O azar de uns é a sorte de outros e nesta Sexta-feira 13 (de Junho) são os apreciadores de música aqueles a quem a bonança resolveu bater à porta. Por entre festividades de Santos Populares, muitos discos resolveram dar à costa no dia de hoje para ajudar a desenjoar do pimpa através de uma vasta gama de sonoridades, do hip hop ao jazz, com inúmeras incursões laterais pelo meio. Fiquem a par dos 11 registos fonográficos destacados pela redacção do Rimas e Batidas nos parágrafos que se seguem.
Fora desta selecção mas a acusar também no radar da nossa publicação estão os trabalhos editados por Djodje (Choices), Luedji Luna (Antes Que a Terra Acabe), KayCyy (BEFORE I WAS BORN), Lil Tecca (DOPAMINE), WITCH (SOGOLO), Buscabulla (Se Amaba Así), King Gizzard & The Lizard Wizard (Phantom Island), Adrian Sherwood (The Grand Designer), EST Gee (My World), ONEFOUR (Look At Me Now), Skaiwater (pinkPrint 3), Terri Lyne Carrington & Christie Dashiell (We Insist 2025!), Annahstasia (Tether), Smiley (Don’t Box Me In), FearDorian (Out the Past With a Window), James Holden & Wacław Zimpel (The Universe Will Take Care Of You), Cosey Fanni Tutti (2t2), FaltyDL (Neurotica) e Lyra Pramuk (Hymnal).
[Tilt] MIASMA
“Sexta-feira 13” rima com Tilt. O rapper de Almada habituou-nos a um novo single sempre que se assinala esta passagem no calendário, mas desta vez foi mais generoso. O underground até se baba perante o aroma a MIASMA emanado pelo prato de seis ingredientes hoje servido pelo necromante da crew ORTEUM, do qual fazem parte os anteriormente revelados “Treze”, “Simples” e “Bem Dizido”. Com versos novos e antigos em igual medida, três foi a conta que este diabrete fez num EP que recorre a produções de Pedra, Il-Brutto, Chapz ou Amon. E se estes 18 minutos não forem suficientes para vos matar o tédio, comprem o DLC: a versão física deste projecto contempla mais um par de malhas e pode ser encomendada através do endereço [email protected].
[Leikeli47] Lei Keli ft. 47 / For Promotional Use Only
Lei Keli ft. 47 / For Promotional Use Only é um acto de libertação para Leikeli47. Depois de um percurso que a levou de grande promessa do underground a militante da esfera mainstream, a enigmática MC despe a máscara que lhe cobriu o rosto durante toda a carreira e abraça aquele que é o seu projecto mais ousado e conceptual até à data. Hip hop de todas as formas e feitios — das sonoridades raw às mais catchy, das rimas sombrias às que são polvilhadas com purpurinas — em 30 vibrantes minutos que se dividem em 11 temas.
[Slick Rick] VICTORY
É o fim do hiato de 26 anos do lendário contador de histórias do hip hop. Slick Rick é um dos pioneiros deste movimento urbano e estava afastado dos álbuns desde que, em 1999, lançou The Art Of Storytelling. A Mass Appeal, de Nas, acolhe o seu regresso neste VICTORY, que é também um filme de 30 minutos que está neste momento a correr alguns festivais antes da sua exibição mais massificada. O carismático e versátil Iris Elba conduziu a produção executiva do novo projecto do MC nascido no Reino Unido (mas que fez história na América), que foi gravado entre Inglaterra e França e conta ainda com features de Giggs e Nas.
[MALLINA] MENINA DA LÁGRIMA
No seu segundo EP, MALLINA entrega-nos uma obra visceral, em que a lágrima deixa de ser fraqueza para se tornar ritual de libertação. Se em ESPELHO havia uma pop experimental meio inocente, aqui a artista mergulha no âmago do seu interior e mistura o sagrado com o o profano através de uma sonoridade que desafia rótulos, com influências de fado, R&B, electrónica e música latina. As cinco faixas de MENINA DA LÁGRIMA formam um ciclo emocional onde a vulnerabilidade é assumida sem vergonha, ecoando o mistério do rosto pintado no famoso quadro “Menino da Lágrima”.
