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Texto: ReB Team
Fotografia: Manuel Lino
Publicado a: 22/03/2023

O que se passa na Casa Independente, fica na Casa Independente.

Batida sobre Uma Noite Particular: “Agrada-me a ideia de algo privado e oferecido a quem está”

Texto: ReB Team
Fotografia: Manuel Lino
Publicado a: 22/03/2023

No final deste mês, 31 de Março, há Uma Noite Particular conduzida por Batida para a Casa Independente. O início do evento está marcado para as 22h30 e os bilhetes custam 8 euros.

À imagem daquilo que tem vindo a apresentar noutras ocasiões, Pedro Coquenão prepara um espectáculo multi-disciplinar que mistura música, dança e artes visuais. Mais do que um concerto de molde tradicional, Uma Noite Particular é-nos descrito como um “ensaio aberto”, como se o estúdio desse lugar a um palco, levando o processo da experimentação, esse momento irrepetível, para um lugar ao alcance da vista e da escuta do seu público. É, por isso, uma incógnita quase total aquilo que vamos poder assistir na Casa Independente, que a partir da meia noite passa para um registo clubbing à boleia de DJ Rosário Kalenga, que este ano já nos meteu a bailar até ao “Infinito” num novo lançamento pela Seres Produções.

Depois de se ter aliado a Ikonoklasta na dupla IKOQWE para editar o álbum The Beggining, the Medium, the End and the Infinite (2021), que gerou também uma inventiva performance para a rádio norte-americana KEXP, Batida voltou aos discos em nome próprio no ano passado através de Neon Colonialismo, um registo a solo que, na verdade, são foi assim tão solitário quanto isso: Bonga, Mayra Andrade, Octa Push, DJ Satelite, Poté, Nástio Mosquito, Branko e, novamente, Ikonoklasta foram alguns dos amigos que recebeu ao longo das dez pulsantes e globais canções, que em Janeiro último integraram a lista dos melhores trabalhos nacionais de 2022 para a nossa publicação.

Poucos meses após se ter sentado à conversa com João Mineiro a propósito desse Neon Colonialismo, Pedro Coquenão voltou a trocar algumas impressões com a redacção do Rimas e Batidas, desta vez para nos ajudar a decifrar aquilo que vamos poder encontrar nesta sua primeira Uma Noite Particular para a Casa Independente, uma experiência a que pretende dar seguimento (com dedos cruzados da nossa parte).



A origem da expressão Neon Colonialismo, que deu origem a uma peça de luz e a título de álbum, terá nascido numa residência artística na Casa Independente, em 2020, certo?

Certo. Foi em Fevereiro de 2020 que ali residi, artística e fisicamente, e apresentei uma série de peças, compondo uma exibição surreal em que consegui misturar coisas minhas com outras como: a escultura original dos “Pretos de S. Jorge”, a escultura e maquete original do “Padrão dos Descobrimentos”, uma coleção do António Costa Pinto dedicada aos “Descobrimentos” e ainda desenhei o musical de IKOQWE. Filmei ali boa parte de uma curta que se debruçou sobre o mesmo tema. Com o Covid tudo passou muito discreto e fora dos radares (não do Rimas) mas é uma das coisas mais bonitas e completas que fiz, complementada depois com uma apresentação no próprio Padrão, pouco notada, mas que teceu um baixo assinado do Chega. Valeu bem a pena. Senti que me expressei como gostaria de me expressar sempre. Incluindo o musical de IKOQWE e uma emissão contínua durante esse mês.

Porque decidiste voltar agora à Casa Independente, três anos volvidos e já depois do disco editado?

Por ter essa memória, a relação com o objecto de luz e por lá ter ainda gravado o video com a Mayra Andrade e que anunciou o disco. O video acaba comigo no palco a montar o novo show e o André Cabral a dançar com o Planeta. Deixei ali semeada a ideia de continuação. Só não pus o “to be continued” porque continuo a preferir a subtileza, um recurso muito pouco eficaz na vida. Estou agora a ver o Fernando Rocha a saltar na RTP. Funciona. Na realidade, faço essas coisas só para me guiar. Não tenho a expectativa que mais que a pessoa que está ler agora e topou, tope. Olá! Muito tempo livre ou é mesmo apreciação? :)

É o fechar de um ciclo?

É uma tentativa de abrir outro. Fechar ciclos tem sido uma ilusão para mim. Vou avançando para os fechar mas logo se abre um outro. São todos muito parecidos e relacionam-se. Às tantas tudo é uma continuação. Essa residência na Casa foi um ciclo novo que se abriu e que logo se fechou no mês seguinte, em que fomos todos confinados. Foquei-me depois em dois filmes, dois álbuns, uma peça de teatro e algumas experiências. Por isso e por ter ali filmado o video do “Bom Bom”, pareceu-me o lugar natural para recomeçar ou continuar esse ciclo.

