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Fotografia: Cláudio Ivan Fernandes
Publicado a: 17/07/2022

Podes sempre voltar a um sítio onde já foste feliz.

SBSR’22 – Dia 3: da elegância e compaixão de Mayra Andrade às dinâmicas envolventes de Woodkid

Fotografia: Cláudio Ivan Fernandes
Publicado a: 17/07/2022

Foi em mais uma tarde com sol a escaldar na pele que se abriram as portas para o último dia da edição de 2022 do Super Bock Super Rock. Trocando entre o relativo fresco do interior da Altice Arena (que bem aqueceu com o passar das horas – mas já lá vamos) e o calor abrasador do exterior, o capítulo final do SBSR era talvez aquele que pudesse ser descrito como o “mais” rock – afinal, eram os britânicos Foals os principais cabeças-de-cartaz do dia -, mas que teve muito para oferecer além de guitarras ao alto e suor imenso. Comecemos a contar a história, então.

Para abrir oficialmente a nossa passagem pelo Parque das Nações, decidimos enfrentar as horas de maior calor e ir ao encontro da folktronica sonhadora e mística de António Miguel (que é como quem diz, Metamito) pelas 16h40 no palco LG by Rádio SBSR.FM. O vencedor do último Music Unlock promovido pela Rádio SBSR.FM surgiu em palco, perante uma plateia muito escassa (merecia muitos mais a ouvir e descobrir a sua música…), de guitarra em punho, pronto a dar o melhor uso possível a um teclado e a uma loop station para ajudar a construir as suas canções em palco. 

O concerto de Metamito foi uma espécie de resumo do percurso que tem criado ao longo dos últimos cinco anos, mas também um de preparação para o futuro que está ao virar da esquina para o produtor e multi-instrumentista de Sintra. Resgatou faixas como “Cura” (daquelas para fecharmos os olhos e deixarmo-nos perder nas suas texturas sonoras), a onírica “To Dance With Mesuda”, a hipnotizante “Quem é quem (Aquele que inventou o sol)” e a super-dançável “Pandora” (que relembrou ser a razão por estar ali a tocar) ao seu passado para deleite da audiência, e abriu o (nosso) apetite para aquilo que virá do seu disco de estreia, ainda a sair no que resta de 2022. Desse trabalho discográfico, fez-se ouvir a lindíssima “Soro da Verdade” – o seu mais recente single –, tocada com a ajuda de loops de guitarra portuguesa (chegou mesmo a ser tocada com a boca para criar um loop!!), e a pujante “Oração Sem Sujeito”, uma nova canção a fazer lembrar um pouco um Pedro Mafama e que coloca Metamito bastante próximo de se tornar mais um artista a cantar os novos fados. No final, chegou mesmo a pedir desculpa aos fadistas tradicionais pela sua versão do estilo, mas nós julgamos que não havia razão para pedir desculpa – foi (tudo) perfeito assim. 



Terminado o concerto de Metamito, hora de repor líquidos e começar a preparação para nos deslocarmos para um local bem mais fresco que o exterior ofegante, o palco Somersby, mais conhecido no dia a dia como a Sala Tejo da Altice Arena. Lá pelas 18h25, esperávamos encontrar Rafael Alves (aka Lhast) a iniciar o seu concerto, mas ainda demorou quase 10 minutos antes que isso acontecesse “à séria”. Dizemos à séria porque, oficialmente, o concerto começou às 18h25, certamente, mas com um DJ set. Com a sombra do “concerto” de DaBaby do dia anterior ainda a pairar pelo festival, talvez não tenha sido a melhor ideia adoptar uma estratégia semelhante (mas em menor escala, graças a Deus) por parte da trupe de Lhast. Prossigamos, no entanto.

Após o término desse warmup, Lhast lá surgiu em palco para começar o espectáculo propriamente dito, sendo recebido por uma plateia que podemos descrever como poucos mas bons. O seu nome certamente conseguiria atrair mais público que aquele que se encontrava no interior da Sala Tejo – e foi crescendo em números com o avançar do espectáculo –, mas nem o horário nem o dia escolhido para a actuação terão sido o mais favorável para o artista. Mesmo nestas condições, a energia de Rafael Alves em cima de palco foi efusiva, constantemente correspondida da melhor forma possível pelos fãs mais acérrimos do produtor (um dos grandes do hip hop tuga, relembre-se) e rapper português. 

