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Publicado a: 28/08/2015

Slow J: “Não me sinto minimamente perto do sítio para onde vou”

Publicado a: 28/08/2015

[FOTOS] Bruno Martins

 

Lembro-me que bem que era domingo de manhã quando me deparei com um artigo escrito aqui no Rimas e Batidas pelo Francisco Noronha. Tinha sido publicado na sexta-feira à noite, falava do disco de um jovem músico de Setúbal que se estreava em edições, com muitos elogios e virtudes à mistura. Por ser domingo e estar a rodar ao ralenti, pensei em deixar a escuta para outra altura. Mas uma mensagem no telemóvel despertou-me para o universo da The Free Food Tape. “Grande disco do Slow J! Já ouviste?”, perguntou-me a namorada. Apressei-me em conferir o que se falava e a tirar a limpo o que se estava a dizer. E percebi que o Francisco tinha razão naquilo que tinha escrito.

Há uns meses tive a oportunidade de – a meus olhos – ver acontecer história. Fui até Telheiras, para uma espécie de festa de santos populares com curadoria da malta da ASTROrecords que tinha convidado Slow J para subir, pela primeira vez, a um palco – pelo menos com este projecto e de uma forma mais séria. Claro que o rapper levou àquele fim de tarde quente, num parque, as canções do primeiro EP para uma plateia que provou já ter alguma fidelidade às canções.

Quando acabou o concerto, pouco mais de meia hora depois, dei-lhe espaço para receber os comovidos abraços e fotografias para a história. João Baptista Coelho passava as mãos pelo cabelo enquanto fumava o cigarro da acalmia. Já estava. Cheguei-me perto dele e pedi-lhe para nos sentarmos um pouco à conversa.

Acabado de sair do seu primeiro concerto, e perante uma inevitável pergunta de “como é que te sentes”, João Baptista Coelho não usou o chavão “não tenho palavras” – o que me fez gostar ainda mais dele. Falou em adrenalina, rematando com: “acima de tudo estou contente e não sei que mais hei-de dizer. Foi vitória.” Foi sim senhor.

Nesta entrevista, nos bastidores do concerto que aconteceu no Jardim António de Sousa Franco, em Telheiras, João fala-nos das aventuras adolescentes na música pelo punk e pelo metal; da experiência em Londres onde estudou Engenharia de Som que lhe deu a bagagem para ser ele a mexer em todos os botões do seu EP. Slow J conta-nos o que é este “som do Sado”: como escreve, como compõe, as suas influências na música e o que está para vir. Até ver, e para já, a não perder o concerto de dia 5 de Setembro, no 1º Festival Rimas e Batidas.

 

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Conta-nos lá como foi a tua estreia em palco.

Neste momento estou com a total adrenalina. A maioria das coisas correu muito bem. Acima de tudo estou contente. Tinha lá o meu pessoal que puxou pelo outro pessoal. Foi vitória!

 

Esta foi a primeira vez que subiste ao palco?

Não foi. Eu toquei punk rock, metal, quando era puto, em bandas mais pequenas. Fiz algumas actuações no âmbito da igreja, onde participava muito, mas já lá vão esses tempos. Mas este é o meu primeiro projecto, em que eu produzi tudo, misturei tudo, escrevi e cantei.

 

A tua vida tem um percurso que passa por Setúbal, Alenquer, Carcavelos, Londres…

(risos) Ya, uma loucura! Eu mudei muito de casa, quase de dois em dois anos. Mas o sítio ao qual chamo casa é mesmo Setúbal. Neste momento moro em Cascais, até que a música me dê dinheiro para eu ter a minha casa.

 

E como é que nasce a vontade de fazer este primeiro EP, o The Free Food Tape? Como é que alguém que vem do punk e do metal, da igreja, se torna MC?

Na minha opinião, a energia que eu encontrava naquelas músicas é exactamente a mesma que encontro aqui. O hip hop é simplesmente mais uma maneira de fazer as coisas. Podemos fazer o que quisermos no hip hop. Eu também tenho a escola de hip hop, do old school, e conheço-o bem. Mas o meu EP é exemplo da mistura que estou à procura de fazer na música: tens o exemplo do tema “Pai Eu”, em que trago vibe do punk-rock para o refrão, em que misturo com o dubstep para encontrar hip hop. “O Cliente” tem uns tons mais escuros…

 

Com sopros e címbalos clássicos de jazz; tal como “Tinta da Raiz” só com contrabaixo, voz e estalar de dedos. Também trazes o jazz para a tua música?

Algum jazz, sim. Eu acredito que tudo o que fazemos é influenciado por alguém e acontece em colaboração com alguém. Esse beat, o “Tinta da Raiz”, foi feito em parceria com um amigo que é dançarino. É o beat que tem uma mais raiz africana – eu também sou metade angolano. Nesse dia estava a tentar fazer alguma coisa tipo DJ Mustard! E foi o meu take: o contrabaixo a dar o groove e o snap a segurar. Quando há uma tarola… a partir daí torna-se uma jam.

 


 


Estudaste engenharia de som em Londres. Achas que sendo hoje um engenheiro de som a tua música pode tornar-se mais matemática ou, por outro lado, vai dar-te apenas uma independência no estúdio?

Isso é interessante. Eu estou sempre num limbo, à procura de um limbo. A música é matemática muito avançada, a simetria entre todos os elementos. Mas, por outro lado, quando escrevo uma música como a “Cristalina” já não é nada pensado: é chegar a casa e sentir que preciso de escrever. No fim do dia, encontra-se sempre uma coesão entre a matemática e o instinto.

 

Para quem aparece de repente, com um EP, um ilustre desconhecido (como lhe chamou o Francisco Noronha), tens uma lírica extraordinária, com enormes recursos estilísticos combinados com um flow e noção de ritmo. De onde vem isto tudo?

Eu leio desde pequeno. Ficava à noite a ler e a minha mãe ia desligar-me a luz às três da manhã – e isto estava eu na quarta classe. Sabes que não vejo nada a minha música com recursos estilísticos: olho para aquilo que as palavras me fazem sentir quando as escrevo ou digo. E o que me fazem sentir quando consigo encadear as ideias umas a seguir às outras. Eu escrevo segundo essa dinâmica e não penso, minimamente, na Língua Portuguesa de um ponto de vista técnico, como me tentaram ensinar na escola – no tema “Cliente” falo um bocado sobre isso [“Bati na porta/Entrei na sala e ela disse: – ‘Tás atrasado/Toda mal disposta/- Pensas que assim vais a algum lado? ’tás muito enganado/O que te interessa não interessa, Não é suficiente. /Vê se aprendes tu não passas d’um cliente.”] E há tanto a descobrir… a Língua Portuguesa podia ter sido a disciplina mais divertida, mas para mim foi a mais difícil!

 


 


E o que vem aí, depois deste primeiro EP? O que estás a preparar?

Quanto mais os artistas aparecerem a lançar álbuns, mais se baixa o valor desse objecto. Eu explico: estou a fazer EPs para me preparar para o que quero fazer. Não me sinto minimamente perto do sítio para onde vou.

 

Mas já sabes para onde queres ir?

Tenho a minha visão. Estou a criá-la aos poucos. Durante este ano e o próximo vou fazendo mais um EP. E vou dinamizar este The Free Food Tape com mais vídeos para poder chegar às pessoas.

 

The Free Food Tape EP está disponível para download gratuito no site oficial de Slow J. Sigam as suas produções e rimas também no Facebook.

Leiam a crítica de Francisco Noronha a The Free Food Tape EP aqui.

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