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Fotografia: Filipe Feio
Publicado a: 25/05/2021

Sobre ciclos que terminam (e outros que começam).

y.azz x b-mywingz: “Nós experimentamos muito em estúdio”

Fotografia: Filipe Feio
Publicado a: 25/05/2021

Dois anos depois de terem sido as grandes vencedoras do EDP Live Bands, em 2019, y.azz e b-mywingz dão a conhecer CYCLES, o seu álbum de estreia que conta com a distribuição da Sony Music Portugal — algo que também é fruto dessa vitória.

Mariana Prista, a cantora e a letrista, e Margarida Adão, a produtora — e artista incluída no artigo “Afinal, o futuro da música portuguesa passa mesmo é por aqui” –, contam com as contribuições de nomes como KOMET, Kyo, Vasco Completo, Maninho ou ZMESS para as ajudar a pintar este disco que contém nove “retratos” emocionais em que se deambula entre os campos do r&b, da pop e do rap.

Depois de darem por terminado mais um ciclo da sua parceria, o Rimas e Batidas voltou a conversar com a dupla para uma viagem que começa no passado, passa pelo presente e termina no futuro.



Já se passaram quase dois anos desde que venceram a sexta edição do EDP Live Bands. Como tem sido esta aventura?

[y.azz] Acho que tudo aquilo que nós retiramos também foi afectado pelo que aconteceu no mundo. Temos os dois lados da balança: por um lado foi muito bom, aprendemos imensa coisa, estivemos a trabalhar naquilo que gostávamos e tivemos a sorte de estar a ser apoiadas, porque se não tivéssemos tido o apoio do EDP não teríamos conseguido fazer o álbum, tendo em conta as circunstâncias actuais; por outro lado foi difícil gerir a parte criativa durante uma pandemia. Mas em retrospectiva e agora que está tudo encaminhado, foi super importante para nós, apesar de todas as dificuldades que tivemos. Aprendemos imenso, chegámos aqui de uma maneira que não teríamos se não tivesse acontecido o que aconteceu.

[b-mywingz] Ao longo de dois anos, basicamente, foi como a Mariana referiu, muita coisa aconteceu, mudámos muita coisa em nós, não só a nível criativo, mas também pessoal, obviamente. Quando digo criativo, também devo dizer profissional porque a parte profissional também tem [a parte] criativa e nós, como artistas, apesar de termos uma editora por trás a distribuir-nos, muito do trabalho dos bastidores, que houveram foi feito por nós e acho que isso também é de valorizar. Basicamente é isso, fizemos imensos contactos, trabalhámos com pessoas diferentes, conseguimos, ganhámos experiência que não tínhamos anteriormente, o que é muito importante, não só a nível de produção musical como de produção vocal.

Vocês passaram de produzir à distância para um formato mais profissional: quais é que foram as diferenças e como foi este processo?

[y.azz] Não sei se noto assim tanta diferença no profissionalismo das coisas. Mesmo quando estávamos a trabalhar à distância, eu vinha cá. Portanto, a questão da distância era só na primeira fase, porque escrevia lá e depois vinha cá e trabalhávamos em conjunto. Mudou mais pela pandemia do que vivendo noutro país. Mas não sei, sempre trabalhámos da mesma maneira: no início cada uma faz a sua parte e vamos trocando ideias, e depois quando vamos gravar mesmo é que fazemos uma fase final. Nós experimentamos muito em estúdio. Acho que a maior mudança foi as melhores condições para o fazer e claro que é diferente porque de repente estávamos no estúdio e tínhamos mais alguém na equipa que nos estava a ajudar e era mais sério do que nós. E pronto, acho que essa foi a principal diferença, acrescentar alguém que sabia mais o que estava a fazer do que eu, por exemplo, que não estava nada habituada a gravar-se [a si mesma], muito menos com mais pessoas.

E para ti, Margarida?