A energia ao máximo foi certamente o maior foco do concerto de Lhast. Mesmo nos momentos em que se podia cair numa espécie de espaço morto entre canções, Rafael Alves certificou-se que o público não esquecia onde estava: num concerto de trap. Por isso, Lhast tentou que a sua passagem no SBSR fosse um jogo q.b. saudável entre o seu uso intensivo de auto-tune, barulhos de buzina de hóquei (porquê?) e instrumentais que iam sendo tocados, um após o outro, pelo DJ que o acompanhava em palco. “Pa’Cima”, uma das faixas de AMOR’FATI, abriu o concerto, sendo grande parte do espectáculo ainda dedicado ao seu mais recente longa-duração. 

“QE” surgiu para aprovação do público, “Pluto” foi banger mesmo sem LON3R JOHNY (não houve espaço, ou talvez tempo, para a inclusão de convidados no concerto de Lhast, para nossa enorme pena – queríamos ouvir “jND” com a ajuda de 9 Miller) e ainda terminou com um belo momento a cappela, “2020 foi iniciada com pedidos de festa, “VI” sujeitou coro do público no (quase hilariante) refrão, “Saturno” fechou as hostilidades com nota positiva e “11915” surgiu após um agradecimento aos técnicos que ajudaram a reerguer o Super Bock Super Rock em tempo recorde. 

Durante o espetáculo de Lhast, ainda existiu tempo para se ouvir faixas como “SAFE”, que serviu mais como hype para a cena do que propriamente uma canção tocada, ou “BOSSY”, uma espécie de versão encurtada de “Tou Bem”, a faixa de #FFFFFF onde Lhast apareceu pela primeira vez em gravação por trás de um microfone, tendo sido recebida com grande entusiasmado por parte do público, e dois momentos daquele que será o próximo disco de Lhast, prometido em palco que sairia lá para Setembro ou Outubro. Primeiro, uma nova faixa, onde apenas se fez ouvir a parte de Lhast – a feature ficou como surpresa para o futuro –, e depois “ES7ÁDIO”, que voltou a ser bem recebida pelo público. A nota que fica do concerto de Lhast é que, apesar de vocalmente ao vivo ainda estar a precisar de um danoninho ou outro para chegar à altura de outros camaradas, a sua energia foi mais que suficiente para satisfazer quem o foi ver ao SBSR. Veremos o que esse sucessor de AMOR’FATI tem para oferecer em breve.



Terminada a nossa aventura ao lado de Lhast, tivemos de acelerar o passo para a nossa primeira incursão pelo palco principal do festival, denominado, obviamente, Palco Super Bock. O objectivo era ir ao encontro do concerto de Mayra Andrade, que com grande “Afeto” nos recebeu. A cantora e autora cabo-verdiana fez tudo o que podia – e mais – para preencher com vida e cor a Altice Arena que, mesmo não estando preenchida, a recebeu de braços abertos. Com grande parte do concerto preenchido por temas do seu mais recente trabalho discográfico, o excelente Manga, Mayra Andrade utilizou o tempo de palco que lhe foi disponibilizado da forma mais eficiente possível. 

Em alguns momentos, fez-se a real festa com canções como “Limitason” ou “Tan Kalakatan” – com direito a um improviso final fantástico entre Mayra e a sua banda –, “Tunuka” foi o funaná que justificou muitos passos de dança por parte do público (e um lembrete que Lisboa também é funaná!) e“Pull Up” soou fantástica ao vivo. Em outros momentos, Mayra não esqueceu as histórias e momentos que a marcam. No final de “Terra de Saudade”, dedicou todo o concerto àqueles que sofrem, ano após ano, com os incêndios em Portugal, e mais à frente, contou a história por trás de “Vapor di Imigrason”, dedicando a canção aos seus avós e a todas as lutas do povo cabo-verdiano. 

