Números redondos são sempre ocasiões perfeitas para celebrações mais efusivas. De 2 a 6 de Outubro, o OUT.FEST regressa ao Barreiro para a sua 20ª edição, onde além de muita música — naquele que é o cartaz mais ambicioso de sempre do festival — se poderá ver também uma exposição e a apresentação de um livro, ambos referentes às duas décadas de vida deste que é um evento que dá toda a atenção do mundo às sonoridades menos óbvias.
Entre o leque de artistas convocados, que têm dobrado os limites estéticos nas suas respectivas áreas dentro do espectro musical, há 11 nomes que por aqui destacamos como sendo imperdíveis no decorrer do certame que arranca já amanhã. Acompanham-nos na viagem?
[Zoh Amba]
Zoh Amba é a cada vez menos recente e mais pujante voz nova-iorquina de saxofone tenor provinda do Tennessee que se quer escutada. Tem tocado e gravado em trios com William Parker e Francisco Mela, ou com Luke Stewart e Chris Corsano, tal como se apresentou no Jazz em Agosto em 2023. Contudo, é em destemida prestação a solo que melhor se detalha todo o seu perfume estonteante sonoro, como registado em O, Sun para a Tzadik em 2022. Amba para quem o free jazz é gospel, no sentido de como a música pode e deve elevar o espírito. A actuação no palco-altar na Igreja Rosário do Barreiro imagina-se como o lugar de perfeita simbiose para esta musa. A conferir no dia 3 Outubro às 19h00.
[Armand Hammer]
Poucos conseguem ombrear com billy woods e E L U C I D no que toca à habilidade e densidade na escrita para rap. A dupla que melhor conhecemos enquanto Armand Hammer tem estado a agitar o underground nova-iorquino ao longo da última década e é um dos nomes de maior culto no panorama do indie rap, tendo já registado colaborações com outros ilustres do meio como Earl Sweatshirt, The Alchemist ou JPEGMAFIA. No ano passado voltaram a eternizar versos em mais um registo de longa-duração, We Buy Diabetic Test Strips, que motiva esta sua primeira passagem por palcos portugueses — tocam a 3 de Outubro no SIRB “Os Penicheiros” pelas 22h40.
[LEIDA]
A compositora e pianista Eve Risser referiu-se a Mariana Dionísio como a voz que marca o futuro da música entre nós. Como LEIDA, que parte do imaginário de Mariana, respondem outras mais vozes como Leonor Arnaut, Beatriz Nunes, Filipa Franco, Nazaré da Silva, João Neves, Hugo Henriques e Diogo Ferreira. São oito instrumentos que entram no espaço para escutar e soar. É música para a elevação, é um espaço aural em ascensão e é a voz como instrumento, mas cujo resultado vai para além de um coro de vozes. É uma nova formulação de possibilidades vocais. A escolha do lugar de aparição é premeditada, importa a reverberação do espaço, há um diálogo em curso. A actuação na Igreja Santa Cruz no Barreiro, espera-se intangível no dia 4 Outubro às 18h00.
[FUJI||||||||||TA]
A grafia que o refere apresenta-o na melhor das definições. Tubulações ao alto no meio das letras do seu nome — FUJI||||||||||TA. É uma figura que se foi tornando mitificada pela música que pratica, pelo saber fazer musical e como inventor-construtor dos instrumentos que utiliza — em torno da ideia de pneumofones, ativações via ar em tubos como orgãos soporíferos individuais feitos de um todo. Parte do ideário milenar nipónico musical — Gagaku —, mas surge absoluto, numa música contemporânea enraizada no princípio do som contínuo de notas pedais sobrepostas. A sua passagem pela Igreja anglicana de St. George deixou marcas indeléveis que justificam uma nova imersão sónica, desta feita na outra margem do Tejo, na Igreja Santa Cruz, logo depois de LEIDA, dia 4 Outubro às 19h00.
[Nu No]
Diletante actor, fez-se vocalista na formação punk Atacadores Desapertados em Ponte da Barca nos anos de irreverência. Na passagem à idade maior abarcou a musicalidade dos poetas. Representou Daniil Kharms — poeta avant-garde e do absurdo — como poucos. Em duo com o poeta Júlio Henriques deu voltas ao seu mundo. É a metade de Harpoemacto, onde se completa com a harpista Angélica Salvi. Nu No é expressão dadaísta e tudo o que daí advém. É catarse entre as palavras ditas na corrente das soluções imaginárias que procuram explicar o absurdo da existência, como de Ionesco a Prévert. Tome-se lugar para entender melhor no ADAO do Barreiro, dia 5 de Outubro pelas 21h30.
