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Fotografia: José Pereira
Publicado a: 06/12/2024

“Triste (Pensas em Mim)” é uma canção R&B de estética trap.

RAISSA estreia-se com single empoderador: “Sentia falta disto na música urbana em Portugal”

Fotografia: José Pereira
Publicado a: 06/12/2024

É com “Triste (Pensas em Mim)” que RAISSA se apresenta definitivamente ao mundo, apesar de esta cantora nascida no Brasil mas criada em Portugal estar a trabalhar no universo da música, de forma mais ou menos discreta, há já muitos anos. Aos 25 de idade, chegou a altura de apostar no seu projecto em nome próprio, após ter assinado com a Warner Music Portugal.

Explorando o espectro melódico e harmónico da sua voz, mas também uma cadência mais rappada, este single é uma canção de R&B moderno com uma estética trap produzida por uma das duplas mais badalada dos últimos anos na música urbana em Portugal, Ariel e Migz.

“Em termos musicais, estive muito tempo à procura da cena específica que me apetecia fazer”, explica RAISSA ao Rimas e Batidas. “Porque sou versátil, navego em cenas muito diferentes na música, desde bossa nova a R&B, afro, rap… Juntar isso tudo num ponto em que me faça sentido demorou bué tempo. E também ter produtores que entendessem a minha vibe e que não a quisessem conduzir para um sítio que fosse só deles.”

A artista já se tinha cruzado com Ariel no estúdio há alguns anos, quando gravou vozes para uma faixa de Syro. Quando ouviu Finda, o álbum de Bárbara Bandeira editado em 2023 e produzido por Ariel e Migz, percebeu que poderiam estar ali as pessoas certas para o seu próprio percurso.

“Aquele álbum tinha uma vibe muito mais R&B e fiquei ‘uau, identifico-me com isto’, e lembrei-me de lhe dar um toque. ‘Bora trabalhar juntos e ver o que é que sai’. E deu certo, até porque também estava muito mais evoluída na minha própria linguagem, porque eu também produzo.”

A música foi idealizada numa única sessão. “O Ariel fez a melodia, eles fizeram o beat, eu fiz logo o refrão. Sou muito uma pessoa de refrões, normalmente é a partir daí que se constrói a música. Preciso bué de ter o conceito ou uma imagem daquilo que quero que a música seja. E a minha música é muito uma cena de cores — esta, para mim, sempre foi azul, por exemplo. Daí veio a cena do ‘Triste’. Gravei o refrão e depois comecei a escrever.” Acabaram por marcar mais sessões de estúdio, apenas para limar arestas e afinar detalhes. “Sou muito picuinhas com as vozes.”



Olha para este single como um “bebé novo” em relação à sua identidade artística. “Veio mostrar uma nova RAISSA, uma nova possibilidade de RAISSA. De tudo aquilo que vim a construir até agora, mesmo em termos de posicionamento, veio mostrar muitas coisas. Que cenas quero dizer, de que maneira, mesmo até visualmente”, diz, aludindo ao videoclipe realizado por XZ.

Com infância passada em Minas Gerais, descendente de brasileiros alemães por parte da mãe (Bhering é um dos seus apelidos) e de brasileiros negros por parte do pai, RAISSA cresceu num contexto muito musical. O seu pai, cantor e instrumentista, sempre ouviu muita música negra do Brasil, mas também nomes como Sade, Craig David ou Nina Simone. A mãe, detentora de uma “gigante” colecção de vinil, é fã de Djavan, Tribalistas ou João Bosco, embora também ouvisse algum pop rock internacional.

No meio disto tudo, nasceu RAISSA, que começou a cantar e a tocar ainda em criança. Aos cinco anos já tinha um teclado que tocava pela casa toda, recorda. O primeiro concerto que fez, com direito a um pequeno cachet e tudo, aconteceu quando tinha 12 ou 13 anos numa noite de Natal.

“Estávamos nas Caldas da Rainha. Eu na altura tinha parado de cantar, desde nova que cantava mas depois tinha parado porque sofri bullying e engordei muito, não queria que as pessoas se apercebessem de mim, então comecei a desenhar. Entretanto, quando o meu pai voltou do Brasil, disse-me: ‘Queres fazer guita, queres cantar?’ E eu aceitei. Ganhei 30 paus, foi o meu primeiro cachet e posso dizer que foi a minha primeira cena profissionalmente.”

Não demorou muito até voltar a ser convidada pelo pai, sobretudo integrado no circuito da música brasileira de Lisboa, onde cantava e tocava covers de bossa nova e MPB nos bares e restaurantes da capital portuguesa, embora também houvesse espaço para outras canções.

