Era digital, informação à velocidade da luz. Vídeos e músicas a soçobrar pelas plataformas virtuais. Novidades emaranhadas entre si, confusão sónica, sentidos desorientados. Quem nos guia? Por onde vamos? Para onde vamos?
7 Dias, 7 Vídeos é o resgate audiovisual semanal nos terrenos do hip hop e electrónica. Filtragem de qualidade, barreira contra a poeira que nos cega com tanto de novo, com tanto para espreitar e escutar.
[Jack Crack] “Alpha & Omega”
No circuito undrground do boom bap nacional, os DopeFinest, de Jack Crack e Dwó, são uma das duplas de maior culto e os seus talentos têm vindo a ser potenciados pela Godsize Records, que repescou os seus primeiros dois álbuns — Scopolamina (2017) e Caleidóscopio (2020) — e os trouxe para o domínio físico através de reedições em CD. Agora totalmente integrados nesta casa editorial, o plano é editar por lá o terceiro registo de originais, Samsara, cujo primeiro par de avanços já foi revelado. Em dois momentos distintos e com cada um dos artistas a mostrar-se a solo, este “Alpha & Omega” sobressai-se pela letalidade do veneno largado pela mandíbula de Jack Crack a cada dentada no microfone — Dwó assegurou o lado B do single com “Sanidade”.
[Indys Blu] “Saddest Song” @ A COLORS SHOW
É uma sensação boa quando vemos os nossos artistas emergentes favoritos a subir ao palco do A COLORS SHOW e a conseguir chegar a um maior número de pessoas graças a essa exposição. Mas nada bate aquelas borboletas que sentimos na barriga quando nos deparamos com uma voz totalmente desconhecida para nós e somos levados a entrar num novo rabbit hole discográfico à procura de novas pérolas para as nossas playlists. Neste “Saddest Song”, fomos apresentados a Indys Blu, que soa como um raro sample de uma balada jazz que ficou algures perdida no tempo e ainda aguarda ser descoberta para dar vida a uma daqueles beats de hip hop que perduram na memória.
[Femme Falafel] Dói Dói Proibido (Short Film)
A espera foi longa, mas o resultado final superou as expectativas. Femme Falafel vinha a dar-nos uma certa ânsia para escutar um possível disco seu desde que editou o primeiro single em 2022 e, na passada sexta-feira, deu-nos essa possibilidade através de Dói Dói Proibido, trabalho de estreia selado pela Revolve. Neste seu novo universo, a cantautora e pianista recorre à ironia e sarcasmo para nos oferecer as suas visões sobre o mundo à boleia de instrumentais assentes no jazz mas com influências que vão do hip hop à disco. Mais do que meramente musical, esse universo é conceptualmente forte para enriquecer toda uma narrativa visual em torno do projecto e a curta-metragem de acompanhamento junta mais doses de cor e humor à obra que deu a conhecer ao mundo Raquel Pimpão como artista em nome próprio — e de mão bem cheia.
[St. Panther] “The Deal”
A semana que nos afastou por completo de D’Angelo também foi aquela que nos aproximou um pouco mais de St. Panther. O malogrado cantor que ajudou a pavimentar os frutíferos caminhos da neo-soul morreu no passado dia 14 de Outubro aos 51 anos e, um par de dias depois, revelou-se como grande influência de St. Panther na segunda canção de antecipação ao seu próximo EP, Strange World, que chegará no início de Novembro e marcará um regresso em grande após uma pausa criativa da autora do muito interessante These Days (2020). Nada apagará a sensação de que D’Angelo partiu cedo demais, mas este retorno de uma das mais promissoras novas vozes da soul mostra-nos que o futuro do género está salvaguardado e que o legado do eterno crooner se vai manter intacto nas gerações vindouras.
[Joey Valence & Brae] “GIVE IT TO ME”
Joey Valence & Brae pegaram numa sonoridade do passado e traduziram-na na linguagem do presente para conquistar alguma reputação. Depois de verem o seu nome solidificado com o lançamento dos primeiros dois álbuns, o par fez mira ao futuro e atirou-se sem pudor a uma nova estética no mais recente HYPERYOUTH. Porém, a fórmula que os fez galgar terreno não foi esquecida por completo e este “GIVE IT TO ME” é um desses momentos de hip hop cru fundido com punk à la Beastie Boys que tantos ouvintes conquistaram no início do trajecto da dupla norte-americana.
[Apollo G] “Kai Labanta” feat. BigZ Patronato (prod. Zacky Man)
Há quem lance álbuns com pouco conteúdo e há outros, como Apollo G, que lançam uma quantidade de conteúdos tão generosa que mais parece que estão a editar grandes discos a prestações. Desde o EP Rotina em 2023, que o juntou a Mr. Marley, Apollo G já lançou um número impressionante de singles nestes últimos dois anos, o suficiente para preencher os alinhamentos de dois ou três LPs. Depois de nos falar de “Love”, “Dinheiro” ou “Conquistas” em faixas anteriores, a força interior e a auto-confiança dominam a mensagem que o rapper pretende passar neste seu novo “Kai Labanta”.
[Kokoroko] Ao Vivo @ Tiny Desk Concert
Se não marcaram presença na última edição do FMM Sines, podem muito bem ter perdido um dos melhores concertos dados em Portugal este ano. Foram os Kokoroko a banda que mais nos cativou ao longo dos quatro dias de reportagem para o Rimas e Batidas, bem na ressaca do lançamento do seu mais recente trabalho, Tuff Times Never Last, onde a crença de que o amor um dia há de vencer nos carrega as pilhas da alma através de um jazz orquestral repleto de boas vibrações. Agora que uma versão reduzida do seu espectáculo chega à Internet por intermédio do Tiny Desk Concert, não têm desculpas se voltarem a perder a oportunidade.