pub

Ilustração: Riça
Publicado a: 25/03/2021

Techno, house, hauntology e outras ondas.

Oficina Radiofónica #55: Especial Monster Jinx

Ilustração: Riça
Publicado a: 25/03/2021

Oficina Radiofónica é a coluna de crítica de música electrónica do Rimas e Batidas. Música Electrónica? Sim. Techno e footwork, house e hauntology, cenas experimentais, ambientais, electro clássico e moderno, drum n’ bass e dubstep, dub e o que mais possa ser feito com sintetizadores e caixas de ritmos, computadores e osciladores e samplers e sequenciadores e outras máquinas que façam “bleep”, “zoing”, “boom” e “tshack”.



[Monster Jinx Type Beat] Monster Jinx Type Beat / Monster Jinx

Respondendo a um desafio do Musicbox que lançou uma iniciativa no âmbito de um programa de apoio à cena musical criado pela Câmara Municipal de Lisboa, a editora do Monstro Roxo lançou o projecto Monster Jinx Type Beat, uma espécie de supergrupo criado a partir de talento da casa, aglomerando os significativos skills de Vasco Completo, guitarrista e produtor, DarkSunn, produtor, MAF, teclista e produtor, Maria, produtor, e SlimCutz, DJ e produtor. Nesta formação estão representadas diferentes, vá lá, “gerações roxas”, incluindo veteranos ligados à criação da editora, que remonta a 2009, como SlimCutz, e recrutas mais recentes, como é o caso de Vasco Completo, que se prepara para lançar álbum de estreia no próximo mês.

O resultado desta adição de visões é de uma coerência extrema, uma daquelas ocasiões em que o resultado surpreende mesmo quem conheça bem cada uma das parcelas envolvidas na conta final. Navegando águas de um hip hop altamente cinemático, com um subtexto algo psicadélico que resulta de um cuidado sound design (que trata bem a noção do espaço) conferindo, como num bom filme, profundidade de campo a cada plano, com variados detalhes a povoarem os arranjos sempre generosos em elementos. Soa a library music criada no século XXI, mas consciente dos pergaminhos do género desde os anos 60 do século passado. E isso atribui ao todo um pendor algo melancólico, com as sessões conduzidas via zoom a captarem de alguma forma essa saudade da partilha de um espaço comum. “Body Closer” é disso mesmo sintomático exemplo, no seu passo dolente e no jogo entre os samples de voz, os pads sintetizados e demais elementos sónicos, quase como se estes Monster Jinx Type Beat nos estivessem a pintar um quadro, substituindo cores por sons, pinceladas por arpejos. É fechar os olhos, para se ver melhor.



[DarkSunn] “almada” / Monster Jinx

Este “fado” de DarkSunn é denso, negro, espesso, opaco, uma caverna sem luz onde apenas subsistem os sons de uma guitarra, um ritmo pesado e repetivivo, e aquele aviso de um amolador de facas mutante que está presente para tratar das lâminas de samurais ou guerreiros de um qualquer tempo imaginado e distante. Mas é em “almada” que tudo isto se passa, num primeiro sinal dessa carta de amor que terá a forma de um álbum, Almada Velha, que o selo roxo colocará nas ruas ainda este ano. No título está contida a chave para se entender DarkSunn, e não apenas pela sua directa referência geográfica, mas também por nele estarem codificadas duas ideias importantes: a de periferia, por um lado, a ideia de alguém que se posiciona do lado de lá, noutra margem, aí fincando os pés e aí deixando as suas raízes – e esse lado de lá pode ser o de um certo hip hop, de uma certa prática cultural; e isso liga-se à tal outra ideia impressa nas entrelinhas do título, a de uma alma velha, de um OG, de alguém que entende que o tempo não é um fardo ou um peso, antes uma marca que se deve ostentar com orgulho. E DarkSunn, percebe-se escutando com atenção este “almada”, já cá anda há muito tempo.



[Vários Artistas] ROXO 07 / Monster Jinx

Exército roxo convocado, eis o volume sete de uma série lançada em cassete que tem documentado parte importante da nossa beat scene. Disseram “presente” Vasco Completo, Don Pie Pie, Raez, DarkSunn, J-K, Xando, Liquid, Stray, E.A.R.L., Ghost Wavves, Maria, NO FUTURE, MAF, OSEB e Sh33p. Ou seja uma tropa de elite capaz de ir da melancolia (Vasco Completo) à euforia (Don Pie Pie), das bedroom jams (Raez) à música para detectives que conduzem Fords Cortinas (DarkSunn), das rimas esqualidamente poéticas (J-K) às absurdamente sexys (Stray), da beatologia futurista (Xando) aos exercícios de groove de baixo criado para ser ouvido em passeio de skate na marginal (Liquid), da música para jogos de computador frenéticos (E.A.R.L.) à que foi pensada para aquele clube específico de Shibuya (Ghost Wavves), do drum n’ bass mutante (Maria) ao vaporwave reimaginado por Afrika Bambaataa (NO FUTURE), dos abismos tipo Grand Canyon feitos de baixo e kicks demolidores (MAF), à dream pop para robots do futuro (OSEB) e, finalmente, de tudo isso até às bandas sonoras para filmes científicos sobre as sinapses que ocorrem no cérebro humano  (Xando, uma vez mais), terminando, como é suposto, na música da festa que um dia destes vamos todos querer frequentar naquele bar de praia a que só vai quem considera Miami Vice de Michael Mann um filme profundamente romântico (Sh33p). É muita coisa, sim, mas está toda pintada em diferentes tons de roxo. Não é defeito, é mesmo feitio.



[Vasco Completo] “Lullaby for the Inebriate” / Monster Jinx

“Não é uma faixa fácil de categorizar”, assegura-se nas notas de lançamento de “Lullaby for the Inebriate”, o primeiro single de Wormhole, álbum que o guitarrista e produtor que também escreve abundantemente no ReB se prepara para editar dentro de algumas semanas. Desafio aceite, eis a minha tentativa: esta criação de Vasco Completo é soul para sonhadores que acreditam que Frank Ocean é um génio, que os Daft Punk eram robots com alma de anjo, que a electrónica pode ser tão orgânica como um jardim de ervas aromáticas e que a guitarra tem cordas que vibram na mesma frequência dos corações mais puros. Acertei?

pub

Últimos da categoria: Oficina Radiofónica

RBTV

Últimos artigos