“O meu pai deve ter percebido que eu tinha algum potencial e começou a treinar-me — ‘bora desenvolver isto.’ Lá para os 15 anos comecei a ir às residências dele no Bairro Alto, para ir cantando uma música ou outra. Cantava muito Amy Winehouse, tipo a ‘Stronger Than Me’. Aos 16 comecei a cantar com ele num bar brasileiro, o After Music, em Telheiras. Depois comecei a tentar tocar piano e ele incentivou-me nesse sentido. Foi o meu primeiro instrumento, só que uma vez levei-o para o bar e não senti aquilo… Nunca mais levei. E a minha mãe começou a fazer força para eu ter o meu instrumento, para ter mais gigs. Porque os donos dos bares queriam contratar pessoas que tivessem o seu próprio instrumento. Foi aí que comecei a aprender a tocar guitarra. E comecei a fazer o circuito de bares sozinha, lá para os meus 17.”

Ao contrário do pai, teve sempre a convicção de que gostaria de compor, gravar e lançar música da sua autoria. “Não posso ser como o meu pai, eu tenho de lançar. E mesmo o facto de me lançar tão tarde já me estava a fritar.” Dois anos depois, começava uma aventura que ainda se prolonga, e que lhe abriu muitas portas pelo caminho. Foi convidada para uma audição para se tornar a cantora dos Impossibly Funky, a banda residente do Tokyo Lisboa que toca funk, soul, R&B ou pop de texturas idênticas.

“Foi aí que o pessoal me começou a conhecer mais. Sempre tive a cena de querer sair do circuito brasileiro, gosto e edifica-me bué, é toda uma cultura e um repertório musical que faz todo o sentido eu ter, mas hoje, lá está, estou a fazer uma cena trap… Queria explorar outras coisas. Na altura queria cantar mais funk, soul, cenas a puxar para esse lado. E aquilo foi incrível para mim, porque a banda de Impossibly Funky era mesmo isso, com sopros e a puxar para cenas tipo James Brown. Fez-me sentido, consegui sair do meio brasileiro e consegui explorar mais a voz, comecei a cantar Christina Aguilera e Beyoncé. Evoluí muito em termos de performance, de canto mesmo, como intérprete.”

Além da experiência em palco, começou a receber convites para ir a estúdio gravar vozes ou participar em espectáculos como back vocal. Seja num ou noutro ambiente, cruzou-se com Branko ou Bispo, passando por B.E.R.A. Mais recentemente, fez uma participação numa faixa de Chico da Tina e cantou no single “Interestelar” de Plutonio

Nos últimos anos, tornou-se também conhecida como parte integrante da formação de Bateu Matou ao vivo. À frente do trio de bateristas e produtores composto por Ivo Costa, RIOT e Quim Albergaria, são RAISSA e Pité que cantam, puxam pelo público, movem-se em palco e funcionam como MCs da performance. “Foi das melhores coisas que me aconteceram, damo-nos super bem, eu digo que eles são os meus tios! É um projecto de que me dá mesmo gosto fazer parte”, afirma.

Ao longo dos anos, foi também gravando muitas músicas suas, de registos distintos. “Eu já tinha todo um álbum em inglês que nunca saiu, espero que um dia saia, mas estou a pensar em adaptar as letras para português para um dia talvez sair, com uma cena muito mais roots, de eu a tocar guitarra acústica, o que é uma vibe diferente”, explica. 

“Dantes começava as músicas com muitas vozes, depois percebi que poderia focar-me mais na lead voice, depois entrei mais na cena do rap e a descobrir que gostava de drill e trap, e especificamente de plugg. ‘Ok, vou explorar este caminho’. E depois percebi que conseguia escrever mais nesse sentido. Foi toda uma construção. É engraçado porque, referências minhas como a Doja Cat, são artistas que são rappers mas também cantam, têm um lado melódico. E eu sou um bocado ao contrário. Eu canto, sou cantora, mas depois vou mais para a estética trap. Foi uma questão de ir ouvindo e descobrindo.”

Embora “Triste (Pensas em Mim)” esteja a ser apresentado como um single solto, não será certamente a única faixa de RAISSA a ser ouvida nos próximos tempos. “Este single vem um bocado solto, mas a música que estou a criar neste preciso momento já está bué nesta vibe. O que as pessoas podem esperar que venha aí é com esta linguagem.”

Mesmo que já tenha ponderado por diversas vezes sair de Portugal para tentar uma carreira musical lá fora, acabou sempre por ficar e sente que fazia “falta uma voz feminina” como a sua no panorama nacional.

“Com as coisas que quero dizer e aquilo que quero representar. Quero, principalmente, empoderar e poder trazer consciência a uma série de assuntos. Quero representar aquilo que sou e servir de exemplo para quem possa vir a seguir. Sinto que faltam mulheres nesta indústria, por vários motivos: falta de oportunidades, machismo, às vezes por falta de tomates. E aquilo que quero dizer nas minhas músicas e letras… A ‘Triste’ é uma música com um ambiente sensual, uma letra de uma mulher que não está a falar de uma perspectiva de ‘ai baby, estou triste porque te perdi’. Não, estou a dizer precisamente o contrário. E é um bocado sobre isto e sinto falta de ver isto em Portugal, no mainstream, na música urbana e no hip hop. Onde é que estão as mulheres a dizer isto? Onde é que está a ser dada plataforma para as mulheres poderem dizer isto e serem ouvidas? É para haver representatividade nesse sentido.”


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