Se o rap nasceu para resistir e lutar, não há força da natureza que o extinga. Aqui o bicho só se manifesta nas rimas e batidas, e os nossos soldados não baixam canetas nem no pior dos cenários.
De semana em semana, há novas linhas por decifrar, novos sons por escutar, novas dicas (*) para encaixar. Seja em português ou em crioulo, do masculino ao feminino, desde as maiores estrelas nacionais aos mais anónimos rappers de sótão, do trap ao drill, há espaço para tudo o que nos faça abanar a cabeça, por dentro e por fora.
[SUBTIL] “GRISELDA STYLE”
O título nem deixa margem para dúvidas sobre qual seria a abordagem de Subtil na sua nova faixa solta. “GRISELDA STYLE” não é, porém, uma recriação da estética que de há uns anos para cá tem deixado marca profunda no hip hop norte-americano e além fronteiras. O beat pode bem ser despido de adornos desnecessários a esta linha sonora, mas aqui é ainda mais minimalista do que gente como Daringer ou Conductor Williams normalmente cria. E nas rimas, o assunto passa mais pelo percurso pessoal do rapper algarvio do que propriamente pela vida do crime como é apanágio do selo Griselda Records. Nessa medida, este é mais um tema “Subtil Style” — e é precisamente nesse registo que gostamos de o ouvir.
[Cjay Pharrell] “GTA Na City” feat. Mini God
A escola de Cjay Pharrell é o funk brasileiro, mas o drill é tudo menos zona estranha ao cantor de Chelas. Já para Mini God, esse terreno está mais que visto e, no sub-género cantado em crioulo, há poucos a fazê-lo com tanta propriedade como o rapper de Oeiras. Juntem-se os dois e o resultado está à vista: um produto audiovisual segundo os códigos de Grand Theft Auto.
[Kaps] “Cara Dontem” feat. Holly Hood
“Cara d’ontem, já não sinto os pés” é daquelas que, inexplicavelmente, ficam sublinhadas nos arquivos. A apetência de Holly Hood para engendrar refrões memoráveis não é inédita, mas o rapper e produtor da Linha da Azambuja — que assina, aliás, a produção de “Cara Dontem” — tem, desde “Peso” a “Volta”, procurado explorar a fundo esse segmento. Até porque, neste último single lançado sob a alçada da Superbad., os versos ficaram a cargo de Kaps. E que versos, deixem-nos que vos diga…
[Farrusco] “Teu Amigo Sou”
Vale a pena voltar a assinalá-lo: louvável o feito de Farrusco que, na sua estreia oficial em longa-durações a solo, ultrapassou a hora de disco em O Cão Que Encontrava Trufas — álbum inteiramente produzido por saraiva e editado pela sua Zona Recs. E, depois de lançado, o projecto continua a merecer atenção redobrada. “Teu Amigo Sou”, 17.º de 20 temas que compõem o novo trabalho deste carismático rapper, é agora, isoladamente, apresentada, já com um complemento visual concretizado pelo homólogo Mura.
[NGA x Van Sophie] “A Chuva”
A depressão Óscar (que nos atingiu particularmente deste lado) já nos deixou entregues ao devido céu limpo de Junho, mas “A Chuva” parece continuar a pairar sobre NGA. Já lá vão os tempos em que o cabecilha da Força Suprema se apresentava (quase) exclusivamente em modo combate. Sinais dos tempos, certamente. Facto é que o rapper que imprimiu uma pegada incontestável no paradigma nacional a partir da Linha de Sintra tem surgido nos últimos tempos com uma postura menos reivindicativa e mais contemplativa. Reflexo, nessa janela onde a chuva cai, de quem já não corre na ânsia de chegar mais longe e olha agora para trás para ver o que já correu. E, para o fazer, quem melhor do que Van Sophie para dar tom (e que tom…) a esse estado de espírito.
