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Fotografia: Theo Lowenstein
Publicado a: 29/10/2019

Este ano, o trio inglês editou o seu segundo álbum pela Mr. Bongo.

MAEAR dos Jungle Brown: “Full Circle é um espelho daquilo que nos interessa agora”

Fotografia: Theo Lowenstein
Publicado a: 29/10/2019

Se há por aí listas sobre bandas que merecem mais reconhecimento popular, os Jungle Brown deveriam constar nelas, certamente. O trio inglês composto por Ric Flo, Tony Bones e MAEAR tem uma sonoridade mais virada para o classicismo soul do boom bap que reconforta, e no seu último disco, o primeiro com o selo da Mr. Bongo, isso transparece, mesmo que as implicações de se ser britânico em 2019 acabem por se infiltrar de forma subtil.

O Rimas e Batidas falou com MAEAR sobre a absorção dos sons de Londres, a vantagem de ter uma editora, as aspirações mundiais do grupo e Full Circle.


 

Flight 314 foi muito bem recebido pela crítica. Como está o Full Circle neste capítulo?

Sinto que tem sido bastante sólido o feedback que temos recebido. É tudo óptimo e muito positivo. Diria que a resposta tem sido melhor do que a que tivemos ao Flight 314, que também foi óptima. Acho que mantivemos isso, mas agora a um nível mundial. Tivemos grande apoio das plataformas e distribuidoras, imprensa e rádio. Mais do que da última vez. Para nós desta vez foi maior e melhor.

Achas que isso tem a ver com o facto de terem lançado o álbum através de uma editora?

Acho que isso ajudou em alguns elementos. Sobretudo no que toca à rádio. O que aprendi é que a rádio tem uma certa obrigação para com as editoras, sobretudo as independentes. Porque são elas que bombeiam dinheiro na indústria. Por isso, quando tens um bom produto e está associado a uma editora, existe uma inclinação para que o apoiem. Isto em oposição ao facto de ser um bom trabalho, mas que não está ligado a nada. E depois há o perfil da editora, a Mr. Bongo é grande.

Isto é algo que queria perguntar. A Mr. Bongo especializa-se em reeditar álbuns passados. Como é que vocês acabam a editar um trabalho novo pela editora?

Isso não é bem assim. Já tínhamos editado o Full Circle no passado, uns meses antes de eles o assinarem. Disseram-nos, “nós conseguimos fazer a distribuição melhor e maior, vamos tirar esta parte das vossas mãos e ajudar-vos”.

Fala-me mais disto. Já tinham lançado o álbum antes?

Sim, lançámo-lo uns meses antes de o assinarem. Nós lançámos o álbum em Março e eles assinaram em Setembro. A editora tinha-nos convidado para um espectáculo, em Brighton num festival, por isso já sabiam da nossa existência. Nós partimos tudo naquele concerto, arrasámos mesmo e logo no dia tivemos duas editoras a olhar para nós. A Bongo foi quem se chegou à frente, uns meses mais tarde. Disseram que era bom e que queria entrar. O que fizemos foi voltar ao estúdio e mudar umas coisas, fazer uns ajustes. Depois voltámos a lançar o álbum.

E esses ajustes. Foram feitos sob a orientação da editora?

Não. Foi mesmo só a nossa vontade.

Full Circle, no que toca à música, parece contrastar com o vosso trabalho anterior. O Flight 314 era mais clássico, mais boom bap, agora têm um pouco de trap, jazz, house, boom bap também – o vosso som mudou. Porquê?

Somos inspirados por muita música. Não dissemos que tínhamos de mudar o nosso som para este álbum, foi mais um espelho daquilo que nos interessa agora.

Foi um processo natural então.

Bastante, sim.

O Reino Unido está a passar por um período de mudanças políticas, e o panorama musical também tem assistido ao surgimento e ressurgimento de movimentos. Tens o grime, o drill e o jazz em destaque, por exemplo. Onde é que vocês se encaixam no panorama inglês?

Estamos no meio. Nós fazemos a nossa própria cena, comparando com os outros. Muita gente encaixa muito bem numa só categoria, mas nós somos mais mixed race. Temos um som sólido, mas, da minha perspectiva, tens artistas à direita e à esquerda. Um artista pode estar mais do lado popular, mas sem fazer música assumidamente comercial, mas que está na moda como o drill ou grime – que não são géneros assumidamente comerciais, mas que se estão a sair muito bem. Depois tens a esquerda e o centro, que são coisas cada vez mais alternativas. Eu acho que estamos no meio, fazemos a nossa cena independentemente do que está a bater, e não acho que estejamos mais para a direita ou para a esquerda. Acho que fazemos a nossa própria cena e que quem faz coisas parecidas connosco tende a estar mais à esquerda ou no centro, como o Loyle Carner. Little Simz, também. Acho que estes são alguns artistas que circulam no nosso espectro.


