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Ilustração: Riça
Publicado a: 01/06/2021

Techno, house, hauntology e outras ondas.

Oficina Radiofónica #60: Império Pacífico / CZN

Ilustração: Riça
Publicado a: 01/06/2021

Oficina Radiofónica é a coluna de crítica de música electrónica do Rimas e Batidas. Música Electrónica? Sim. Techno e footwork, house e hauntology, cenas experimentais, ambientais, electro clássico e moderno, drum n’ bass e dubstep, dub e o que mais possa ser feito com sintetizadores e caixas de ritmos, computadores e osciladores e samplers e sequenciadores e outras máquinas que façam “bleep”, “zoing”, “boom” e “tshack”.



[Império Pacífico] Flagship / Leitura Tropical

A música que Luan Belussi (trash CAN) e Pedro Tavares (funcionário) assinam como Império Pacífico é um prodígio de luz e contenção. Flagship, o trabalho com que sucedem a Exílio, refina pistas exploradas anteriormente e adiciona à sua particular forma uma discreta ambição, como se a música traduzisse a ousadia de dar o extremamente importante passo de deixar de servir as pistas de dança dos nossos delírios de confinamento para se assumir como banda sonora possível para o regresso à normalidade.

Com as ajudas de Noiva, que dá voz a “Spirits Highway” e sintetizadores a “Singapura”, e Bitrot, que também adiciona sintetizadores e “variações rítmicas” ao tema com que os Império Pacífico continuam a reconhecer o seu fascínio pelo Oriente (no primeiro álbum “Nitsusada” apontava para as mesmas latitudes), Luan e Pedro continuam a desenhar derivas de lúdica profundidade, sempre tomadas de luz imensa (não é techno para pistas tomadas de assalto às 4 da manhã…), com forte componente melódica (“Steve @ Bacardi Zone” é um bom exemplo) e propulsão assertiva, mas moderada, em arranjos rítmicos cuja variedade e dinâmica apontam para algo mais do que a mera funcionalidade.

Mas é, realmente, nos synths que a dupla aplica as suas mais valias, desenhando intrincados jogos harmónicos com diferentes pads cujas texturas e perfis sónicos apontam quase sempre para os exotismos digitais japoneses de Haruomi Hosono e para os múltiplos quartos mundos esculpidos no início dos 90 a golpes de DX7. A pedir umas Funktion One bem calibradas, de facto, mas enquanto tal não é possível, esta música resulta de forma maravilhosa em bons auscultadores. Sobretudo se os olhos bem abertos estiverem inundados de mar.



[CZN] Commutator / Lovers & Lollypops

CZN: cobre, zinco e níquel, matéria alquímica que João Pais Filipe utiliza para temperar as suas criações, gongos e címbalos que geram ouro aural, acústico e de profunda riqueza vibracional e harmónica. Foi em 2018 que o então duo do percussionista e escultor Pais Filipe e da baterista Valentina Magaletti se estreou com The Golden Path. Pais Filipe e Magaletti expandem agora os recursos humanos dos CZN com Leon Marks, produtor, o “arquitecto paisagista” que ajuda o duo original a expandir os horizontes com este incrível Commutator.

Há algo de absolutamente xamânico no som dos CZN, que aqui voltam a tecer uma densa tapeçaria de pulsares e ritmos, de cadências expressivas e propulsivas, feitas de sons orgânicos espacializados através da mesa de mistura, ferramenta que os dispersa com reverbs e delays atirando-os ao espaço como quem lança um punhado de poeira ao vento.

Esta é uma música profundamente hipnótica, densa, labiríntica, onde é fácil cada um se perder caso procure tentar seguir algum “caminho” ou “linha” rítmica, tal a forma como os diferentes padrões se entrelaçam, chocam, dando origens a outros. É igualmente algo psicadélica na forma como torna o estúdio “visível” através da interferência “processual” no som registado na oficina de João Pais Filipe.

Commutator faz-se de duas longas peças de cerca de 16 minutos cada (pensadas, portanto, para os melhores resultados possíveis em dois bem impressos lados de um disco de vinil): a primeira, “On An Asset Tip”, é funda, hipnótica; a segunda, “The Golden Path Narrows”, soa quase tribal, como se resultasse de uma gravação de campo num qualquer ritual levado a cabo por alguma civilização perdida entre a sombra das pirâmides e a órbita de um qualquer astro ainda não identificado.

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