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Publicado a: 04/07/2017

#ReBPlaylist: Junho 2017

Publicado a: 04/07/2017

[FOTO] Direitos Reservados

Nova música de Tyler, The Creator, novos álbuns de Vince Staples e Jay-Z e o regresso de Valete. No mês de Junho, o rap nacional e internacional juntou uma série de novidades de peso, algo que nem sempre acontece, mas que começa a ser mais “normal” nos dias de hoje. Nas escolhas da redacção ReB, o destaque vai para a inovação do MC de Long Beach, o rap consciente de um rapper que andava adormecido, a house ácida de Blondes, a estética underground de Pedro, o Mau e L-Ali, a frustração de um rapper com a superficialidade da indústria, a irascibilidade lírica e sónica do membro dos Odd Future ou a maturidade e transparência de Jigga.

 


[Vince Staples] “Alyssa Interlude”

Terceiro tema de Big Fish Theory e a certeza absoluta de que Vince Staples quer fazer diferente. Com a produção de Zack Sekoff, sample de The Temptations e excertos de uma entrevista da Amy Winehouse de coração destroçado, “Alyssa Interlude” soa a algo saído da mente de Burial, ou da maquinaria de Aphex Twin, ou até da cave onde os Radiohead cozinharam o Amnesiac. Alice Interlude é um dos jovens rappers mais promissores da actualidade a revisitar o título de um dos grandes livros de Miguel Esteves Cardoso: O Amor é fodido.

Diogo Santos


[Valete] “Rap Consciente”

A faixa que mais se destacou neste mês no universo das rimas e batidas em Portugal foi, sem grandes dúvidas, “Rap Consciente” de Valete. Não por ser aquela com a musicalidade mais inovadora, com as melhores rimas ou o instrumental mais viciante, mas por se tratar do regresso marcante de um dos ícones mais elevados do hip hop português – embora os “11 anos de pausa”, mencionados por vários, sejam manifestamente exagerados, dado o número de temas e participações que Valete fez ao longo dos anos, desde que editou Serviço Público em 2006.

Ainda assim, trata-se de um regresso vincado e, além disso, de uma tomada de posição. O músico que é um ídolo para tantos e, que por outro lado, ganhou um calcanhar de Aquiles depois de o anunciado Homo Libero nunca ter saído, começa por se justificar em “Rap Consciente” pela ausência ou pela falta de actividade a um nível mais profundo.

Parte depois numa análise e crítica ao rap “burguês” e “burro” que se pratica nos dias de hoje, com “alianças com kizombeiros” e “rimas de ostentação e materialismo”, que muita especulação gerou nas redes sociais, com os fãs à procura de quem tinha no peito o laser vermelho que saía da sniper verbal de Valete. O próprio dá a indicação de quem está fora de perigo quando tem inúmeros MCs a figurarem no videoclipe – e outros foram “ilibados” pelo rapper em declarações a Rui Miguel Abreu.

Valete emerge das sombras onde permaneceu durante anos como observador atento, mais ou menos silencioso, mostra-se desiludido com o rumo do hip hop e, apesar de nunca se afirmar como tal, representa a figura de um salvador que vem resgatar a essência consciente do rap – ou liderar um movimento de alternativa aos standards actuais, de “rap de combate”.

Por fim, assume que por vezes foi “paradoxal” na sua mensagem e que não tem “superioridade moral”. É a muito esperada auto-reflexão no habitat natural de um artista complexo que passou por várias fases e que parece agora iniciar outra. Mais do que tudo, é a primeira vez em vários anos que vemos Valete com uma atitude e posição tão sólida, com uma ideia, uma mensagem delineada que nos parece que não vai ficar por aqui. E diz que, apesar de o álbum não ser para já, vamos ouvir mais novos temas em 2017 (sem contar com “Poder”, que é exactamente o rap educativo e consciente de que Valete fala em “Rap Consciente” – além de pregar, faz). Esperemos que sim. E todos sabemos também que Viris, como um dos mais talentosos rappers que já pisou um palco neste país, sabe fazer melhor; e que melhor só poderá vir daí.

Ricardo Farinha


[Blondes] “KDM”

A magia continua. Cinco anos após um disco de estreia homónimo que colocou os Blondes num patamar muito especial, Warmth aterra neste 2017 com a mesma pertinência de sempre. Pelo meio, houve quatro vigorosos capítulos que vieram a aprimorar a matéria e cunhar uma identidade cada vez mais pessoal. A visão de Sam Haar and Zach Steinman sobre a house em 2017 é, afinal de contas, irresistível: formas aquosas, tonalidades multicolores e uma depuração pós-acid rumo à celebração.

“KDM” é uma malha em crescendo, digna de uma construção perfeita de elementos. A alta fidelidade das suas gravações é sempre um extra, conferindo uma definição ideal de formas, batidas, melodias e vozes. Nunca é certo quando uma surge e outra desvanece, mas é com essa lógica de liberdade com que fazem tudo confluir. Brilho, leveza e ascensão são ganhos garantidos com “KDM”, o primeiro avanço deste novo álbum – que marca igualmente a mudança de editora, da RVNG Intl para a R&S (ambas bastiões máximos dos nossos tempos). Um luxo auditivo.

Nuno Afonso


[Pedro, o Mau] “Bengala” feat. L-Ali

“As coisas já mudaram um pouco” é um facto. 3 anos após a estreia, agora com um invejável currículo repleto de edições que nos chegam a uma agradável velocidade, Pedro e Hélder continuam a criar e a descobrirem-se como se da primeira vez se tratasse. E isso reflecte-se na música que fazem: cada nova faixa começa sempre no mesmo ponto de partida, no “nada”. Não há bases ou directrizes que lhes apontem um caminho a seguir. Começam do zero com apenas uma preocupação em mente, a de tentar explorar um rumo diferente daquele que seguiram nos temas anteriores.

