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Fotografia: Hugo Lima/NOS Primavera Sound
Publicado a: 11/06/2022

Quem diria que ouviríamos tantos resquícios de nu-metal...

NOS Primavera Sound’22 – Dia 2: os 100 gecs são o duo mais divertido da actualidade

Fotografia: Hugo Lima/NOS Primavera Sound
Publicado a: 11/06/2022

No segundo dia no Porto, a missão continuou a mesma: descobrir o que se passa nos outros palcos que não o principal. Para lá de Stella Donnelly e Pedro Mafama, nada de novo passou (e irá passar) no maior palco do NOS Primavera Sound — e tudo bem com isso –, no entanto, fica uma comichão forte depois de pensarmos que no anúncio de 2020 existiam nomes como Tyler, The Creator, FKA twigs, Bad Bunny ou C. Tangana. Adiante (mas voltando ao início).

Talvez tenha sido do sol forte que se fez sentir na tarde de ontem, mas a verdade é que Rita Vian não esteve ao nível que lhe reconhecemos em prestações passadas. A passagem pelo palco Binance foi curta e, por vezes, atribulada, com a voz a não conseguir manter o mesmo brilho que de outras datas. João Pimenta Gomes, seu habitual parceiro de palco, foi, novamente, peça única no acompanhamento musical que serve de cama para os versos — inquietantes e sempre cheios de alma — da autora de CAOS’A. O grande foco dos cerca de 40 minutos da actuação (a primeira que teve agendada, como fez questão de lembrar, depois de lançar-se a solo) foi precisamente esse EP, o seu único lançamento até à data e integralmente produzido por Branko, nome incontornável da música portuguesa no presente milénio a quem Rita faz sempre questão de agradecer

Sobrou, para lá do curta-duração, ainda algum tempo para exercitar outro material, como “Sereia” e um par de temas não editados que tem levado para cima do palco noutras ocasiões, e mostrar gratidão, mais do que uma vez, pela maneira como o Porto a recebe.

No palco ao lado, o da Super Bock, entrou logo de seguida María José Llergo, artista que opera dentro da estética do flamenco e tem ajudado a modernizar o género, levando-o ao encontro das novas gerações. Para nós, esta foi a segunda vez que tivemos oportunidade de vê-la ao vivo no espaço de uma semana, ela que foi uma das mulheres escolhidas pelo MUSA para representar a criatividade musical feminina em Braga na semana passada. Comparativamente com Vian, a espanhola esteve bastantes furos acima, ao cumprir imaculadamente com a exigência vocal que o flamenco — tal como o fado — exige.



À entrada do recinto, no Cupra, Rina Sawayama foi a representante pop que reclamou bem alto um lugar no palco principal. Não só pela performance (coreografada, sempre in your face, num limite saudável de teasing e com um desempenho vocal notável para a movimentação toda) mas também pela recepção do público, que estava claramente desejoso de vê-la ao vivo em Portugal. Assertiva para que o verbo “slay” não caísse em saco roto, a artista que nasceu no Japão e cresceu no Reino Unido soube jogar as peças certas para executar o chamado revivalismo Y2K, um tipo de future nostalgia, que, neste caso, tanto canaliza o nu-metal (a guitarrista/teclista e a baterista apareceram com mais evidência nessas alturas mais pesadas) como a música que se pede com refrão orelhudo e dançável (e nessa última parte foram as duas bailarinas a ajudá-la nessa importante tarefa que é arrasar).

Tudo nela grita “popular”, até a utilização da música de Succession no espectáculo — e esse foi um pequeno “desvio” do alinhamento que passou, principalmente, por SAWAYAMA (“Dinasty”, “Comme Des Garçons”, “Bad Friends”, “Akasaka Sad” ou “STFU!”) e ainda pelo recente “This Hell”, single do seu próximo álbum. Uma proposta muito divertida — a primeira de duas a que assistiríamos no segundo dia do festival.



Antes de irmos à desbunda total, espaço para a introspecção. Quase deixou de se ver o pavimento em frente ao palco Cupra quando King Krule fez soar os primeiros versos e acordes. Nome de culto entre uma nova vaga de músicos que têm surgido ao longo da última década, o homem que em início de carreira respondia por Zoo Kid regressou ao Norte de Portugal com uma banda composta por guitarrista, baixista, baterista, teclista e saxofonista. O concerto, conforme anunciado pelo próprio, tinha os minutos contados (e um slideshow com um cão como modelo único a passar ininterruptamente), embora o desejo de Archy Marshall fosse que este se pudesse prolongar por mais tempo. Mas houve quem conseguisse vê-lo por duas noites consecutivas, já que na quinta-feira o Ferro Bar acolheu um espectáculo-relâmpago e intimista por parte do cantautor inglês – e a entrada, espantem-se, era livre…

O jogo do passa-palavra não bateu à nossa porta e, por isso, contentámo-nos com o que se passou pelo NOS Primavera Sound. Entre a atitude punk e a estética vanguardista do rock indie que lhe sai das veias, King Krule não terá ido muito além de duas mãos-cheias de canções interpretadas no recinto montado no Parque da Cidade do Porto, mas todas elas foram escolhidas a dedo, de modo a que os seus três LPs de originais tivessem representação no alinhamento de ontem. Perante o mar de gente que se aglomerou para o ver, Krule agradeceu em bom português com um simples “obrigado” e pediu ao público que entoasse um “olá, Marina”, para a filha que completou recentemente o seu terceiro aniversário. Para fechar (achávamos nós), os músicos voltaram ao palco para tocar “Easy Easy”, um favorito dos seus fãs que surge no início da tracklist de 6 Feet Beneath the Moon, a sua estreia em disco. E, apesar de alguém ter segurado um cartaz durante todo o concerto a pedir para subir ao palco para o ajudar a cantar quando chegasse a altura desse tema, a sorte não lhe bateu à porta — mas pelo menos teve direito a um encore.



Há quem os aponte como principais responsáveis pela nova vaga da hyperpop e, por isso, fazia todo o sentido que o NOS Primavera Sound se chegasse à frente para garantir que a estreia no nosso país fosse por estas bandas. Dylan Brady e Laura Les estão na crista da onda do género que promete fazer barulho nos anos que se avizinham e, dado o grau de novidade da coisa, podiam até causar estranheza nos ouvidos do público que habitualmente dedica algum do seu tempo a festivais de música.

No Porto, não foi esse o caso: os 100 gecs pegaram em linguagens da pop que nos são bastante familiares, adaptaram-nas àquilo que os novos tempos exigem e deixaram toda a gente em êxtase com as suas divertidas mutações electrónicas, ultra-saturadas. Neste momento, descrevê-los é ainda uma tarefa complexa, mas pensem neles como uma espécie de sátira xamânica, capaz de invocar os espíritos de uma Avril Lavigne ou de um Fred Durst completamente encharcados em ácidos. Com três trabalhos na rua — sendo que um deles é de remisturas — a dupla prepara agora o próximo álbum 10000 Gecs, que teve alguns dos seus temas em rotação durante aquele que foi, provavelmente, o espectáculo mais interessante e divertido até aqui.

Chico da Tina era, em teoria, a última aposta da noite, mas a longa jornada de hoje e as horas tardias do seu concerto obrigaram-nos a um ponderado regresso a casa. Podem sempre recordar aqui e aqui o que já escrevemos sobre as suas prestações ao vivo ou, se os apanharem por aí, perguntem à actriz Daniela Melchior ou a King Krule e Earl Sweatshirt o que acharam. Mas também podem sempre acreditar no Wandson.


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