Se o rap nasceu para resistir e lutar, não há força da natureza que o extinga. Aqui o bicho só se manifesta nas rimas e batidas, e os nossos soldados não baixam canetas nem no pior dos cenários.
De semana em semana, há novas linhas por decifrar, novos sons por escutar, novas dicas (*) para encaixar. Seja em português ou em crioulo, do masculino ao feminino, desde as maiores estrelas nacionais aos mais anónimos rappers de sótão, do trap ao drill, há espaço para tudo o que nos faça abanar a cabeça. Por dentro e por fora.
[Yuri NR5] “Ninguém”
Terá sido, seguramente, um dos trabalhos mais aguardados pelas gerações mais novas nos últimos tempos, até porque desde os seus primeiros — e únicos, na verdade — temas, Yuri NR5 tornou-se um autêntico artista de culto à escala nacional. Pele & Osso trouxe-o, assim, despido de algumas idiossincrasias da adolescência e expõe-no no seu ainda fresco processo de amadurecimento enquanto artista a instalar-se na maioridade. “Ninguém”, última faixa da mão-cheia de canções que compõem o EP, espelha esse mesmo processo com a Capela do Senhor da Pedra, em Gulpilhares, Vila Nova de Gaia — local sagrado onde também Blasph e Sam The Kid revelaram o seu “Património” —, em pano de fundo.
[Harley KSD] “Kel Duya”
As imagens, captadas por Vitor Pream, revelam-se verdadeiramente fascinantes, a começar desde logo para aquele que as protagoniza: presumivelmente, Cabo Verde reserva um lugar especial no coração de Harley KSD, e “Kel Duya” transmite essa alegria nostálgica no reencontro com as suas raízes. Sobretudo na luminosidade do refrão desta canção realmente estival.
[Subtil] “Chora, Fuma & Ri”
Por muito drasticamente que a batida mude — e esta, acelerada e festiva em dose reforçada, poder-nos-ia levar no engodo —, as linhas não enganam. E apesar de reconhecermos em Subtil um registo inequivocamente seu que nunca chega a soar previsível, admiramos-lhe as esporádicas investidas por caminhos sonoros menos prováveis. Agora, já da palavra versada propriamente dita não se poderá dizer o mesmo: ainda que o rapper algarvio não acuse displicência na monotemática, não deixamos de suspirar por outros devaneios seus. Que criatividade e imaginação para preencher cadernos com tinta afiada não lhe faltam.
[Azart] “OMEN”
Entretanto passou um ano desde que Azart editou o seu álbum de estreia, e desde o lançamento de Foco não tivemos mais novidades do rapper de Lisboa em nome próprio. Entre “bag”, com Big Jony, e “Metamorfose”, com ela li, ainda pudemos ouvi-lo a versar material novo, mas foi preciso esperar por uma ocasião especial para o regresso aos singles a solo se dar: “OMEN” chega como canção simbólica da nova fase que Sebastião Oliveira agora anuncia — com um primogénito seu a caminho.
(*O título da nossa coluna, Dicas da Semana, inspira-se num clássico de Biru)