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Se o rap nasceu para resistir e lutar, não há força da natureza que o extinga. Aqui o bicho só se manifesta nas rimas e batidas, e os nossos soldados não baixam canetas nem no pior dos cenários.
De semana em semana, há novas linhas por decifrar, novos sons por escutar, novas dicas (*) para encaixar. Seja em português ou em crioulo, do masculino ao feminino, desde as maiores estrelas nacionais aos mais anónimos rappers de sótão, do trap ao drill, há espaço para tudo o que nos faça abanar a cabeça. Por dentro e por fora.
[Landim] “Scarface”
The rhymes, Chico, they never lie. E as de Kamikaze já levam dez anos de autenticidade. Foi, aliás, na mesma semana em que Landim lançou “Scarface” que o seu célebre disco mereceu uma celebração à altura no B.Leza (antecipada com uma entrevista publicada por aqui). Uma década depois de editar um álbum decisivo na sua já longa carreira, o rapper de Mem Martins é actualmente uma das maiores referências do rap crioulo feito em solo português, unanimemente considerado um Tony Montana do hip hop nacional.
[TILT] “Tundra”
É pela “Tundra” que o rap gélido de TILT mais prospera, daí que não seja fácil nele entrar — e ainda mais difícil dele sair. Ter uma palavra a dizer nessa paisagem sonora também não é para qualquer um, mas figuras como Cora, Pilha e DJ Ketzal não são nada estranhas ao ambiente cultivado pelo MC que tem trilhado caminho em nome próprio, com ORTEUM ou, mais recentemente, em ESCALPE. Mas a pegada que “Tundra” deixa é mais uma das que temos seguido rumo ao seu novo álbum a solo, Espirro, que esperamos estar, enfim, para breve. Já nos basta a presente travessia no deserto.
[João Tamura x Beiro] “sem pé” feat. L-ALI
João Tamura lamenta a poesia que não soube ler, quando é a sua que nesta sede mais merece ser lida. Poeta é, aliás, uma caracterização que, ao contrário do que se considera sobre a larga maioria dos seus pares, lhe é devida, pacífica. Mesmo antes de ser rapper. “sem pé” é, nesse sentido, mais um poema musicado pelo artista que versa invariavelmente sobre uma fuga, idílica e reconciliada, da cidade a dois — com Beiro responsável pela musicalidade do texto, e L-ALI surge enquanto trunfo indispensável neste compêndio de verdades que cabiam em museus.
[Slow J] “Origami” feat. Gson
Ainda que encenada no tempo da outra senhora (e não produto da enganadora Inteligência Artificial), a icónica fotografia que registou um aperto de mão entre Amália Rodrigues e Eusébio da Silva Ferreira foi a imagem escolhida para retratar a simbologia subjacente ao Afro Fado de João Coelho. E também Slow J protagonizou, já na última faixa do seu novo disco, um cumprimento memorável com Gson. Num álbum com tamanhas vénias a géneros musicais aparentemente tão díspares, não deixa de haver uma dose significativa — tão ou mais expressiva que nos dois longa-durações anteriores — de rap neste trabalho. Mas, curiosamente, em “Origami” desdobram-se ambos numa poesia puramente confessional, praticamente desprovida de ritmo e adornos melódicos, de tal forma que só as palavras ficam. Para fechar em chave de ouro.
[Montblanc] “Gostava Mais Disto”
Ainda não está cá fora na íntegra, mas o segundo volume da obra produzida pelo Montblanc já tem disponível um documentário do processo criativo que levou à criação de 12 novas faixas. “Gostava Mais Disto” é a quinta canção a ser revelada, nona do disco que aos poucos tem vindo a ser desvendado, na qual trocam galhardetes Ray DLC, GriLocks e Krayy. Mais disto? Vamos gostar certamente.
[b a s k i a t] “Flashback”
Temos sido resistentes a incluir nesta coluna semanal qualquer coisa que, apesar de feita a partir das nossas fronteiras, não venha versada na nossa língua — ou em idiomas dela derivados. Entenda-se, principalmente, rap escrito e cantado em inglês. Mas para “Flashback” tivemos de abrir uma excepção, já que as razões para tal concorrem a vários níveis. Desde logo porque, ainda que rime grande parte das vezes na língua universal, b a s k i a t não deixa de compor faixas, também, em português. E, depois, porque tudo neste “Flashback” nos fez voltar atrás, a começar no beat de Gretzky2x e a acabar na direcção de Bernardo Andrezo; do flow do rapper ao guião do realizador, argumentos de peso não faltam nesta peça que volta a projectar no horizonte a revelação de 50/50.
[Animal x Catalão] “Plano B”
“Tens de ter sempre um plano B, pá”, advertência feita no preâmbulo do dito plano engendrado a meias entre Animal e Catalão. Serve a faixa para antecipar o álbum Denúncia Anónima, que não tardará em sair da gaveta. Estreia já hoje, dia 28 de Novembro, com carimbo Armário Records espetado pelo primeiro. E fica desde já o aviso do próprio autor, para quem não saiba ao que vem: “Meu plano B é estar preparado p’ró que é que venha…”
(*O título da nossa coluna, Dicas da Semana, inspira-se num clássico de Biru)
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