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Texto: ReB Team
Publicado a: 02/08/2021

Sinais do presente.

#ReBPlaylist: Julho 2021

Texto: ReB Team
Publicado a: 02/08/2021

Não há volta a dar: T-Rex entrou definitivamente na rota do estrelato e Portugal será certamente curto para o que as suas canções têm para andar. É pelo primeiro avanço do álbum de estreia do autor que começamos, mas isso é apenas uma gota de água num oceano de sete canções que vão saciar de todos: do fã do rap menos óbvio e popular ao amante das baladas mais sedosas.


[T-Rex] “Volta”

Há bastante tempo que se percebeu que Tóy Tóy T-Rex não é mais um. O rapper/cantor/produtor da Linha de Sintra é um artista fora-de-série, que, depois de começar a ser requisitado por nomes de primeira linha, tem vindo a afirmar-se e a consolidar-se em nome próprio perante um número de ouvintes cada vez maior. T-Rex é rap, é trap, é r&b, é potencial pop, são batidas e sotaque afro, energia que vem do âmago e refrões melódicos lentos, flows contagiantes e rimas que conquistam mentes e corações. É, claramente, o fruto de muito trabalho e paixão, de muito instinto e identidade. “Volta”, o mais recente single, é só mais uma prova deste percurso ascendente — mas resume bem várias das qualidades deste dinossauro nada tirano que tem tempo (e tem tudo) para chegar mais acima na cadeia alimentar.

– Ricardo Farinha


[BADBADNOTGOOD] Signal From The Noise

Fazer o grande esquema da pop moderna (seja lá o que isso for) sem incluir os BADBADNOTGOOD começa a ser uma tarefa complicada. Depois de terem esbatido a linha que separa o jazz do hip hop e de unirem as suas raízes mais formais com a soul, a pop e a folk no seu período mais “adulto”, os ainda jovens canadianos parecem querer mudar novamente as regras do seu jogo e, muito possivelmente, de outros jogos.

Se editar por uma label de referência, como a XL Recordings, podia trazer algum conforto à banda para repetir as fórmulas tão bem-sucedidas, a verdade é que, a julgar pela primeira amostra, o resultado é exactamente o oposto. “Signal From The Noise” é intrigante, fresca, diferente de tudo o que já fizeram e, sobretudo, é possivelmente a faixa menos confortável que alguma vez produziram. Pelo mundo virtual circula a tag de novo jazz psicadélico como modo de descrever a união deste baixo dominante e hiper saturado de efeitos com uma bateria sem fim à vista de tão empolgante que é, e linhas melódicas de teclado que continuam extremamente límpidas e emocionais.

Num período em que o novo rock britânico espreita com curiosidade o que o jazz tem para oferecer, os BADBADNOTGOOD deixam no ar a ideia de estarem a fazer o caminho inverso. Algures no meio das suas viagens talvez se encontrem. Até lá, vamos cortar o parlapié e ir directos ao assunto: tirem pelo menos nove minutos do vosso tempo e atenção. De preferência tirem até mais, pois a probabilidade de quererem repetir é grande.

Impressionante a quantidade de vezes que estes rapazes acertam em cheio.

– Luís Carvalho


[Vince Staples] “TAKE ME HOME”

“Take home like I clicked my shoes”, remete-nos a Dorothy e à sua viagem mágica pelo mundo de Oz e o seu retorno à estabilidade. Essa frase é o início do doce refrão cantado por Fousheé em “TAKE ME HOME”, um dos destaques do novo álbum de Vince Staples, e funciona como um resumo das palavras claustrofóbicas e sinceras do rapper de Long Beach neste tema.

Há uma calma no beat, transmitida pelo loop de guitarra soalheiro e os 808s rimbombantes, e a batida lembra uma brisa mais forte de Verão que nos embala nesta viagem pela mente de Vince Staples. É brutalmente honesto desde o início (“I don’t wanna die but I will for the cause”), e mostra que, apesar de ter escapado à dureza das ruas que o viram crescer,  ainda não conseguiu purgar todos os seus demónios interiores (“Don’t wanna dream ‘bout the shit I done did”).

