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Fotografia: Gonçalo Afonso
Publicado a: 07/05/2021

De fazer cair o queixo.

O encanto pop da “Cleopatra” de YANAGUI, LEFT. & Extrazen

Fotografia: Gonçalo Afonso
Publicado a: 07/05/2021

A música pop portuguesa precisava deste trio? Certamente que sim. Em “Cleopatra”, YANAGUI desenhou ao lado de LEFT. e Extrazen uma das canções com mais valor de replay da primeira metade de 2021 e colocou o seu álbum de estreia na lista “obrigatório ouvir quando sair”.

Envolvidos em melodias aquosas, esta tripla (que recorre ainda à magia de Charlie Beats na mistura e masterização) atira promessas de paixão às suas Cleópatras (que neste caso são interpretadas por Cacau e Annie), remetendo-nos para o imaginário lírico criado por Frank Ocean para “Pyramids” — com direito a citação directa dessa mesma música por Francisco Andrade na sua contribuição — ou para a produção de “BROKEN GIRLS” de Saba. Em suma, o tema parece reunir alguns dos condimentos que tornam tão apetitoso este tipo de “produto” r&b/rap americano — e transportá-lo para o universo português (mesmo que seja cantado em inglês) não se rejeita.

O nome YANAGUI pode ter entrada na nossa “dieta” com o EP Underground Nature em 2020, mas Gui Salgueiro já anda cá há muito tempo, desdobrando-se como músico a quem meio mundo recorre quando é preciso um teclista com certificado de excelência. E não se fica por aí: é, por exemplo, o director musical de Nenny, a figura que dá cor aos temas da prodigiosa artista de Vialonga no formato live.

O prometido primeiro longa-duração é, também, prenúncio de criação de uma nova editora, a RnC Records, que irá editar não só o seu disco como também o primeiro registo mais longo de um outro projecto em que está envolvido, a banda Pimenta Caseira.

Trocámos e-mails com os três protagonistas desta empreitada que envolveu ainda o realizador Rui dos Anjos, a agência One House Only ou o director de fotografia André Pêga. E sim, o name dropping feito até aqui é totalmente justificado.



Para este primeiro single do teu álbum de estreia, o que é que te levou a trabalhar com o LEFT. e Extrazen? Imagino que já fosses fã das coisas deles, claro, mas o que é que te puxou para estes dois artistas em específico? 

[YANAGUI] A minha relação com o LEFT. já vem de algum tempo, fiquei super curioso com a música “Indigo” e sabia que ele trabalhava na Great Dane, quis-lhe mostrar alguns beats meus e a conexão foi instantânea. Começámos logo a trabalhar em várias coisas juntos e esta foi uma delas. Desde aí que ficámos bons amigos e adoramos trabalhar juntos. O Extrazen foi-me apresentado pelo LEFT., que sugeriu desde logo que ele devia entrar no tema connosco. Fiquei surpreendido com a voz dele e com a música “With You“, que nem acreditava que era produção nacional. Acabou por calhar bem trabalhar com eles, tornaram-se grandes amigos meus e tem sido dos melhores projectos em que já estive envolvido. Cada um deles trouxe malta que ajudou imenso a que esta música visse a luz do dia.

Não sei se tinhas referências na cabeça quando construíste esta música, mas fez-me lembrar coisas mais modernas como os The Internet, Saba, Duckwrth ou até o Goldlink, um tipo de sonoridade que ainda não invadiu muito a cena portuguesa. Para onde é que estavas a apontar quando criaste este instrumental?

[YANAGUI] Criei este instrumental na quarentena, que me deu para fazer muita coisa, incluindo acabar o meu EP Underground Nature. Não pensei necessariamente em ninguém, mas percebi que o LEFT. era a pessoa certa para entrar comigo nesta aventura desde o início. Todas as influências que se poderá ouvir nesta faixa serão completamente inconscientes. Artistas que passam por nós em playlists e acabamos por fazer save na faixa ou álbum. Eu adoro The Internet e Goldlink, é uma pena que não haja mais projectos em Portugal a tender mais para esse lado.

O videoclipe parece um longo anúncio da Levi’s (e digo isto num bom sentido). Qual foi a tua participação na criação da narrativa do vídeo?

[YANAGUI] A própria Levi’s foi definitivamente uma grande ajuda neste processo todo, por isso é normal que se pareça um grande anúncio, cheio de cor e um sentido estético a tender mais para esse lado. Sendo que tenho de dar mais mérito nesse sentido ao realizador Rui dos Anjos (que já tinha trabalhado com o Extrazen em “With You”) e toda a equipa de filmagem e produção. Aliás, acho que toda a gente teve envolvida nesse processo narrativo e visual, desde nós os três, à One House Only (Gonçalo Afonso e Pedro Dórdio), à parte do styling (Cassiano Borges e Carlota Santos). Toda a gente teve um papel importantíssimo para que o videoclipe tivesse essa imagem única. 

Já fizeste parte de algumas bandas, mas mais recentemente tens partilhado palco com a Nenny. Como é que tem sido a experiência? Tocar as versões com banda das músicas dela tiveram alguma influência no tipo de som que estás a criar agora em nome próprio?

