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Fotografia: Bruno Simão
Publicado a: 25/09/2023

Diligências em torno da electrónica com direito a ovação de pé.

Marina Herlop no Panteão Nacional: a pessoa certa no lugar certo

Fotografia: Bruno Simão
Publicado a: 25/09/2023

A pessoa certa no lugar certo é uma expressão associada a fortuna, à sorte geográfica, mas na passada quinta-feira dia 21 de Setembro foi sinónimo do espectáculo de Marina Herlop no Panteão Nacional. O regresso da artista catalã a Portugal, depois de ter dado provas da sua prodigiosa experimentação no Primavera Sound Porto, não podia ser num local mais adequado à sua música. Integrada no BoCA – Biennial of Contemporary Arts 2023, a actuação de Herlop teve tanto de fúnebre como de histórico, espelhando o característico espaço com critério e inteligência.

A artista apresentou-se sozinha, balizada por dois sintetizadores e um drum pad. Mas a sua música encheu a sala como se de uma orquestra se tratasse. Sentado, o público observou cerca de uma hora de um espectáculo que desafiou convenções musicais. Depois de um forte aplauso inicial, Herlop abriu as hostilidades com música do seu novo álbum Nekkuja, que será editado em Outubro. Os seus dedos percorreram as teclas suavemente, com sons agudos pautados por barulho orquestrado. Esta junção entre o familiar com o desconforto sonoro é apanágio desta artista, e naquela noite foi evidente essa valência musical.

O espectáculo foi muito fluido, sem tempo para aplausos ou grandes interacções. A primeira música escorregou sem espinhas para “Lyssof” e de seguida para “Miu”, um dos destaques do seu aclamado álbum Pripyat. Grande parte da actuação incidiu sobre esse trabalho, mas também ouvimos temas do primeiro LP Nanook como “Heks” ou “Doiloi”. Este último vincou as inspirações da música clássica de Herlop, com transições de piano que mostram a força instrumental das composições da artista.

A sua expressão ao longo do concerto era a de alguém metódica. Observavam-se da parte da artista murmúrios inaudíveis que sinalizavam novos sons que iam surgindo na música, num misto de alegria e ponderação, qual orgulhosa e atenta compositora. Em “abans abans” ouvimo-la livre, catártica, a interpretar esta música com todo o ímpeto que o tema pede. Em “shaolin mantis” ouvimo-la bem entrosada com os agudos, e o chilrear que se ouve ao longo da música traduziu-se em sorrisos descontraídos.

Antes do final do concerto, ainda houve tempo para o mais recente single de Marina Herlop, “La Alhambra”. A canção tem uma estrutura mais convencional, mas não deixa de ser um forte exemplo da experimentação musical da artista. No final, todas as palmas que não se ouviram durante o espectáculo soaram na estrondosa ovação de pé com que o público presenteou Herlop. Essa calorosa recepção foi recompensada com um curto encore da lisonjeada intérprete. Bastou a voz e o microfone para um momento final de grande calibre.

Termina a actuação e surge a interrogação: o que acabámos de ouvir? A obra de Marina Herlop transcende a música, é ritualística e para ser absorvida tanto como é escutada. O espaço clássico e imponente do Panteão recebeu os seus sons como se de um velho amigo se tratasse. E todos aqueles que testemunharam a avassaladora demonstração musical de Herlop foram as pessoas certas no lugar certo.


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