“TAKE ME HOME” é sobre não conseguir esquecer o passado mas é também sobre não saber com o que contar no presente (“When I hit the set, it’s loaded, I don’t know who envy me”). A resposta a esta incerteza é seguir o nosso próprio caminho, e se há algo que Vince Staples demonstra é que está num trilho cada vez mais individual.

– Miguel Santos


[IDK] “Red” feat. MF DOOM, Westside Gunn e Jay Electronica

Há um misto de emoções que fica quando os nossos heróis partem e nos deixam música inédita que vai sendo revelada ao longo do tempo. Se, por um lado, a vontade de ir a correr carregar no play é maior que nunca, por outro, o sabor dessa novidade costuma ser sempre agridoce. Essa experiência voltou a confirmar-se aquando da edição do novo disco de IDK, USEE4YOURSELF, com a faixa “Red”, na qual se pode ouvir uns quantos versos soltos de MF DOOM. 

Além do vilão, o tema conta ainda com as igualmente surpreendentes participações de Westside Gunn e Jay Electronica, em que o primeiro, embalado pelos coros, violinos e “disparos” que anunciam este majestoso confronto de pesos pesados do rap (e inclua-se IDK neste saco, ele que passou dos corredores de um estabelecimento prisional — onde tomou a decisão de se tornar rapper — para os corredores de Harvard — onde vai promover e leccionar um curso sobre a indústria da música), abre a faixa com a carismática e exuberante falta de modéstia que o distingue, e o segundo a termina no seu habitual tom profético e imponente. Ainda assim, o vilão e herói, em poucas palavras, acaba por roubar o espetáculo e levar a melhor sobre todos. Aliás, na verdade, fá-lo apenas com uma — “wikipedia”.

– Paulo Pena


[Dellafyah] “Vazio” feat. Tilt

Dellafyah é, também, Kilu e Tilt é… bem, Tilt é Tilt. Vocês já sabem. E chegamos ao final de mais uma react, por isso subscrevam, metam like e partilhem com os vossos amigos. Estou a brincar. Não se vão já embora, fiquem mais um pouco comigo neste falso “Vazio” construído por dois mestres em processo de reflexão existencial: o primeiro refugiou-se no finger drumming para chegar o mais perto possível do orgânico e do humano; o segundo voltou a mergulhar no fundo da sua existência para perceber o que anda a fazer por aqui, numa espécie de sucessor espiritual (menos acintosa no resultado final) de “AMOR ROMANO“.

Não vemos o líquido a correr, mas ambos sangram abundantemente para dentro deste tema que de vazio só tem mesmo o título. E não precisam de lhes dar flores, basta que os deixem ser. O tempo há-de lhes dar o resto.

– Alexandre Ribeiro


[Silk Sonic] “Skate”

É num quintal qualquer que uma banda anima uma festa de Verão cheia de exímias patinadoras. Em tempos de Jogos Olímpicos e de vitórias que nos enchem de orgulho e relançam o debate do mérito e talento negros, é bom saber que também há quem role sobre rodas em nome da arte e não apenas em busca de um pódio. Mas esta é outra patinagem, artística de outra maneira, com outro balanço, com outra ginga. 

Bruno Mars e Anderson Paak lideram a tal banda, assumindo a dianteira com uma barragem de percussões. O homem de Malibu e o de 24K Magic pegam na bateria e nas congas, respectivamente, vestem os seus fatos de Silk Sonic e trazem um tão clássico (e classy…) quanto intemporal groove disco para a rua, lembrando os tempos em que os roller rinks eram também espaço para míticas noites de disco e funk, de r&b e electro. Agora só falta um Verão à altura deste “Skate”.