[YANAGUI] A Nenny é dos maiores talentos que vi nos últimos tempos, acho que ninguém consegue negar isso. Desde o início que fiquei super fã e que quis logo trabalhar com ela. Por sorte, o Charlie Beats já me conhecia e chamou-me para ser o director musical dela. Acrescentando o facto de a banda toda ser malta minha amiga, com qual eu já toco há muitos anos, ajuda a que o processo seja ainda mais recompensador. Ela influencia-me mais como modo de trabalho e de vida, do que propriamente a parte sonora e estética. No entanto, quem misturou e masterizou a “Cleopatra” foi o próprio Charlie Beats, por isso sem ela provavelmente essa parte não teria acontecido.

O que é que podes revelar mais sobre o teu primeiro longa-duração?

[YANAGUI] Por enquanto, muito pouco consigo revelar, porque ainda está a ser um processo criativo em construção. Gostava de lançar no final do ano e vai ser lançado pela RnC Records, nova editora que criei em conjunto com uma das minhas bandas, os Pimenta Caseira — vamos lançar também este ano o nosso primeiro álbum de originais. Vai ser um trabalho diferente do meu EP, não desvirtuando o meu som, mas não tendo só faixas instrumentais como foi o Underground Nature. Esta vai ser a primeira amostra e ao longo do ano, mais virão com outras pessoas. 

Ouvindo o que lançaste para trás, Extrazen, esta é capaz de ser a vez em que surges mais confiante e in your face. Isto é um lado teu que andava à espera do beat ideal?

[Extrazen] Acho que é apenas um lado meu que ainda não tinha sido demonstrado com tanta convicção nas outras faixas que lancei. Na realidade sinto que, à medida que o tempo passa, consigo ser mais sincero e directo na minha música. Mais eu. Diria que passa muito por um crescimento a esse nível, o não ter receio nem medo de tentar um approach diferente em qualquer registo. Este lado define muito a minha pessoa no geral e sinto-me extremamente à vontade ao expressá-lo musicalmente. 

O Yanagui e o LEFT. são músicos com mais currículo do que tu, mas, como já reforçámos na pergunta anterior, surgiste muito seguro em “Cleopatra”. Como é que foi receber este convite para ti? Queres fazer mais coisas com ambos?

[Extrazen] Já tinha falado com o LEFT. algumas vezes e tínhamos mostrado vontade mútua de colaborar de alguma maneira, portanto, quando ele me convidou para entrar na faixa, achei que fazia todo o sentido. Não conhecia o Gui pessoalmente nessa altura, mas mal começámos a falar e a trocar ideias demo-nos todos super bem e funcionou tudo perfeitamente. Sinceramente, tento não me intimidar muito com o “currículo”. Claro que sinto uma pressão saudável para corresponder, mas o meu foco passa apenas por transmitir a visão que tenho da faixa para a realidade e, sem qualquer limitação criativa, tentar criar algo único, onde me consigo rever. Sinto que sei o meu valor e o valor da minha música, e digo isto sem qualquer sentimento de arrogância. Acho que o projeto correu extremamente bem devido também a uma junção de tudo isso — uma partilha de ideias, sem qualquer tipo de receios, por várias pessoas talentosas nas mais diversas áreas. Quanto a mais faixas entre nós, estou certo de que vão surgir mais cedo ou mais tarde devido a toda a amizade e química que criamos durante este processo. Até lá, continuarei a criar e a tentar evoluir no que conseguir.

Este é, e diz-me se estiver enganados, o teu registo em que encaras o teu lado mais rapper, principalmente na maneira como entras em “Cleopatra”. O instrumental puxou-te para isso ou é um estilo de abordagem que andas a trabalhar mais?

[LEFT.] Sim, mais rapper do que isto só com Suissinho [risos]. O flow surgiu naturalmente logo que ouvi o beat do Gui, fez-me sentido. Mas sim, de facto tem sido uma abordagem recorrente, brincar mais com métricas rápidas e complexas, reagir mais ao groove. É algo que vai ser ainda mais evidente com projectos vindouros. Acho que nunca vou ser rapper em maiúsculas, mas gosto de imaginar que tenho um mini-rapper dentro de mim.

Tu, o Yanagui e o Extrazen demonstram aqui um grande potencial para formar uma boyband a la BROCKHAMPTON. A ideia de um projecto de grupo seria algo que te interessaria?

[LEFT.] A nossa ideia com o vídeo era mesmo essa, passar a vibe de boyband dos 90s com extra topping de frescura. Estivemos focados até agora na nossa “Cleopatra”, logo não se falou muito sobre futuras collabs a três. Ainda assim tenho a certeza que levo o YANAGUI e o Extrazen para a vida, profissionalmente e amigavelmente. É daquelas coisas automáticas: quando ouvi a música dos dois, sabia que estávamos no mesmo comprimento de onda e que tinha que acontecer. Conhecê-los e trabalhar com eles só confirmou a sinestesia. Há muito talento fresco e potencial colaborativo por Portugal fora, só faltam as pontes e iniciativa.


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