[Anonymouz_va] “Sunha”
Anonymouz_va foi um dos últimos nomes a despertar-nos a atenção num radar já de si concorrido. E esse fenómeno deu-se não só pelo facto de ser praticamente um estreante nestas andanças, mas sobretudo por, a partir de uma cadência cada vez mais saturada, trazer um registo muito próprio. “Sunha” é prova dessa dualidade flagrante: por um lado, o instrumental soa a tantos outros que já ouvimos e, por outro, a entrega do rapper revela-se exótica ao ponto de ser realmente fresca.
[Tácio] “Sangue Frio”
Em “Sangue Frio” há uma turma cimeira em evidência, composta por nomes e rostos bem conhecidos da nossa praça, a começar por este espaço de destaque. Desde quem esteve por trás de toda a produção do tema até quem deu a cara por ele, sem esquecer, não obstante, a figura central da novidade — designadamente Tácio, todo ele impenetrável, com a mensagem bem explícita para quem meia palavra basta.
[Real GUNS] “DAVIDS”
“P.D.G (Produto Di Gheto)” tinha servido de prenúncio ao que viria a ser apresentado em DAVIDS. O sucessor de Escrevo Com Sangue (2022) marca a estreia de Real GUNS pela MAR Records, disco editado na semana passada com o icónico jogador de futebol Edgar Davids em homenagem viva, do título à capa, passando desde logo pela primeira faixa do segundo álbum de estúdio do rapper do Cacém — trabalho que será por aqui dissecado em breve, quer em formato crítica, quer sob a forma de entrevista.
[In3gah] “O Elixír”
Curioso que a primeira grande aparição dos In3gah se tenha dado um par de semanas antes do mundo fechar. A estreia discográfica de Sanryse e Bambino, velhos companheiros de armas, com um projecto finalmente assumido a dois deu-se a 29 de Fevereiro de 2020 (dia raro só por si). Desde então, novidades para lá do trabalho homónimo que apresentaram, nada. Talvez o mundo não estivesse preparado para tanta coisa de uma só vez. Daí que, quem sabe, o regresso que agora divulgamos tenha sido assinalado por via alternativa, nomeadamente pela mão de Sebastião Santana, responsável pela realização de “O Elixír” e pela grande maioria dos vídeos desta dupla histórica do hip hop nacional.
[DJ Sims & Cachapa] “Justo”
A coisa chega ao ponto de estranharmos a ausência de novidades de Cachapa. Mas o rapper que tem mostrado trabalho sucessivamente ao longo dos últimos anos sempre aparece para confirmar esse método que o caracteriza. Aliás, só com método de trabalho é que a sua constante evolução se explica. “Justo” é, por isso, o valor mínimo do que, no final de contas, se avaliará em Detalhe, o segundo álbum do MC eborense a ser editado pela Sistema Intravenoso de DJ Sims.
[Stevão NDM x ZOO] “INTRO”
Não é a primeira vez que o mencionamos por aqui, mas é, confessamo-lo, a primeira em que o fazemos totalmente rendidos. A introdução que Stevão NDM deu a Temporibus — EP que há-de ser inteiramente produzido por ZOO, e que tem data de estreia prevista para a próxima sexta-feira, dia 23 — não podia ter sido melhor, na medida em que o rapper se apresenta, aqui, efectivamente como tal: capaz de contar uma história, de ser o verdadeiro protagonista da sua própria narrativa com inteira propriedade daquilo que, afinal tem para nos dizer.
[WAY45] “INTRO”
A “INTRO” não é a mesma que a acima destacada, e o contexto desta é, definitivamente, diferente. Por ocasião da participação da Selecção Nacional de Futebol no campeonato europeu de sub-21, WAY45 (conhecido nos relvados por Rafael Leão) foi quem deu o mote através de um tema da sua autoria — ele que está em vias de editar o seu primeiro álbum de estúdio enquanto rapper. No campo já provou ser uma estrela à escala global, resta esperar para ver se a música lhe reserva um percurso igualmente brilhante. Até ver, já há aqui um bom indício.