[b-mywingz] Foi praticamente igual, era o que a Mariana estava a dizer, não houve uma grande diferença a nível da gravação em si ou da parte profissional o que houve se calhar foi… voltando ao dia um de gravação do álbum, no Complexo 1025, houve um crescimento gradual de algo que se calhar não tínhamos na Big Bit, por exemplo, [no que diz respeito à] produção vocal. Porque a pós-produção foi feita em casa, no meu home studio. Mas foi o que a Mariana disse, na Big Bit tínhamos acesso ao material e às horas de estúdio também, [no entanto] aqui tínhamos um elemento “novo”…

[y.azz] E começámos a conviver com mais pessoas da área, o que nos ajudou e deu outro entendimento daquilo que é realmente fazer música. Se calhar, falo por mim, acho que levei muito mais a sério fazer o álbum, ou seja, estava muito mais focada em fazer as coisas bem do que quando estávamos a gravar na Big Bit porque a grande diferença é que não havia direcção propriamente. Antes tínhamos ideias e estávamos a trabalhar, mas não tínhamos datas, um objectivo concreto, percebes? Muda as coisas…

Ou seja, o facto de terem uma obrigação contratual fez com que …

[y.azz] Não é uma obrigação, é mais uma responsabilidade de fazer um álbum e isso torna tudo diferente.

Saberem que podiam fazer este álbum de uma maneira mais profissional deu-vos, de certa maneira, mais disciplina? Mudou os vossos hábitos de produção e criação?

[b-mywingz] Eu acho que sim… agora se calhar não fazemos as coisas que fazíamos há dois anos, fazemos de maneira diferente, de maneira mais objectiva, de maneira mais assertiva, acho eu..

Que coisas diferentes é que fazem em concreto?

[y.azz] Eu posso dizer uma!

[b-mywingz] Dá-lhe.

[y.azz] Eu aprendi a gravar maquetes antes de ir para estúdio. Mas acho que isso foi uma consequência do álbum, não propriamente do início. Também temos de ter em conta que nós começamos a trabalhar nisto há dois anos e tivemos várias paragens, portanto acho que tivemos processos de aprendizagem diferentes à medida que o tempo foi passando. Sempre que havia uma pausa grande, por exemplo: tivemos dois meses sem ir para estúdio, eu lembro-me de que quando voltámos éramos muito mais eficientes. Depois voltámos a parar e quando voltamos, outra vez, crescemos mais. Não sei se concordas comigo, mas eu sinto isso, Margarida.

[b-mywingz] Sim, concordo!

Então vocês conseguem ver o álbum como se houvessem faixas marcadas no tempo ao longo dos anos, sendo que a maior parte delas já estavam definidas desde início. O produto final também é uma consequência deste passar do tempo?

[y.azz] Sim até porque nós conseguimos dividir o álbum em fases, quase como o início, o meio e o fim.

Como é que podemos fazer essa divisão?

[y.azz] Consigo dizer-te qual é que foi o meio, a “Did It All Again”, e depois disso vieram as únicas duas que escrevemos após, a “These Days” e a “Paris”. E eu acho que se as pessoas ouvirem, se tiverem isto em conta, acho que se nota a diferença entre o que foi o início, onde houve um ponto de viragem a nível sonoro, acho eu, e o que veio a seguir.



Margarida, como é que tu descreves essas fases em termos sonoros?

[y.azz] Para isso ela tinha de concordar comigo. [Risos]

[b-mywingz] Percebo o que a Mariana está a dizer, faz sentido, estás a dizer que sentes mais riqueza no último “produto”?

[y.azz] Sinto que é diferente, em termos de escrita e pronto, isto é uma coisa mais pessoal. É mais para mim do que para ti, provavelmente…

[b-mywingz] Eu sinto que mesmo a nível de composição e produção as últimas coisas, especialmente a “Paris”, acho que são das minhas grandes produções. É uma coisa da qual me orgulho muito de ter feito e tinha dúvidas antes, se conseguia fazer algo assim. Se calhar começas o álbum com uma “Slowdown”, que já foi feita há um ano e meio e vais fechar o álbum com uma “Paris” ou com uma “Leftovers”. Mas não estás a dizer de número?

[y.azz] Não estou a dizer de número, estou a dizer que consigo meter certas faixas em certas alturas e dividi-las em períodos de tempo.

