pub

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 13/12/2019

Ferrandini acompanhou o produtor e trash CAN encarregou-se da primeira parte do evento.

Ondness na Galeria Zé dos Bois: o meio que soma, baralha e regurgita

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 13/12/2019

É comum dar-se a interacção entre diferentes artistas na Galeria Zé dos Bois, uma “incubadora” em que se provoca novos encontros e criam pontes prováveis e improváveis — e isto acontece através de junções em palco ou residências artísticas, por exemplo. Ontem foi a vez de Ondness, um dos nomes artísticos de Bruno Silva, apresentar a sua música ao lado de Gabriel Ferrandini. A colaboração entre estes dois músicos não é nova: o baterista tocou composições de Silva no seu álbum Volúpias.

Antes disso, trash CAN, produtor que já lançou pela emergente e dinâmica Rotten Fresh, iniciou a noite. Com um launchpad, um controlador e um computador, o artista disparou instrumentais experimentais, jogando com fade ins e fade outs na introdução e expulsão de temas do seu set. Variando entre grooves e ambientes, começou mais abrupto e glitchy e, entrebeats desfragmentados, passou por momentos mais melódicos, sem nunca se afastar do experimentalismo e design sonoro menos convencional, recorrendo regularmente a batidas mais garage e a samples, ambientes e arpejos metálicos, muitas vezes com instrumentais possantes, embora não tenha hesitado em trazer momentos com batidas mais próximas de IDM e, até, downtempo. Apesar de, a certo momento, se ter debatido com alguns problemas técnicos, a função de CAN foi cumprida: “abrir” a cabeça dos que marcaram a presença na ZDB.

Após uma pequena pausa, a ambiência criada entre os samples de Bruno e os pratos de Ferrandini chamou as pessoas de volta à sala. Quando todos tinham entrado, já se ouviam graves fisicamente atordoantes, num trabalho espacial estéreo interessante que levou gradualmente a uma harmonia ambiente. Tudo isto dando permissão ao baterista para adicionar elementos acústicos, a submeter os pratos e timbalões a um jogo tímbrico muito bem conseguido. A este factor adicionou-se a perfeitamente equilibrada mistura de som entre Ondness e Ferrandini — e a percussão de samples e de pratos criou tanto tons mais oníricos e contemplativos como ritmos e fragmentos cortantes. O baterista jogou com os pratos e a vibração e acústica dos mesmos, aproximando-os ou afastando-os dos microfones, tudo com a mesma fluidez com que o vemos num qualquer trio de jazz.

Depois da saída de cena de Ferrandini ainda na primeira metade do concerto, o produtor demonstrou o que conseguia fazer/criar com um computador, uma bateria, uns microfones e um vídeo. Nada mais. Acompanhado por projecções, entre o surrealismo e o abstracto visual, Bruno fez o resto do set sozinho, atirando sons de instrumentos processados, percussão ou sax, maioritariamente, mas procurou sempre criar uma narrativa sem princípio, meio e fim, na qual os instrumentos são apenas meras ferramentas para um objectivo sonoro maior, idealístico e ponderado.

Surrealista e abstracto: o mesmo se pode dizer da sua música, no final de contas. Tanto procura batidas, grooves e misturas bizarras de músicas de dança numa espécie de busca pela rave do futuro entre os meios urbanos e esotéricos, como experimenta desenhar ambientes obscuros, oníricos ou mesmo alucinantes, sem um qualquer lugar óbvio. E a vertente visual veio apenas solidificar estas ideias.

O desfecho deixou água na boca dos presentes. Logo de manhã, Bruno Silva demonstrou a sua satisfação no Facebook, referindo que ficou tão contente com o gig que talvez nem precise de tocar mais ao vivo. Não podíamos discordar mais: é necessário que o autor de Meio Que Sumiu continue bem presente, seja com que “cara” for.


pub

Últimos da categoria: Reportagem

RBTV

Últimos artigos