for português, então está tudo óptimo. 10 mãos, 5 canções escolhidas e 4 delas são da esfera nacional — a que não o é, vem mesmo daqui ao lado, por isso está tudo bem e em família. Do rap de rua de NGA e companhia às cantigas melosas de mokina. Vamos a isso?


[NGA] “A Chama” feat. Don G, Monsta & Prodígio

Esta chama brilha há muito e segue acesa, oxigenada, desde as primeiras gravações, ainda na viragem para os anos 2000. NGA e os seus companheiros ergueram uma Força Suprema, confiante e orgulhosa, num país demasiado branco, demasiado colonial, demasiado hostil para sentir e celebrar as suas vozes e conquistas. Terá havido altos e baixos, certamente. Mas este coletivo que decidiu “viver sem vassalos”, de gravação em gravação conquistou o seu lugar e ergueu uma identidade única e realmente distinta. É impossível não sentir o peso dessa caminhada no beat caloroso, expansivo e luminoso que Talen Ted moldou para as rimas de NGA, Don G, Monsta e Prodígio. Comandantes do seu próprio voo, rimam com a entrega e a verdade de quem teve de lutar o dobro, ou talvez o triplo, para alcançar o seu castelo. Até porque, como aqui lembra Prodígio: “Nosso mambo é kumbu, pra fugir à pobreza / O vosso mambo é ego, a subir à cabeça / Tua cota tinha empregada que fazia limpeza / A minha cota era a empregada que fazia a limpeza”. A história do hip hop não foi, nem é igual para todos, mesmo com muita resistência, e mesmo que algumas feridas já não doam. Se a Força Suprema hoje brilha “no sorriso de um puto pobre com uma prenda nova”, o mérito é todo dessa chama firme que os guiou e que agora alumia quem chega. Um brinde a isso.

— João Mineiro


[Marina Herlop] “La Alhambra”

Por esta altura, já sabemos o modus operandi de Marina Herlop, que vimos ao vivo e entrevistámos há bem pouco tempo. Isto é, sabemos que não vamos saber o que esperar, mas terá sem dúvida o cunho da artista espanhola. Em “La Alhambra”, a artista tira o pé do acelerador da experimentação e apresenta uma canção mais coesa e progressiva. O primeiro single que antecede Nekkuja — álbum a ser editado a 27 de Outubro deste ano — é um retrato do que está para vir. E de tinta fresca e cores vibrantes, esta pintura sonora não desaponta.

O tema afasta-se da onda mais esotérica do álbum anterior Pripyat, soa mais imbuído de intuito. Há um caminho que é iniciado pelas primeiras teclas de piano e pelas faixas de voz aguda, Herlop consegue alternar eficazmente entre momentos mais etéreos e corridas sónicas desenfreadas para construir um tema que culmina num final poderoso e fulminante. É um novo capítulo na sua carreira, vemo-lo mais convidativa e a abraçar estruturas musicais mais estáveis. Mas fá-lo sem nunca sacrificar aquilo que torna a sua música tão especial.

— Miguel Santos


[TNT] “Por Vezes”

Por vezes, a nossa vida muda irremediavelmente sem darmos conta disso. Não quando menos esperamos — isso já seria prenúncio bastante para adivinharmos um volte-face à partida inesperado. Mas o guionista (com G capital para quem Nele crê) é sempre mais perspicaz a conduzir a narrativa do que o próprio protagonista pensa: é nesses momentos decisivos — cujo determinismo só se revela a posteriori — que quem quer que seja (que não o interessado em sede própria) encontra desígnios inexplicáveis à razão. Por vezes, para melhor. Por vezes, para pior. Por vezes, para diferente, simplesmente. Mas, de qualquer das formas, talvez seja melhor assim. Por muito que se teorize sobre os propósitos da existência, não teremos sido “feitos”, certamente, para adivinhar e manipular destinos. Ainda bem que o céu não denuncia as más novas, nem o vento as boas. Porque, se assim fosse, de nada valiam os saltos de fé em pessoas, rolos ou samples. E no fim disto tudo levamos pouco mais que isso.

