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Ilustração: Riça
Publicado a: 22/07/2020

Do hip hop para qualquer lado: Crónicas de um HipHopcondríaco é da autoria de Manuel Rodrigues.

Crónicas de um HipHopcondríaco #50: o ponto final

Ilustração: Riça
Publicado a: 22/07/2020

E assim, ao quinquagésimo episódio, as minhas crónicas chegam ao fim. Iniciei esta minha aventura em Maio de 2018, depois de ter sentido a necessidade de partilhar algumas das histórias que tinha em mente, apesar de saber que precisava de uma abordagem diferente para as colocar por extenso. Não bastava espremer prosa como quem pega numa cesta de fruta madura para fazer sumo. Havia que dar-lhe um cunho pessoal, um ângulo diferente. Assim sendo, decidi utilizar o hip hop como mero ponto de partida — ou até mesmo de chegada — para várias ideias e temáticas, algumas delas repescadas aos turvos baús da memória, outras centradas em acontecimentos recentes, como concertos, lançamentos de álbuns ou até mesmo temas quentes da actualidade. Não fazia ideia de onde isto me levaria e, muito sinceramente, nunca pensei que o patamar da meia centena de crónicas fosse alguma vez alcançado. Comecei por publicar estes textos na minha página pessoal do Facebook, numa altura em que ainda estava em fase de desenvolvimento do conceito, e, qual não foi a minha surpresa quando, ao terceiro ou quarto episódio, recebo uma mensagem do mestre Rui Miguel Abreu a sugerir-me passar estas crónicas para as páginas digitais do Rimas e Batidas. Tal convite incutiu-me um enorme sentido de responsabilidade. Ganhei, pela primeira vez na vida, um espaço com a minha assinatura, onde me seria dada a liberdade de abordar qualquer tema a partir de qualquer ângulo. Tentei manter a regularidade, apesar de ter deixado algumas quartas-feiras em branco por razões de agenda profissional, mas procurei, sobretudo, que os temas aqui explorados fossem sempre bem apresentados e (se necessário) argumentados, até porque, sejamos francos, é a experiência do leitor que realmente interessa.

Escrevi sobre muita coisa ao longo destes dois anos. Dos discos que comprei nos meus verdes anos, quando ainda morava no Algarve, longe de Lisboa e dos cursos de som e de jornalismo musical que me levariam a moldar o que hoje faço a nível profissional, passando por alguns dos mais emblemáticos concertos que testemunhei, dos Carters a Drake, de Kendrick Lamar a Wu-Tang Clan, de N.E.R.D. a IAM, e terminando em alguns recortes daquilo que foi o meu curto percurso nos meandros da produção musical. Escrevi sobre doenças mentais, brutalidade policial, suicídio, racismo, apropriação cultural, indústria alimentar, a Guerra do Vietname, os ataques terroristas em Paris, a queda das Torres Gémeas, gentrificação, COVID-19, digging, Lusofonia, Ténis (o desporto que se joga com raquetes e não aquilo que se calça), fenómenos pop, encontros e desencontros com artistas, a morte de importantes nomes da cultura a nível internacional, a arte e os seus diferentes pontos de vista, o adeus a uma das maiores figuras do hip hop nacional, a bacoca exaltação do passado em detrimento do presente, e a importante necessidade de sabermos interpretar aquilo que lemos, optando sempre por uma análise horizontal do conteúdo ao invés do habitual consumo enviesado. Escrevi sobre o que aconteceu, o que podia ter acontecido e o que ainda está para acontecer. Opinei quando senti necessidade de opinar, critiquei quando senti necessidade de criticar, calei-me quando senti que devia deixar os excertos das músicas falarem por si ou as entrevistas resgatadas transmitirem as ideias necessárias. Cruzei presente com passado, recorri a analepses, embebi tudo em diversas figuras de estilo. Adorava a ideia de avançar ou recuar na cronologia e voltar ao princípio com uma conclusão que nem sempre ia ao encontro da introdução. Era a experiência do leitor que realmente interessava.

Este poderá não ser um adeus definitivo. Quem sabe se estas crónicas não regressam para uma segunda temporada, até porque tenho muita história para contar e novas abordagens em mente para exercitar. Alcançado este número redondo, quero, para já, fechar um ciclo. Tal como Stanley Kubrick, um dos meus realizadores de eleição, que tantas vezes menciono nos textos que vou assinando para o Rimas e Batidas e para a Ritmoterapia, também acho que a vida é cíclica e que, muitas vezes, o ponto de chegada é precisamente o ponto de partida para uma nova história, e assim consecutivamente. Aproveito para agradecer a todos aqueles que acompanham as Crónicas de um HipHopcondríaco desde o primeiro episódio, mas também àqueles que, de vez em quando, se cruzam com uma ou outra peça solta deste puzzle — qualquer pessoa que tenha passado os olhos pelas minhas frases e parágrafos merece, sem qualquer sombra de dúvida, uma nota de agradecimento. Muito obrigado à minha futura esposa, Carolina Caldeira, por me apoiar em todas as minhas ideias e projectos. E, por fim, o meu sincero agradecimento ao Rui Miguel Abreu pela confiança depositada e ao Alexandre Ribeiro por ser, pelas razões mais óbvias, o meu leitor mais assíduo.

Obrigado a todos. Espero que esta experiência de leitura tenha sido do vosso agrado.


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