– Rui Miguel Abreu


[Herlander] “Gisela”

Quanto mais música Herlander lança, mais se complica tentar categorizar ou encontrar um rumo sonoro estruturado para o seu futuro. A exploração dos recortes do sample, a elevada densidade emocional das suas melodias, os beats pesados e a sua voz que tanto consegue ser angelical e doce como robusta e áspera (assim como a sua arte), são os principais instrumentos que, juntos, fazem do músico alguém tão especial no panorama musical português. Podemos ver inúmeras diferenças entre “quem diriaiaia”, “if you give it to me what’s love got to do with it?” e “don’t get their name out your mouth”, mas todas elas têm em comum uma estranheza e uma sensação de inovação que nos faz prestar atenção e reouvir vezes sem conta, como se estivéssemos a tentar descodificar o artista da Maternidade e Troublemaker Records.

“Gisela” é a mais recente peça do puzzle que é Herlander, onde nos mostra um lado ainda mais ambicioso da sua música. Com um vídeo realizado por Guilherme Braz, o artista personifica “Manny”, que mete a diversão e o consumo de substâncias à frente das suas responsabilidades e tenta ao máximo viver uma vida de diversão. Como diz na missiva enviada pela Maternidade, Herlander tentou fugir ao estereótipo sombrio que é feito sobre consumo de drogas, tentando dar ao público o papel de julgarem esta personagem, seja como alguém que está perdido, seja como alguém que simplesmente gosta de ser divertir, tentando gerar um dialogo mais complexo e completo sobre abusos de substâncias: “Na narrativa de ‘Gisela’ queria também trazer ao ouvinte a possibilidade de interpretar a história sem a minha perspectiva estar estampada no som e vídeo como um juízo de facto: nem todos os episódios de pessoas que consomem são destrutivos e nem toda a destruição é só um episódio.”

O título vem do caricato momento icónico da televisão portuguesa em que Gisela Serrano agride outra concorrente do programa Masterplan, que é samplado insistentemente ao longo de toda a música, acrescentando camadas à já composição maximalista repleta de diferentes elementos all over the place. O que começara há dois anos com um refrão catchy e uma batida seca foi ao longo deste tempo absorvendo diferentes ambiências e fases de Herlander, transformando-se em algo muito maior que uma música pop de dança. “Gisela” é rica com um experimentalismo (uma palavra que muitas vezes é mal utilizada, mas que não creio ser o caso) que torna a leitura desta música complexa, que não nos deixa confortáveis liricamente, nem sonicamente, e que nos deixa hipnotizados pela posição que Herlander tem no panorama musical pop, de dança, e vanguardista (algo que, recentemente, só Conan Osiris fizera). Herlander é salta, é gritar, é dançar até à exaustão, é derramar em lágrimas, é muito trabalho árduo, é sentir o presente. É “gisela com o pai dela”.

– Francisco Couto


[NAO] “And Then Life Was Beautiful”

Na discografia de NAO, já houve mais ou menos de tudo: vendavais de sabor soul, festins de electrónica serrilhada, romance de uma só guitarra. Por intensa ou preenchida que uma canção se tornasse, era raro não reservar alguns segundos para nos recompormos: acontecia em “Back Porch” (a primeira faixa de todas), “It’s You” (a mais despida de todas as suas trovas), “Bad Blood” (a primeira sensação tangível). Saturn, disco que contava das dores de crescimento, abria com “Another Lifetime”, uma negociação entre silêncio e caos. Mas tínhamos de aceitar tomar esse espaço. À chegada de um terceiro álbum, And Then Life Was Beautiful, a faixa-título faz antever um tratado de alegria — e, de repente, esse intervalo para respirarmos, esse intervalo de cortesia, já não é algo que temos de sentir. “Take a second just to breathe it out/ ’Til it feels good, you’re doing so good” — pode ser piroso ou amoroso, dependendo da disposição. Há pouco que surpreenda na suavidade cintilante desta NAO — mas NAO faz música ajustada à sua vida, e não lhe desejamos mais montanhas-russas.

– Pedro João Santos

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