A 41ª edição do Festival Jazz em Agosto vai decorrer entre os dia 1 e 10 do dito mês na Fundação Calouste Gulbenkian. Até aqui nada de novo já que se mantêm os dias e o local onde há mais de quatro décadas tocam muitos dos nomes e formações mais fulgurantes dos campos da música livre e criativa em tons de jazz. A novidade reside sempre no efeito de surpresa dos músicos alinhados, nesse pisar de risco como identidade do festival. O ano transacto teve um programa marcante, a sublinhar a comemoração dos 40 anos de acção, em que se apontou obviamente ao futuro. Futuro esse que se revela bem mais perto agora.
O mote está dado quando no texto que acompanha a divulgação do programa deste ano se refere que “vivemos no deambular de um mundo novo, em que as incógnitas superam largamente as certezas”. E por isso, declara-se também, “a música continuará a ter um papel fundamental neste processo, tanto na
catarse como na redenção, será sempre um veículo de agregação e de resistência, de alternativa e de esperança, enquanto progride e cruza novos limites”.
Fazendo eco das palavras de quem pensa, dirige e organiza o Jazz em Agosto, este programa contém, de facto, matéria que pode sustentar catarse e redenção. O arranque, no dia 1, far-se-á ao som da tradição de vanguarda, claro está. Sobem ao palco do Anfiteatro ao Ar Livre os veteranos William Parker e Hamid Drake junto a Cooper-Moore como Heart Trio. Um coração ancestral, com a força de uns que há muito tempo batem forte e nunca na mesma tecla. Uma certa modernidade feita de sábios e ancestrais sons como os sopros vindos do ngoni e duduk, juntos ao xilofone e à harpa horizontal, num rumo de bateria e percussão.
Sábados e domingos mantêm as doses dupla de concertos em cada dia. Assim, o primeiro desses fins-de-semana, no dia 2, tem início com um concerto solo de Rafael Toral para o seu aclamado álbum Spectral Evolution, um dos discos mais marcantes do ano passado e o apogeu (até à data) da sua órbita espacial sonora. A noite será de Kris Davis Trio que, além da pianista conta com Robert Hurst no contrabaixo e Johnathan Blake na bateria. Concerto que deverá andar muito em torno de Run The Gauntlet, onde homenageia grandes pianistas do jazz como Carla Bley, Marilyn Crispell ou Sylvie Courvoisier, entre outras. Domingo, dia 3, começa com o gira-disquismo revolucionário de Mariam Rezaei, esse que reportámos em Outubro último no OUT.FEST’24, só que agora, no Jazz em Agosto, contará com dois convidados. O desfecho do primeiro domingo fica a cargo de Darius Jones, que regressa um ano depois desta feita para The Legend of e’Boi, voltando a fazer-se acompanhar por Gerald Cleaver na bateria e com a adição de Chris Lightcap no contrabaixo.
À segunda e terça voltam os dias das formações portuguesas. Haverá palco para a abstração livre de Luís Vicente Trio, com Gonçalo Almeida no contrabaixo e Pedro Melo Alves na bateria no dia 4, eles que assinaram um dos últimos capítulos da Clean Feed com Come Down Here. Depois, dia 5, seguem as composições do contrabaixista João Próspero, que em quarteto versa a obra de Murakami e traz consigo a palco Joaquim Festas (guitarra), Miguel Meirinhos (piano) e Gonçalo Ribeiro (bateria).
Ao trio MOPCUT, que junta a supra-vocalista Audrey Chen à desalinhada guitarra de Julien Desprez e aos diabólicos ritmos de Lukas König, somam-se no palco deste Jazz em Agosto a soberba mensageira Moor Mother e o MC Dälek, no que se antevê como um dos imperdíveis concertos do festival, dia 6. Uma brigada da vanguarda londrina chegará no dia 7 com X-Ray Hex Tet, que alia a veterania pianística de Pat Thomas a Edward George (voz), Seymour Wright (saxofone), Billy Steiger (violino), Paul Abbott (bateria e programções) e Crystabel Riley (bateria). Sexteto de uma música algures situada numa certa harmonia do caos.
O guitarrista Shane Parish estará de regresso e apresentar-se-á como nome charneira do último fim-de-semana do festival. Primeiro em Ahleuchatistas 3 (dia 8), um power trio jazzístico que conta ainda com Trevor Dunn no baixo e Danny Piechocki na bateria. Parish que actuará no dia seguinte a solo à guitarra acústica em torno do seu registo Repertoire, revisitando mestres como Alice Coltrane ou Aphex Twin. Também no dia 9 há Thumbscrew, considerado para a The Wire como um dos “essenciais grupos de jazz contemporâneo”, em que vamos escutar bem de perto o trio de ligação entre a guitarra de Mary Halvorson, o contrabaixo de Michael Formanek e a bateria e vibrafone de Tomas Fujiwara — imperdíveis.
Os concertos de encerramento do dia 10 ficarão reservados para dois momentos que se adivinham impactantes. Primeiro à tarde, em que se ouvirá o duo electracústico feito de uma inusitada instrumentação — cravo, piano e bateria —, aliando Elias Stemeseder a Christian Lillinger. Final em grande é o que se espera do septeto da marimbo-vibrafonista Patricia Brennan, que traz consigo os saxofones de Jon Irabagon e Mark Shim, a trompete de Adam O’Farrill, o contrabaixo de Kim Cass, e a bateria e percussão de Dan Weiss e Keisel Jimenez. A já habitual celebração com uma formação alargada no desfecho destas festividades no Anfiteatro ao Ar Livre.