— Paulo Pena


[Expresso Transatlântico] “O Gangster (Canção para Dead Combo)”

Na mesma semana em que a história dos Dead Combo chega oficialmente ao fim, com o espetáculo “Esse Olhar Que Era Só Teu” no Teatro São Luiz, os Expresso Transatlântico lançam o seu álbum de estreia, Ressaca Bailada. Coincidência, certamente, mas é inevitável que a encaramos como uma espécie de passagem de testemunho. Pedro Gonçalves e Tó Trips marcaram uma era quando fizeram uma das maiores bandas portuguesas deste século. Reflectiram o tempo de uma outra Lisboa, antes do boom do turismo, dos alojamentos locais e dos nómadas digitais. As vielas e becos do Chiado e Bairro Alto, sobretudo, foram matéria-prima autêntica e inspiradora que se fundia, na criação, com imaginários mais fantasiosos dos grandes westerns, originando cruzamentos entre fado e blues, jazz e rock n’ roll, África e América latina, vida real e cinema.

Os Expresso Transatlântico — banda de Gaspar Varela (guitarra portuguesa), Sebastião Varela (guitarra eléctrica) e Rafael Matos (bateria) — serão uns dos herdeiros que os Dead Combo deixam como legado. Também eles criados numa Lisboa típica, influenciados pela magia da cidade, têm uma identidade própria mas homenageiam os mestres, como se pode confirmar por esta “O Gangster (Canção para Dead Combo)”. A guitarra portuguesa e a bateria (e percussão) ganham protagonismo no seu som, face à sonoridade cunhada por Gonçalves e Trips, e o trio navega por melodias e ambiências muito diferentes, com uma estética mais luminosa. Nunca é demais quando o panorama musical nacional ganha bandas genuínas que só poderiam existir neste país. Precisamos de bandas que toquem Lisboa e que nos toquem a nós, e os Expresso Transatlântico já partiram rumo a esse destino há algum tempo.

— Ricardo Farinha


[mokina] “know me well”

Faz-nos falta o frio para baixar os índices hormonais e terminar de vez com a silly season, que nos dilata o coração, faz crescer borboletas na barriga e torna irrecusáveis os passeios à beira-mar, os jantares em esplanadas acolhedoras ou as noites que viram dias no decorrer de longas e profundas conversas. Ao mesmo tempo: é tão bom, não é? E talvez seja por isso que as paixonetas de Verão também podem surgir já no final da estação, prolongando esse conforto da alma pelos meses em que as árvores se despem e o céu nos goteja em cima.

Assinado por mokina, softie saiu precisamente um dia antes de findar a época estival e deu a conhecer deste lado uma artista portuguesa que tem vindo a passar demasiado despercebida para a quantidade de raios solares que a sua música emana. Sem nunca encandear, este breve EP de apenas 8 minutos de duração é capaz de deixar qualquer um de beicinho feito, tal é a doçura com que Monika Cefis versa sobre o amor, altamente potenciada pelas guitarras que destilam tropicalismo e nos transportam mentalmente para o lado de lá do oceano.

Assente em batida minimal que traz à baila a utilidade de uma caixa de ritmos em contexto de bedroom pop, “know me welll” mostra um lado mais lúdico daquilo que são as valências de mokina no processo de composição, e lembra-nos de que mesmo numa relação que se quer séria há, também, espaço para uma certa leveza e simplicidade, como um passinho de dança aqui e acolá ou a comunicação por via ocular que, mesmo sem palavras, consegue transmitir muito daquilo que se pretende. Juntem “sweet nothings” à equação e facilmente entramos num date constante com a música desta multi-instrumentista e cantautora. E com isto já estamos atrasados para o próximo. Até breve.

— Gonçalo Oliveira

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