Com tudo isto em mente, e com esta explosão de emoções a acontecer, Mayra Andrade deixou para o final mais dois belos momentos que guardara na manga. Primeiro, apresentou pela primeira vez ao vivo “Bom Bom”, a sua colaboração com Batida (e uma das melhores faixas do ano, diga-se) e, depois, desfilou por entre os seus fãs em “Lua”, tornando o espaço fechado da Altice Arena numa verdadeira comemoração da ideia de comunidade e multiculturalidade. O único defeito a apontar ao concerto de Mayra Andrade é um: terminou. Por nós, tínhamos ficado a ouvi-la o resto da noite.



Falando em noite, o concerto de Woodkid encontrou na escuridão do palco EDP (ou seja, a Sala Tejo outra vez) um local perfeito para um dos espetáculos mais visualmente arrebatadores que tivemos a oportunidade de encontrar nesta edição do SBSR. Com muito do público ainda a recuperar o fôlego depois do suor e energia libertados pelo rock alternativo dos Foals no palco principal do festival, o espectáculo de Yoann Lemoine foi como uma brisa de ar fresco para ajudar a baixar a temperatura corporal. 

No seu regresso ao Super Bock Super Rock – que frisou ser um festival importante para si por ter sido um dos primeiros em que tocou após o lançamento do seu primeiro disco, The Golden Age –, Woodkid trouxe na sua bagagem S16, o seu mais recente álbum, ao qual dedicou grande parte do espectáculo. “Pale Yellow” soou sensual e dançável, com uma aura de cool claustrofóbico a pairar sobre esta, “In Your Likeness” foi um momento bonito em que a voz de Yoann foi um foco principal, e “Highway 27” foi uma explosão de electrop que justificou todo e qualquer movimento de anca – e isto são só exemplos daquilo que se ouviu do segundo disco do artista responsável pelos telediscos de artista como Taylor Swift, Lana Del Rey ou Katy Perry. Pelo meio, ainda arranjamos tempo de escutar algumas faixas de The Golden Age, como “Iron” – gigante ao vivo – ou “I Love You”, recebida muito bem pelo público, e também símbolo da dinâmica a contribuir para a qualidade do espectáculo de Woodkid, numa conjugação entre as suas faixas mais rítmicas e poderosas e as mais ambiente e minimalistas, dominando o público como queria ao longo dos dois tipos de momento. Que regresse em breve em nome próprio a uma sala intimista para sentirmos ainda mais a clemência destas canções – justifica-se.



No final da noite, decidimos ir dar um pulo a ver o que Jamie xx aprontava no palco principal. O membro dos The xx regressou ao festival por onde já tinha passado a nome próprio em 2016 para um misto entre concerto e DJ set que tornou a Altice Arena numa verdade pista de dança. Sempre com baixo bem carregado, pronto a ser sentido pelas entranhas do público, Jamie xx tocou algumas faixas de In Colour (cujas cores da capa surgiram como bónus visual em certo momento), como “Gosh” – que continua a soar magnífica ao vivo – ou “Seesaw”, alguns dos seus mais recentes singles, com destaque particular para “Idontknow”, que colocou todas as pessoas a abanar a anca com energia, que para alguns, certamente seria já pouca, mas para outros, seria mais que suficiente para ficar ali a noite toda numa espécie de rave improvisada, e um ou outro remix (conseguimos identificar ali para o meio “On Hold”, faixa dos seus The xx), manipulado ao vivo com a ajuda da sua mesa para colocar todo o público em sintonia. E qualquer concerto onde se ouve Jorge Ben Jor e Tom Zé torna-se automaticamente bom, certo? Não fazemos as regras, mas acreditamos que essa máxima esteja aqui bem empregue. 

Por outras palavras, o espectáculo de Jamie xx foi uma forma bastante positiva e animada de terminar a nossa excursão pela atribulada edição de 2022 do Super Bock Super Rock. O festival regressa em 2023, entre os dias 13 e 15 de Julho ao Meco, mas num novo espaço.


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