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Texto: ReB Team
Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 06/03/2019

L-ALI, Ariana Grande, Jamila Woods, Montanhas Azuis, Dave, Rashid, Spvic & Kamau e J. Cole nas escolhas de Fevereiro.

#ReBPlaylist: Fevereiro 2019

Texto: ReB Team
Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 06/03/2019

As rimas afiadas têm um espaço especial nas escolhas do mês passado: Portugal, Inglaterra, Brasil e Estados Unidos da América são representados por L-ALI, Dave e Rashid, Spvic & Kamau e J. Cole, respectivamente.

Fora disso, Ariana Grande, Jamila Woods e Montanhas Azuis trazem pop, trap, soul, r&b moderno e electrónica para a mesa. Uma refeição completa que espelha a diversidade do que se passa por aqui, no ReB, todos os meses.


[L-ALI] “Siri”

Falemos do mercado de transferências do hip hop nacional. Um dos destaques do verão foi a troca de ares de L-Ali, que deixou a Think Music para ingressar nos quadros da Superbad. Passados alguns meses de gestação, o rapper de Alfama surge das trevas de onde nunca saiu com “Siri”. Nos primeiros momentos do tema, o egotrip escorrega com desdém, acompanhada por uns sopros imperiais: “Qual a team, eu calço fácil/ Qual a team, eu calo-os fácil”. Os mais intriguistas dirão que isto são shots fired à Think. Seja qual for o motivo da sua existência, música deste gabarito é sempre bem-vinda.

Em pouco menos de três minutos, Hélder Sousa mostra-nos porque é que é uma das grandes promessas do underground português. O belo beat de Here’s Johnny é o companheiro barulhento perfeito para as barras recatadas de L-Ali e há qualquer coisa de reconfortante em verificar que mesmo por cima de uma batida inspirada por trap, que bebe de uma sonoridade mais tradicional no panorama actual do hip hop, o artista não altera a sua cadência, mantendo-se fiel ao seu estilo discreto e hábil. A principal novidade apresentada é o uso de auto-tune mas, como em tudo o que faz, L-Ali usa a ferramenta vocal com critério, nunca permitindo que se sobreponha ou que soe exagerado, acrescentado uma sonoridade metálica à sua persona de papão do rap.

A destreza fonética é avassaladora, especialmente no hook sibilante, onde o ouvimos dizer “Serei lei no ‘Siri’ Lanka”, confiante na premissa de que depois deste banger não haverá fã de hip hop que não saiba o seu nome. Para os que conhecem cumpre, para quem não o conhece basta pegar no iPhone mais próximo e perguntar “Siri, quem é o L-Ali?”. Não ficarão desapontados.

– Miguel Santos


[ARIANA GRANDE] “bloodline”

Em 2016, quando apresentava o programa SNL, Ariana disse estar pronta para um verdadeiro escândalo que potenciasse cada vez mais a sua carreira. Dois anos depois e ninguém sofreu tanto escrutínio por parte dos media como ela. A verdade é que Grande não começa dramas, mas ela sabe muito bem terminá-los; e a prova disso é thank u, next, uma urgente e pungente declaração de independência, seis meses após a sua suposta descoberta de felicidade em Sweetener. Os caminhos mudam-se consoante o destino e a partir daqui, a fórmula musical também é outra: batidas trap entupiram bem a produção do disco e ajudaram-na a criar uma personalidade diferente, deste vez mais ousada e distante. Ariana está chateada, exausta, triste, e todos estes sentimentos permanecerão para sempre no seu ADN — fazendo com que momentos como “bloodline” justifiquem à letra a premissa deste disco. Há um revivalismo rebelde, mas justificado; uma sensação de empoderamento, mas devidamente reservado: Grande sabe que poderá cometer um erro, mas a vida tem-lhe pregado tantas partidas que não tem assim tanta preocupação para tal: “Don’t want you in my bloodline, yeah/ Just wanna have a good time, yeah”.

Os trompetes no refrão são o elemento-chave e criam um ambiente mais descontraído, dos poucos ao longo do disco. O que ela está a fazer já qualquer rapper o fazia há décadas; mas Grande fá-lo, nesta canção, de uma maneira mais livre e genuína. No final, “You gon’ have to let this shit go”, a mensagem é universal: para o rapaz com quem ela só quer partilhar uma noite, para as pessoas que se colocaram no centro dos seus próprios problemas e ainda para quem lucrou com a melancolia dela.

– Miguel Alexandre


[JAMILA WOODS] “Zora”

“There must be a reason why”, canta Jamila Woods no refrão de “GIOVANNI”, o single inicial e afirmativo da sua nova era. O seu segundo disco, LEGACY! LEGACY!, será um desfile dos vultos que pululam no seu imaginário, desde a poetisa Nikki Giovanni até à escritora e antropóloga Zora Neale Hurston, que é honrada neste novo extracto.

Há uma razão tácita pela qual o novo longa-duração deu o sinal de partida com “GIOVANNI”, mas principia oficialmente com “ZORA”. A homenagem à poetisa vinha como foz das cristalinas e vibrantes águas de HEAVN, a criminalmente subvalorizada estreia de Woods, em que a organicidade jazzística era o sol poente de uma qualquer tarde de celebração que se torna reflectiva. Os tempos mudaram. A sucessora é um salto forçoso para a noite, para a sombra de terras mais acidentadas: cada verso seu um passo, sem cautela nem restrição, por uma plataforma desabrigada; o vento no cabelo, o saibro a raspar os pés.