 

Isso foi uma preocupação vossa, ter músicas suficiente comerciais para a rádio?

Não diria que pensámos nisso estrategicamente. Mas reconhecíamos a vibe das músicas e sabíamos onde queríamos estar. Não nos interessou muito agradar a ninguém sem ser a nós mesmos. Foi mais sobre criar de um ponto- de-vista que nos apaixonasse.

Falámos sobre a sonoridade, agora viramos um pouco para as letras. Como é que vocês funcionam aqui?

Então, o Bones está obviamente a produzir e eu escrevo todas as minhas rimas e o Ric Flo as dele, mas às vezes posso ter uma mãozinha nas dele. Mas se ele está a cantar no hook, ele escreveu. Os features normalmente eu dou um toque também.

E quanto ao conteúdo. Sobre o que é este álbum para vocês?

Chamámos-lhe Full Circle porque a ideia é que agora vemos claramente. Vemos à direita e à esquerda, acima e abaixo, vemos 360 graus à nossa volta. É sobre sabermos onde as coisas encaixam na sociedade e onde encaixamos nós espiritualmente no mundo. “Time Ticks”, por exemplo, com o Bones no hook, é uma maneira de encapsular a ideia da luta diária das nove às cinco que as pessoas não gostam e do que é estar nesse lugar e num espaço onde não consegues focar-te na tua paixão nem nos teus sonhos porque estás ocupado a sobreviver, e depois começas a ficar deprimido. Essa canção foi sobre capturar essa realidade onde eu acho que muitas pessoas se encontram, mas em dar-lhe uma volta para que ouças e sintas que ainda brilhas, e ainda és importante. Muita da mensagem é baseada em self-power e self-improvement, e depois temos uns laivos de outras temáticas, sem ser nada demasiado profundo. “You and I” é mais divertida, a mostrar situações engraçadas. Às vezes damos-te algo embrulhado em enpowerment, mas acho que direcção geral é que há sempre um horizonte promissor no final do dia, um espelho do nosso ponto-de-vista como seres humanos.

“We On” tem a participação da incrível Sampa The Great. Como é que chegaram à Sampa e fizeram acontecer esta música?

Isso teve de ser a editora. Eles disseram, ”o que acham da Sampa The Great?”. Introduziram, pelo menos a mim, à música dela, foi logo depois do “Energy” sair. Nós dissemos logo que ela era incrível, adoramo-la. Foi uma jogada incrível, ela é demais e, para além disso, apanhámo-la logo antes de explodir.

Consideram-se uma banda que consegue ganhar uma outra dimensão ao vivo?

O espectáculo é, sem dúvida, um dos nossos pontos fortes. A editora, quando quis trabalhar connosco, já nos conhecia, mas foi o espectáculo que os convenceu.

Vocês já fizeram alguns bons concertos, em excelentes festivais, e já partilharam o palco com outros nomes, mas tem sido tudo praticamente no Reino Unido. Acham que estão prontos para entrarem no circuito europeu ou talvez até no americano?

Bem, já fizemos um concerto em França, no festival Antipode [MJC], em Rennes. Foi o último espectáculo que o Prodigy, dos Mobb Deep, fez antes de morrer. Estivemos no palco mesmo antes dele, foi há coisa de dois anos.

Estamos prontos para tudo, para dizer a verdade. Estamos a rejeitar espectáculos, o que nunca fizemos e temos uma audiência global. Estamos a chegar ao próximo nível, onde deixamos uma marca a nível global, e estamos prontos para ir tocar a qualquer lado.

Já pararam para pensar no que este álbum fez por vocês? Acham que o Full Circle vos trouxe mais fãs?

Decididamente. E é tudo porque mais pessoas ouviram o álbum. Voltamos ao assunto das editoras. É tudo sobre distribuição e escala. Muitos dos artistas no nosso patamar antes da Mr. Bongo estão lá por uma mera questão de alcance. Não é sobre a qualidade da música, mas é sobre a quantidade de pessoas que te ouvem e como distribuis a tua música. Ter a Mr. Bongo a apoiar-nos e a distribuir para mais pessoas ajuda imenso. Depois de as pessoas ouvirem, gostam e ficam. Ajudou-nos a ter um perfil mais amplo e a expor a nossa música [a mais gente].

Vão continuar a trabalhar com a Mr. Bongo no futuro?

Vamos só ver como as coisas se desenvolvem. Vamos começar uma tour. Aliás já começou em Norwich, mas a sério começa agora. Vamos ter uma digressão pelo Reino Unido e depois logo se vê. Estamos preparados para tudo.


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