[Joe Armon-Jones] All The Quiet (Part II)
A ambição e reputação de Joe Armon-Jones — teclista cujas dedadas têm ficado impressas em discos de Moses Boyd, Nubya Garcia e, acima de tudo, dos seus Ezra Collective — levaram-no a esculpir este ano uma grande obra que se divide em duas partes. Após o primeiro capítulo em Março, All The Quiet (Part II) chegou hoje munido da mais contemporânea das sonoridades que o jazz pode adoptar, percorrendo trilhos de funk, dub, hip hop, soul e até electrónica. Yazmine Lacey, Greentea Peng e Wu-Lu estão entre os artistas que se juntam a este festim sonoro.
[AJ Tracey] Don’t Die Before You’re Dead
Numa afirmação de resiliência e autenticidade, AJ Tracey combina as várias sonoridades que definem o traço britânico do hip hop — como o grime e o drill — num novo disco hoje lançado pela Revenge Records. O título não engana: Don’t Die Before You’re Dead é sobre viver intensamente até ao derradeiro suspiro, um convite à ambição, persistência e auto-afirmação. Ao seu lado no decorrer deste alinhamento de 14 faixas podemos encontrar nomes grandes como os de Headie One, Jorja Smith, Nemzzz ou Aitch, bem como os emergentes Master Peace e Wax.
[Juicy J & Logic] Live And In Color
Mudança de papeis para Logic, que em Live And In Color surge sentado na cadeira de produtor executivo responsável por orquestrar a sonoridade que abraça uma nova série de rimas assinadas pelo veterano Juicy J. Num boom bap inspirado por gente como Madlib, J Dilla e The Alchemist, este trabalho nega o habitual registo festivo do histórico MC dos Three 6 Mafia, mergulhando em beats de contornos mais clássicos. É uma lufada de ar fresco na carreira de Juicy J, muito menos alinhada com uma estética mainstream e mais próxima daquilo que pode ser tido como uma obra purista de rap.
[Brandee Younger] Gadabout Season
No regresso ao catálogo da Impulse!, Brandee Younger faz ecoar a sua vulnerabilidade e descoberta pessoal num conjunto de 10 novas composições. Gadabout Season conta com a produção dos seus parceiros de longa data Rashaan Carter e Allan Mednard, foi gravado no apartamento da harpista no Harlem, Nova Iorque, e assenta numa fusão entre o jazz contemporâneo e o espiritual, bebendo também de outras fontes que tanto têm alimentado o género no presente, como o hip hop, o R&B ou o afrobeat. Na fica técnica do sucessor de Brand New Life (2023) destacam-se nomes como Shabaka, Joel Ross ou Makaya McCraven.
[Maiya Blaney] A Room With a Door That Closes
Apesar de estar em Nova Iorque, as influências que contaminam o core da música de Maiya Blaney vêm do lado de cá do Atlântico, e talvez tenha sido por isso que a britânica Lex Records não deixou escapar a oportunidade de selar o seu mais recente LP. A Room With a Door That Closes é um tratado sonoro muito assente nos grooves do drum & bass — do mais “líquido” ao mais raver —, mas não deixa de dar continuidade ao ecletismo que já tínhamos detectado no seu antecessor, 3 (2021), através de incursões por inúmeras outras coordenadas — do punk e do R&B à folk ou à electrónica mais experimental.
[Mary Halvorson] About Ghosts
Mary Halvorson expande o seu sexteto Amaryllis com a adição dos expressivos saxofones de Immanuel Wilkins e Brian Settles, criando uma sonoridade mais densa e rica em harmonias neste About Ghosts, que viu a luz do dia através da Nonesuch Records. Com oito composições originais, a guitarra cristalina e inventiva de Halvorson dialoga com uma fanfarra de metais, invocando um mundo de texturas eruditas e de improvisações tão abstractas quanto vibrantes. Com produção e mistura de John Dieterich, este trabalho representa uma nova fase na constante evolução da vanguardista guitarrista norte-americana, equilibrando o estranho e o belo, o composto e o espontâneo, ao mesmo tempo que a reafirma como uma das criadoras mais inovadoras do jazz contemporâneo.
[Theo Croker] Dream Manifest
Descrito como um “diário de sonhos” musical, o novo registo de Theo Croker leva-o a libertar-se de convenções e a explorar territórios que vão do jazz clássico dos anos 50 à soul contemporânea, passando por grooves hipnóticos e swings de afrobeat. Com colaborações sonantes e batidas que remetem a géneros como hip hop ou house, Dream Manifest equilibra leveza e densidade emocional, colocando Croker em confronto com o seu e ego e as suas angústias pessoais ao longo de uma viagem emocional rica, genuína e envolvente, para a qual contribuem também Kassa Overall, Gary Bartz ou Estelle.