O que dá virar o caloroso som de Chicago do avesso? Um turbilhão em forma de boom bapcortante e um pequeno curativo nas notas de piano flutuante. Definida a mise-en-scène, Woods encontra o momento oportuno para agigantar a sua voz e, no caminho, deixar claro que a ligação entre indefinição e identidade é coisa do passado. “I may be small, I may speak soft, but you can see the change in the water” — há uma razão, e não só é audível, como reverberante e assombrosa.

– Pedro João Santos


[MONTANHAS AZUIS] “Nuvem de Porcelana”

Saída do primeiro álbum dos Montanhas Azuis, grupo que reúne Marco Franco, Bruno Pernadas e Norberto Lobo, “Nuvem de Porcelana” destaca-se como o trabalho harmónico (e sentimental) mais imponente de Ilha de Plástico.

Pernadas e Franco seguram a base da “Nuvem”, nos sintetizadores e no piano, para que Norberto dê voz à guitarra — processada por um Korg Miku, dando o tom oriental dessa mesma voz e criando a adequada melodia para um arranjo mais despido. Sem batida, sem muitos efeitos e jogos. Alguns acordes arpejados e uma melodia algo solta, entre diferentes mas conjugáveis timbres, a faixa mais curta de Ilha de Plástico é também a mais repetível do projecto.

Para um grupo que se une pela capacidade de criar melodias e que se junta à volta do sintetizador, “Nuvem de Porcelana” eteriza esta Ilha de forma contemplativa mas também imersiva.

– Vasco Completo


[DAVE] “Black”

O primeiro single de Psychodrama, o álbum de estreia de Santan Dave, é uma reflexão com classe e sobriedade sobre as implicações de se nascer negro num mundo que ainda está a lidar, muito lentamente, com as mais complexas questões raciais e sociais.

Em cada linha de “Black”, o MC britânico (que também se ajeita ao piano) espeta uma agulha nas costas (e na consciência) dos ouvintes. Alguns exemplos:

“A kid dies, the blacker the killer, the sweeter the news”

(…)

“Tryna help a lady cross the road to have her walkin’ off”

(…)

“Black is strugglin’ to find your history or trace the shit
You don’t know the truth about your race ’cause they erasin’ it”

(…)

“Loud in our laughter, silent in our sufferin’”

(…)

“Black is bein’ guilty until proven that you’re innocent”

Com a ajuda preciosa de Fraser T. Smith, nome imprescindível na construção do primeiro disco de Stormzy, Dave chega-se à frente e assume a dianteira, preparando o seu caminho para ser a próxima grande cena do Reino Unido e, consequentemente, do globo.

20 anos, um talento enorme e um futuro bastante promissor mesmo à frente dos seus olhos.

– Alexandre Ribeiro


[RASHID, SPVIC & KAMAU] “A Propósito”

Não vamos entrar na discussão do trap e do boom bap pela trigésima vez, prometo, muito menos na ideia de rap de mensagem em comparação com qualquer outra coisa que vos encha os ouvidos ou vos faça balançar. Deste lado, no entanto, Fevereiro foi um mês de revivalismos, em passeio pelo storytelling dos brasileiros Rodrigo Ogi, Kamau ou De Leve, e de uma necessidade de voltar ao básico. A parte boa de vivermos um 2019 onde a cultura hip hop se mantém em ponto de fervura é que, quando “voltamos ao básico”, podemos virar-nos para Jay-Z, Kanye West, NAS, Common ou qualquer outro génio ainda alive and kickin’. Ou para Sam The Kid. Ou para Kamau.

Aos 43 anos (nascido no último dia de fevereiro de um ano bissexto), o rapper e beatmaker de São Paulo vive uma fase de indiscutível plenitude low key — não terá sido à toa que escolheu para si mesmo o título de “Guerreiro Silencioso” — enquanto lampião da necessidade de pensar a cultura, a negritude, a indústria ou o projecto individual para o bem comum vs. a auto-satisfação. É quando ouvimos Kamau que percebemos o quanto precisamos dele.

Em Fevereiro, ao lado de Rashid e SPVIC no beat de Mestre Xim, chegou-nos “A Propósito”: a faixa tripartida – com produção a cargo da BOCA — foca-se, essencialmente, nesta ideia de percebermos onde queremos, afinal, chegar com a arte que fazemos (ou a vida que levamos) e do quanto, de nós mesmos até, prescindimos nessa caminhada. “Qual o seu propósito?”

– Núria R. Pinto


[J. COLE] “Middle Child”

O filho do meio do rap, que estudou os grandes e agora é o maior, um MC que todos deviam temer, tal a força e a veracidade que carrega em todos os seus versos. E à entrada de um novo ano, o patrão da Dreamville faz questão de dizer ao que vem, de revelar que tem uma lista de alvos a abater e que vindo do meio só pode mesmo chegar ao topo, enchendo o Bentley de lama se for preciso. O beat de T-Minus parece uma luva a envolver a voz de Cole, um instrumental cortado à medida como um bom fato para que o MC brilhe de forma intensa, com um flow que é filigrana pura, com cada sílaba e cada respiração a interligar-se com a precisão e a beleza que só a arte de classe superior consegue garantir. Venha de lá o resto do ano, que o tiro de partida parece ter acertado em cheio no alvo.

– Rui Miguel Abreu

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