[b-mywingz] Mas não te estás a guiar pela tracklist

[y.azz] Não, não…

[b-mywingz] Então sim, concordo contigo.

[y.azz] O que eu estava a dizer é que no álbum existem períodos diferentes em que eu ouvindo e sabendo a experiência… consigo dizer que a “Repeat” foi a primeira que nós fizemos dali. Se tivesse ouvido a “Slowdown” e a “Repeat” há uns anos, acho que não tinha nada do que tem hoje. E acho que quando voltámos para estúdio com elas, acrescentámos muito. Sinto que elas parecem mais “de agora”, mas sinto também que há um crescimento. Noto bué a diferença de uma “Paris” e de uma “Far From Home”: ambas têm violinos, têm elementos parecidos de composição e tu notas bué a diferença e um crescimento claro no que estás a fazer. No bom sentido, eu sei que são músicas completamente diferentes, estou a falar pela questão dos violinos e pela cena orquestral. Eu noto bué crescimento em ti…

[b-mywingz] Thank you!

Mariana, explica-me um bocadinho como foi o processo criativo para as letras, visto que também foi escrito ao longo de um tempo, e em que aspectos é que tu sentes que a produção da b-mywingz fez sentido na tua identidade musical, tanto no início, como agora.

[y.azz] Posso já responder relativamente à identidade musical: eu acho que cada uma tem a sua, mas criámos uma em conjunto. Acho que o que fazemos juntas é nosso e não retira nada às duas. Acho que criámo-nos juntas: a Margarida foi primeira pessoa com quem trabalhei a sério e em mais do que uma música a longo prazo. E acho que fomos aprendendo o que cada uma gosta em particular e é nosso. Consigo rever-nos e saber o que é diferente e olhar para o álbum e ver que é nosso. Claro que é importante porque começámos em conjunto e não teria chegado aqui sem ter feito este álbum. Relativamente às letras, é bué complicado porque, lá está, foram dois anos de vida num álbum e eu, pessoalmente, só posso falar do que faço, do que vivo e a minha experiência. Já disse isso imensas vezes: eu escrevo de acordo com aquilo que sinto e pode ser uma coisa [sobre a qual] esteja a reflectir, [pode ser] sobre o passado, um momento presente e ser só um desabafo. Claramente que noto em que fase da vida estava sempre que ouço…

[b-mywingz] É tipo um album de fotografias, sabes?

[y.azz] Sim! [Risos]

[b-mywingz]: Quando vais ver um álbum, “ah, 2017 estava assim!”

[y.azz] Há coisas que eu ouço e não gosto — não é não gostar da música em si – mas aquela fase em que pensas: “porque é que fizeste isto? Porque é que estás a repetir esta situação?” E não sei, depende… mas posso falar da minha favorita.

Qual é que é a tua favorita?

[y.azz] Posso falar da “These Days”.

Como chegaste à letra final?

[y.azz] Muito rápido! [Mas] depois de muito tempo a empatar com o instrumental — não sabia o que fazer com ele. Isso foi depois da manifestação do ano passado, ou seja, o contexto era que estava a haver toda aquela situação do Black Lives Matter, com as manifestações e eu tenho quase a certeza que eu escrevi depois, e veio de um sítio de frustração. Não saber o que fazer para ajudar e querer fazer alguma coisa e querer falar sobre isso, mais do que publicar histórias e ser activa em combater o problema da maneira que posso. Foi só uma necessidade de ser vocal em relação àquilo que se estava a passar e de mostrar de que lado é que nós estamos. Isso para mim é bué importante, para além de haver representação, que as pessoas que não estão nesse sítio e que têm todo esse privilégio que mostrem qual é a direção certa, e qual é o caminho que deveríamos estar todos a seguir. Acho que se nós temos uma plataforma é para usá-la para isso também, e não sermos ignorantes, não é? Convém…

O vosso projecto acaba por ser um bocadinho de causas, por assim dizer? Uma vez que a “Cycles” foi pensada no sentido de alertar para a saúde mental…

[y.azz] Muitas delas são uma reflexão disso porque, e eu já disse em todo o lado, sofro com isso e está super presente. Há três anos eu não conseguia pisar um palco sem chorar e estar mal e ansiedade e as depressões… Não sei se o projecto é a favor de causas, mas nós, em particular, falamos sobre isso porque passamos por isso.

