pub

Fotografia: Paulo Nogueira / Theatro Circo
Publicado a: 24/04/2023

Ritmos que apelam à união.

Dino D’Santiago no Theatro Circo: uma primavera espiritual que continua a brotar flores

Fotografia: Paulo Nogueira / Theatro Circo
Publicado a: 24/04/2023

Já assisti a muitos concertos do Dino D’Santiago e já muito se escreveu (e também eu escrevi) sobre os seus espetáculos nestas páginas. No sábado, 22 de abril, assistimos a mais uma atuação do músico de Quarteira que carrega a herança de Santiago — e, naturalmente, de todo o arquipélago de Cabo Verde. Mas não foi apenas mais uma. Assistir regularmente a performances de Dino D’Santiago dá-nos essa experiência: os concertos nunca são iguais e Dino, uma pessoa que assumidamente vive de forma intensa o momento, entrega-se sempre de maneira diferente e vibra apaixonadamente com cada atuação.

Neste caso, havia a particularidade importante de o espetáculo ter acontecido no majestoso Theatro Circo, em Braga, que foi mesmo considerado por Dino como a melhor sala do país. A meio do alinhamento — e, novamente, mostrando aquilo de que o artista é feito, tendo uma solidariedade, bondade e amor ímpares — o cantor abdicou do seu espaço para deixar brilhar Cati (outrora Cati Freitas), velha amiga dos tempos dos Expensive Soul ou dos Nu Soul Family. A bracarense apresentou-se na sua cidade — e na tal sala tão emblemática — para estrear ao vivo, em primeira mão, um novo single, “Flutuar”.

Durante esses minutos, em que a sala se iluminou de lanternas de telemóveis, Dino D’Santiago foi apenas mais um entre tantos a posicionar-se enquanto público e a registar o momento. Diz muito, claro, da sua natureza, postura e sentido de missão.

Embora o Theatro Circo tenha vastas filas de cadeiras, o público só permaneceu sentado durante as primeiras duas músicas. É algo habitual nos seus espetáculos quando acontecem em auditórios ou teatros, e Dino até foi incitando a que a plateia se levantasse, de forma gestual, durante “Raboita Sta. Catarina”. Relutantes, os bracarenses precisavam de um pedido mais direto do artista para fazerem aquilo que aparentemente todos esperavam. Bastaram meia dúzia de palavras para que um Theatro Circo inteiro se erguesse e começasse a balançar os corpos como a música de Dino D’Santiago pede.

Agora levantados, basta espreitar ao redor da sala para confirmar o quão transversal se tornou o autor de BADIU. Pessoas de todas as idades, géneros, tons de pele e sotaques dançavam e cantavam as músicas, ainda que de forma não tão efusiva como muitas vezes nos deparamos em Lisboa — a ambiência imponente do Theatro Circo também leva certamente a que haja alguma contenção natural.

Nascido e criado em Quarteira, com uma grande ligação ao Porto e sendo alguém que tem vindo a profetizar (e a personificar) uma “Nova Lisboa”, Dino D’Santiago é cada vez mais um fenómeno nacional estabelecido, fundado nos nichos mas agora ao dispor do grande público. A sua importantíssima mensagem de união e fraternidade é, obviamente, fulcral não só num concerto em Lisboa, na Margem Sul ou no Porto. Diríamos até que é mais essencial ainda fora dos grandes centros urbanos. Em Braga, obviamente, onde existe hoje a maior comunidade brasileira de Portugal — algo que Dino fez questão de frisar durante o concerto, apelando ao bom acolhimento dos imigrantes — as letras universais que apelam à mistura geraram ressonância.

Agarrando no funaná e no batuque de Cabo Verde e fundindo-os com roupagens eletrónicas vanguardistas, Dino D’Santiago é hoje mais pop do que alguma vez foi, mas isso não implicou fazer quaisquer cedências artísticas nem aproximar-se de qualquer padrão da indústria. BADIU (2021), o seu último disco, até tem um rasgo criativo acima da média e trata-se de um trabalho mais denso e exigente comparado com KRIOLA (2020) e Mundu Nôbu (2018). 

Embora seja um álbum mais obscuro — por refletir um momento psicológico mais difícil do próprio artista mas também por retratar a realidade do povo badiu — Dino D’Santiago mostra-se livre de sombras enquanto exorciza os seus demónios interiores com aquelas canções que evocam almas ancestrais e procuram uma certa paz — que se materializa no próprio concerto, naquele espírito de comunhão, onde todos, por mais diferentes que possam ser, dançam ao som do mesmo ritmo. Uma celebração desta primavera espiritual que dá pelo nome de Dino D’Santiago.


pub

Últimos da categoria: Reportagem

RBTV

Últimos artigos