[Caveira]
Estão a ser um dos destaques deste ano dentro da esfera nacional. Os CAVEIRA — de Pedro Gomes (guitarra), Miguel Abras (baixo), Gabriel Ferrandini (bateria) e Pedro Alves Sousa (saxofone) — regressaram aos discos com mais uma dose de música arriscada e de cariz exploratório, fundindo rock com noise e free jazz numa obra intitulada ficar vivo, um conjunto de três longas e fumarentas (mas bem detalhadas) faixas. É a 5 de Outubro, às 22h15, na ADAO que o quarteto se vai fazer escutar ao vivo no Barreiro.
[H31R]
Já tinham dado nas vistas em ve·loc·i·ty, lançamento efectuado de forma independente em 2020, mas tornaram-se impossíveis de ignorar quando passaram a alinhar na Big Dada, um selo subsidiário da bem reputada Ninja Tune. Foi por essa etiqueta discográfica inglesa que H31R editaram o seu segundo LP, HeadSpace (2023), onde nos deram a conhecer as suas visões refrescantes em torno das estéticas do hip hop e da electrónica mais experimentais. O par formado por maassai e JWords é mais um acto a não perder na ADAO a 5 de Outubro, a partir das 23h50.
[Nídia & Valentina]
Não há Estradas com aquelas que Nídia e Valentina Magaletti construíram juntas. Inspiradas por projectos vindos de outras latitudes, como os da editora ugandesa Nyege Nyege, a DJ e produtora de Príncipe Discos aliou-se à baterista e percussionista italiana para formar um novo repertório com a clara intenção de desbravar terreno dentro da cena electrónica. A batida de Lisboa conhece assim as percussões ritualísticas da artista sediada em Londres para que, juntas, formem um novo conceito de música de clube, recheado de informação sonora que provoca respostas imediatas nos nossos corpos dançantes. Na madrugada de 6 de Outubro, às 01h20 na ADAO, já sabem o que esperar.
[Lenhart Tapes feat. Tijana Stanković]
Alquimista sonoro, Lenhart Tapes é disparador de fitas magnéticas a projectar gravações de campo sobre tapetes ritmados de feição circular. Artesanato sonoro balcânico que conta com a voz de Tijana Stanković para uma viagem folclórica contemporânea, num presente muito feito de um certo futuro ancestral. Antologia como recurso, qual máquina do tempo. Tem em Dens, lançado em 2023 pela Glitterbeat Records, a mais recente expressão das suas paisagens que trazem o exotismo para perto. Para ouvir e até num mais bailar na ADAO, na passagem de dia 5 para 6 de Outubro às 00h30.
[Ghosted]
Viagem garantida para longe, sem saber muito bem para onde. E está aí o fascinio de entrada na música feita pelo trio Ghosted, conjugando a guitarra e instrumentações de Oren Ambarchi, o baixo de Johan Berthling, e as percussões de Andreas Werliin. Os registos, apresentam-nos como capítulos da sua própria narrativa, Ghosted em 2022, e Ghosted II já neste 2024, ambos lançados pela Drag City. Transportam as sonoridade perdidas entre os campos do jazz mais livre de rotulações e as atmosferas abstractas de uma música não idiomática, mas de forte identidade, assente na ideia de expressões cumulativas. Intensos no fazer e comprometidos com o desconhecido, é essa a proposta a esperar no final de tarde de Domingo na Paivense do Barreiro, dia 6 de Outubro pelas 18h25.
[DJ Anderson do Paraíso]
Se o funk brasileiro está a galgar terreno pelas pistas de clubes do mundo inteiro, é tudo graças às novas ramificações que o género musical tem vindo a adquirir nos últimos anos. Um dos arquitectos por detrás dessa renovação estética é DJ Anderson do Paraíso, que serve o seu baile funk envolto num certo negrume e a rotações mais brandas, deixando-se influenciar por uma certa veia experimental da electrónica recheada de psicadelismo e contando com vários convidados para abordar a sua bruxaria através de letras que se focam em sexo, drogas e vida louca. Será, no mínimo, delirante o seu set agendado para o dia 6 de Outubro no SCR Paivense às 20h30.