Margarida, há pouco tempo foste considerada uma artista importante para o futuro da música portuguesa pela Rimas e Batidas. Como é que vês esse reconhecimento?

[b-mywingz] Vejo esse reconhecimento como “prémio, e eu não gosto muito de prémios, mas vejo um pouco como um prémio. Mais a nível de motivação e estou-me a sentir orgulhosa pelo que temos vindo a desenvolver — este prémio é também um bocadinho da Mariana porque as músicas que tenho vindo a desenvolver são com a Mariana, para mim também tem um bocadinho dela — vá, é metade teu! [Risos]

[y.azz] Não te tiro o mérito!

[b-mywingz] Sinto que é o reconhecimento de todo o hard work que tenho vindo a ter e muitas vezes não é perfeito, nunca é perfeito, muitas vezes tem muitas falhas e é esse o struggle, não repetir o erro do primeiro dia, ou do segundo dia. Fui reconhecida e foi uma grande motivação para pegar e fazer mais. Principalmente nesta indústria musical em que é o “agarre-se quem puder”, tu vês o comboio a passar e tens de o apanhar, porque passam muito poucos. Obviamente deixou-me muito feliz ter conquistado esse bocadinho ao lado de pessoas que são tão importantes para a música e para a cultura portuguesa, como [são] os outros nomes da lista. Aliás, toda a gente que faz música e que faz arte é importante e tenho a certeza que falta ali muita gente naquele quadro.

Agora que o CYCLES viu uma “closure”, este projecto vai ter mais para andar ou, a partir de agora, pretendem explorar os horizontes de forma individual?

[y.azz] Pessoalmente, não sei se me meto em mais alguns, no geral, porque não há dinheiro [risos] e é difícil e é muita coisa. Acho que as duas estamos a explorar individualmente e a fazer outras coisas e é [isso o] suposto, também, e ainda bem para nós. E acho que se lançámos um álbum juntas é também porque vemos um futuro nisto, não é? Se não, não fazia muito sentido sequer termos continuado a trabalhar juntas. E acho que, pelo menos para mim, claro que quero continuar a trabalhar e a colaborar, só não sei se assumia a questão dos álbuns, mas por uma questão completamente diferente. Temos de ser realistas e vou ser muito sincera: é muita despesa. É mesmo muito investimento, é muito trabalho. Foi bom ter o objectivo, agora vai ser bom relaxar um bocado e ser só criar porque nos apetece.

[b-mywingz] Acho que é tipo uma relação aberta [risos], nós fizemos uma coisa bué bonita e sabemos como é que resulta e acho que há sempre mais espaço para explorar mais coisas. É importante para as duas explorarmos os nossos caminhos, até para irmos buscar experiência a outros lados e não estarmos sempre na bolha.

[y.azz] Acho que é bué importante trabalhar com pessoas e colaborar, isso depois traz muito mais, eu se calhar trago muito mais para a mesa depois de trabalhar com mais pessoas e abrir a minha cabeça um bocadinho. Tu também estiveste a produzir com outras pessoas e é isso, é aprender coisas novas que só saindo daqui [é que se consegue].

Pergunta-bónus: quais é que são as expectativas para o álbum?

[b-mywingz] Então, queremos chegar ao top nacional de vendas, queremos ser artistas do mês no Spotify, queremos disco de platina na “These Days” e mais tarde disco de ouro para o disco e é só! [Risos]

[y.azz] “E é só” [risos]. Eu nunca tenho expectativas e acho que isso é muito saudável para a minha saúde mental. A sério, não tenho expectactivas nenhumas. Tudo o que sair daqui é bom, tudo o que aprendemos foi bom e valeu a pena e a nossa carreira também não acaba aqui, portanto vamos sempre continuar a fazer música, mesmo que — bato sempre na madeira mil vezes — mesmo que isto corresse mal, acho que já nos trouxe muito. Por isso, tudo o que vier daqui já vai ser bom, aliás, já está a ser com o feedback que temos recebido…


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