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Shuffle completamente descontrolado na banda sonora de Julho da redacção do ReB. A electrónica de Four Tet encontra-se com a sujidade de Allen Halloween; a energia de P Money vai de mãos dadas com o registo de intervenção de Djonga e Vic Mensa rola sozinho na primeira avenida longa que encontra na sua carreira.
No sétimo mês de 2017, as cinco escolhas ficaram por conta de Diogo Santos, Núria R. Pinto, Rui Miguel Abreu, Gonçalo Oliveira e Alexandre Ribeiro:
[Four Tet] “Two Thousand and Seventeen”
O produtor britânico tem novo disco na calha, sendo previsível a edição nos próximos meses daquele que será o sucessor de Morning/Evening, de 2015. Em jeito de avanço para o nono álbum de Kieran Hebden na pele de Four Tet, os 4 minutos e 12 segundos de “Two Thousand and Seventeen” partilhados na página de Bandcamp são um claro regresso às sonoridades mais contemplativas do Four Tet de, por exemplo, Rounds (2003). Bom, se quisermos vasculhar um pouco mais no baú de Hedben, parece haver ali também qualquer coisa de Fridge, a banda de post-rock que não edita desde 2007. “Two Thousand and Seventeen” convida ao relaxamento, algo que vai bastante bem com a maresia ou com um vídeo da perspectiva aérea de uma área protegida como o Estuário do Cávado.
Diogo Santos
[Djonga] “Olho de Tigre”
Liricamente, parece não haver dúvidas: estamos de volta ao rap de mensagem e é Djonga quem o traz. Lançou aquele que já é considerado um dos álbuns mais importantes do ano, independentemente do género, no Brasil e continua a deixar cair rimas pesadas. Em “Olho de Tigre”, faixa incluída na série de perfis da marca Pinneapple Supply, racismo, machismo e fascismo voltam a estar em evidência. Sem meias medidas, sem meias palavras e com direito a refrão que cola e nos faz cair na coreografia. Para ficar de olho.
“Machista / Tá osso, e até eu que sou cachorro não consigo mais roer / E esse castelo vai ruir / E eles são fracos vão chorar até se não doer”
Núria R. Pinto
[P Money] “Liar in the Booth”
O actual panorama do grime está ao rubro. O género musical nascido no Reino Unido tem vindo, aos poucos, a acumular uma nova dose de protagonismo. E desta vez não é Stormzy a agitar o mercado com a sua irreverência de newcomer. São precisamente dois nomes com mais história no movimento a fazer escorrer as barras de batalha mais insanas que o grime tem visto nos últimos anos. E a situação está cada vez mais pessoal.
Há uma década, P Money e Dot Rotten dividiam o mesmo espaço na crew Organized Grime, um super-grupo em que ambos se destacavam enquanto as promessas mais quentes do grime dessa altura. Embora os problemas tenham surgido logo após a edição de OG Season Vol.1, os atritos foram-se arrastando e só agora estão a chegar a um nível mais “sério”.
O Verão britânico está a demonstrar-se de elevada temperatura este ano, ocasião perfeita para os amantes do grime se abastecerem com barras pesadas e tracks possantes por parte destes dois históricos MCs.
A conversa entre P Money e Dot Rotten subiu de tom após o segundo ter, finalmente, endereçado o seu nome numa “Fire In The Booth”, seguido de um tema solto ainda mais directo. “Finalmente, é agora!”, reagia P Money no seu Twitter após a escuta de “Organized Grime Freestyle”. Ao dia de hoje, há já mais de 10 temas editados, frutos desta polémica. Tudo no espaço de um mês. P Money parece seguir na dianteira: não só pela qualidade inegável destes seus novos street bangers, mas também pela quantidade. Snake EP vai já no segundo volume, tendo originado ainda 5 novos videoclipes. Destaque para este “Liars In The Booth”, uma resposta directa à entrada de Dot Rotten no “Fire In The Booth”.
Gonçalo Oliveira
[Vic Mensa] “Rollin’ Like a Stoner”
Vic Mensa vem de Chicago, “rollin like a stoner“, esqueceu-se de tomar os comprimidos (ou tomou os errados) e no processo oferece-nos um banger com o molho certo, temperado com todos os ingredientes que garantem saltos contínuos na pista, entusiasmo ao rubro. É um party anthem, se quiserem lições de vida terão que ir ver o que andam a pregar noutras freguesias. Um bocadinho de hedonismo nunca trouxe (grande) mal ao mundo e às vezes é importante perceber que a música – qualquer música – não tem que carregar a obrigação de oferecer soluções para todos os problemas do universo. Mas no momento em que o som certo nos empurra para aquele salto de olhos fechados, durante as fracções de segundo em que flutuamos uns centímetros acima do chão, a verdade é que tudo o resto desaparece. Este é um desses sons. Vic Mensa pode ter um problema que todos desconhecemos, mas isso acaba por ser algo que todos compreendemos e com que nos podemos identificar, certo? Saltemos, portanto.
Rui Miguel Abreu
[Allen Halloween] “Ruim”
Ser “mau” não é para quem quer, é para quem pode. O nome que se segue é, muito provavelmente, a grande personificação disso. Allen Halloween é uma peça única no xadrez português, um autêntico quebra-cabeças que escreve e produz como ninguém ou seja, não é uma repetição ou revivalismo de algo, apesar de assimilar elementos do pós-punk, grunge, hip hop e até características do rock português para criar um imaginário só seu. “Ruim”, o último single do MC, é mais um passo num caminho que foi construído pelo próprio. Pediram um anti-herói?
Alexandre Ribeiro