O mundo sofreu hoje um grande abalo com a notícia da morte de D’Angelo. Segundo o que tem sido veiculado por alguns canais de media e personalidades da esfera musical, a lendária voz da neo-soul foi vítima de um cancro no pâncreas.
D’Angelo, cujo nome verdadeiro era Michael Eugene Archer, foi um cantor, compositor e multi-instrumentista norte-americano que esteve na vanguarda da reforma estética da soul, tornando-se numa figura central no movimento neo-soul que começou a brotar entre as décadas de 80 e 90, tendo como outros pioneiros Erykah Badu ou Lauryn Hill. Nascido a 11 de Fevereiro de 1974, em Richmond, Virgínia, a sua carreira foi marcada por picos de enorme sucesso criativo, mas também por longos períodos de afastamento dos holofotes e por problemas de alcoolismo.
O início do seu trajecto discográfico deu-se com estrondo em 1995 com o álbum de estreia Brown Sugar, apoiado naqueles que foram os seus dois maiores singles de sempre, “Lady” e “Brown Sugar”, tendo alcançado o estatuto de platina nos EUA em apenas um ano. O seu segundo trabalho, Voodoo (2000), foi aguardado com grande expectativa e é hoje considerado por muitos a sua obra-prima. Esse segundo registo entrou directamente para o primeiro lugar da tabela de vendas Billboard 200 e valeu-lhe os Grammys de Melhor Álbum de R&B e de Melhor Performance R&B Masculina (pela prestação na faixa “Untitled (How Does It Feel)”). Foi precisamente o principal single desse trabalho e o respectivo videoclipe que projectaram D’Angelo como um sex symbol, papel no qual não se revia e que lhe gerou até um profundo mal-estar, tendo contribuído para o hiato de mais de uma década que se seguiu.
D’Angelo só regressaria ao activo em 2014 com o seu terceiro álbum, Black Messiah, mais um clássico instantâneo e desta vez creditado a D’Angelo and The Vanguard. Novamente aclamado pela crítica e marca de um regresso triunfante, esse longa-duração solidificou o seu legado como um artista visionário que moldou o curso da música soul contemporânea, misturando a delicadeza poética envolta na sua habitual voz sedosa com arranjos musicais arrojados capazes de impressionar qualquer ouvinte. Em Black Messiah, o crooner mostrou-se mais mutante do que nunca, cobrindo terrenos que iam desde o jazz ao flamenco, acompanhado por um generoso número de músicos de primeira leva — Questlove, Chris Dave, Pino Palladino, Roy Hargrove ou Q-Tip são alguns dos nomes que cintilam por entre a extensa e luxuosa ficha técnica do LP.
Desde Black Messiah, cujo décimo aniversário foi assinalado por cá com uma crítica de Rui Miguel Abreu, D’Angelo não voltou a oferecer ao público mais nenhuma obra e apenas se voltou a deixar escutar por um par de vezes — “Unshaken” foi a derradeira canção que editou em nome próprio em 2019, o mesmo ano em que também emprestou a sua voz a um single de Rapsody, “Ibtihaj”.