Defines esta “Uma Noite Particular I” como um ensaio aberto e mensal. Que particularidades podemos esperar destes encontros? O que planeaste para estes ensaios?

Será aberto e para já só tem duas noites marcadas. Podemos esperar tentativas falhadas, mais honestidade do que num palco com tempo contado ao minuto, proximidade e o poder testemunhar coisas que não vão ser repetidas, ou testemunhar o que mais tarde será replicado em outros contextos. Particular é como a minha mãe me define. A palavra tem uma série de significados que sinto como relacionáveis com estas noites. Pelo menos gosto de me oferecer essa liberdade: a de não ter de tentar ser igual ao outro. Agrada-me a ideia de algo privado e oferecido a quem está. Planeei ir experimentando com as várias dimensões com que habitualmente trabalho: dança, palavra, música, rádios e a parte cénica em si. Umas noites vão ter mais foco numas áreas e outras noutras. Há algum tempo para poder experimentar. Fazê-lo com público é a novidade aqui.

Em Neon Cololianismo rodeaste-te de muitos parceiros criativos – Mayra Andrade, DJ Satélite, Nástio Mosquito, Octa Push, DJ Dolores, Lia de Itamaracá, João Morgado, Pedro da Linha, Branko, Botto Trindade, Ikonoklasta ou Bonga. Alguns deles participaram nestas noites particulares?

Rodeio-me sempre, desde a Fazuma. O meu processo é muito solitário e sempre colaborativo ao mesmo tempo. É tipo vida: não existo sozinho, mas o meu dia criativo como um todo só existe em mim. Dos que citas, alguns estão distantes geograficamente e torna-se complicado trazê-los para uma noite apenas, outros vão participar certamente. Podes juntar aí o Rosario Kalenga que vai fazer parte do novo single , com uma remistura do “Tem Dor”.

Defines estas noites como momentos de experimentação e de elaboração de algo que poderá vir a ser transporto para uma tour por palcos e festivais. Num momento global, económico, social e ambiental muito sensível, em que inclusive muitas bandas e artistas têm prescindido de algumas digressões internacionais, que preocupações achas importante ter no planeamento de uma nova tour?

Tenho de usar a palavra tour, porque o mercado Português não me tem preenchido sozinho e não vou ficar a lamentar-me. Seria até injusto para quem bem me recebe fora, mas também para com cada momento que aqui vivi. É essencial actuar onde se entende a lingua que falo melhor. Há trabalho bom a fazer entre nós, os falantes desta língua. Alguns dos melhores momentos que vivi em comunhão foram cá. Lembro-me do CCC ou do Impulso, nas Caldas, ou da Ponta do Sol, na Madeira, por exemplo.

É-me fácil largar e aceitar que não passa pela quantidade de shows, likes e followers ou pelos cartazes cheios de datas para encher o olho. Passa por ajustar e otimizar o que é possível, mas sem sacrificar a arte pelo funcional ou por abdicar de alguma linha que seja definidora da minha frágil pessoa, e onde incluo essa consciência do momento e do quanto ele pede acção mas também silêncio – ser mais One Punch ainda. Até porque abdicar de alguma dessas coisas acaba comigo e coloca-me numa zona inviável mentalmente. Estrago-me. Fazer apenas o que for sustentável fazer. Sei que não sou uma escolha comercial ou que vende bilhetes. Também sei que consigo sempre apresentar trabalhos diferenciados e que deixam cabeças e corpos a mexer. Felizmente tenho tido programadores que contrariam o óbvio, as vendas, os plays, e me permitem apresentar o que faço em contextos muito dignos, senão particulares, e o que não tenho em quantidade, tenho tido em qualidade. As oportunidades que o FMM Sines ou o Iminente me deram, os repetidos convites do Alive e do Rock Nordeste, bem como a própria Casa ou Village Underground, o Africa Express, o Transmusicalles, o Pohoda, o Roskilde ou a família do Global Fest, valem por uma dezena de datas cada um, mas… a ideia é ficar rico, ter uma piscina de água salgada aquecida para boiar a maior parte do tempo e poder trabalhar bem, pagar tudo o que sempre desejei aos artistas que me inspiram e fazer só coisas particulares porque, esperar pelo mercado, é um atraso de vida.

Se me perguntas se, em vez de fazer uma tour, consideraria ficar numa sala a apresentar o meu trabalho durante um mês, de forma digna para todos os envolvidos, incluindo público… dir-te-ia que isso é o sonho de uma pessoa como eu.

PS: Entretanto na RTP… Já é o 3º careca com óculos que se apresenta no palco. Terá algum significado?


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