Hoje estão mais maduros. E “Bengala” é um perfeito reflexo disso mesmo. O cunho experimental cada vez mais se alia à sabedoria que vão adquirindo de todo o processo editorial, que leva um tema desde a sua origem até à montra do YouTube ou do Bandcamp. O resultado, que antes poderíamos até estranhar, agora rapidamente se entranha e leva-nos até à mais louca das viagens sónicas, no limbo entre a electrónica e o hip hop. O futuro desta dupla, tanto a solo como em conjunto, parece-nos cada vez mais risonho. “Abrandar” é um termo que não surge nos seus dicionários.

Gonçalo Oliveira


[Don L] “Eu Não Te Amo”

“Eu Não Te Amo” é o ponto de partida de Roteiro pra Aïnouz, Vol. 3: uma faixa em dois actos em que Don L desvenda de imediato não só aquela que será a temática dominante do álbum como a versatilidade das composições. As linhas superficiais que dão forma ao cenário do rap brasileiro actual e a mediocridade de quem o representa estão bem vincadas nas referências aos wannabe gangsters ( “Todo mundo é Escobar agora ou um Tony” ), de forma mais vaga, é certo, mas também em linhas que parecem dirigir-se especificamente a outros MCs, como é o caso de Criolo ou Emicida, nos versos “Com um papo Buda zen / Pra sugar bem / Pagar cinquenta ao bamba rei do samba / Se é MPBoy a grana vem / Igual passarinhos voando”.

O sucesso de ambos não precisa, sequer, ser lembrado e as referências a Convoque Seu Buda, Espiral das Ilusões – onde a electrónica foi substituída pelo cavaquinho num álbum dedicado ao samba – e a faixa Passarinhos, em parceria com Vanessa da Mata, nome forte da MPB, pretendem ser mais uma crítica ao mercado distorcido do que aos próprios MCs.

Com participação do pernambucano Diomedes Chinaski e vozes adicionais de Terra Preta, “Eu Não Te Amo” foi co-produzida por Don L e Deryck Cabrera, com beats do último.

“O processo de criação deu-se em duas etapas: a própria música tem dois momentos. No começo, passa essa sensação de aceitação, de que apesar de “tudo ser superficial”, está “tudo bem”, explica Deryck Cabrera, ao ReB. “Depois, a transição para a segunda parte, que contém versos do Diomedes, onde se percebe sua raiva e tensão, embora de uma forma mais madura.”

Segundo o produtor, a primeira parte da faixa, onde foi beber a Compton de Dr. Dre, foi criada meses antes, quando nem sequer se conheciam. Já a segunda parte, foi uma co-produção na íntegra. “Todos os elementos dessa faixa foram tocados: piano, violino, synths… criámos tudo juntos, tanto escolhendo timbres de synths quanto pensando nos arranjos…”

Ironia do destino, o beat foi inicialmente proposto a Emicida, que não se mostrou muito satisfeito com a ideia. “Antes de conhecer e mostrar o beat para o Don L, Emicida e eu estávamos trocando ideias sobre criarmos alguma música juntos e mostrei esse beat para ele, mas ele nao curtiu muito e devolveu… (Risos)”. Das pequenas curiosidades também vivem as grandes faixas.

Núria Rito Pinto


[Tyler, The Creator] “Who Dat Boy”

Tyler é um tipo especial, tão especial que devemos perdoar-lhe ter-se cortado ao Super Bock Super Rock (na verdade não ficamos pior servidos com King Push, mas seria tão mais fixe contarmos com ambos no cartaz, como é óbvio). Até porque, ao que tudo indica, haverá boas razões para isso: o seu programa para a Viceland, Nuts + Bolts, e, esperamos todos de dedos bem cruzados, um novo disco? Há sinais importantes nesse sentido: em 24 horas apenas, o ex-patrão da Odd Future lançou dois novos temas, “911 / Mr. Lonely” e este “Who Dat Boy” que conta com a participação de A$AP Rocky. Importante acreditar que isso possa sinalizar a vinda de algo mais substancial: não se atira assim um novo tema com Lord Flacko para a net se não se estiver a semear algo especial. E o tema é potente, como só poderia ser tendo em conta o calibre dos dois protagonistas. Num beat pontuado por strings maléficas e com percussões explosivas, de forte inspiração grime, Tyler e Rocky desfiam pedaços de ego que são ecos directos das suas personas artísticas. Nem outra coisa seria de esperar.

Rui Miguel Abreu


[Jay-Z] “The Story of O.J.”

“Maturidade” é a palavra mais associada ao novo disco de Jay-Z, 4:44. “The Story of O.J.” é o retrato mais violento, em termos de escrita, do que é o papel actual de um homem rico e negro nos Estados Unidos da América, um país com problemas sociais agravados pela entrada de Donald Trump na casa mais famosa do mundo. Nina Simone, um símbolo de resistência feminista e artística, é citada através do sample de “Four Women”, incluído no beat smooth de No I.D., um dos grandes arquitectos deste trabalho bem-conseguido. E, melhor do que grande parte dos MCs, Hov continua a falar sobre a realidade com a tal caneta invisível ninguém consegue partir: “Financial freedom my only hope/ Fuck livin’ rich and dyin’ broke/ I bought some artwork for 1 million/ 2 years later, that shit worth 2 million/ Few years later, that shit worth 8 million/ I can’t wait to give this shit to my children“.

Alexandre Ribeiro

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