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Fotografia: João Duarte
Publicado a: 16/05/2023

Do balcão à plateia.

Luke Stewart’s Silt Trio no Amadora Jazz’23: Bogotá forever!

Fotografia: João Duarte
Publicado a: 16/05/2023

Robert Venturi e a recordação de um livro seminal – Learning from Las Vegas. Os néones da cidade, os exemplos de arquitectura “não esclarecida” que tanto irritavam e irritam a crítica ou de quem se dela julga apoderar – os críticos. A cidade do centro, do gosto, do esclarecimento burguês, da elegância e das estantes ao tecto, em contraponto com a boçalidade, o devaneio, a futilidade. O carro não segue necessariamente, naquele dia, o percurso pela ordem que se apresenta, mas aconselha-se linearidade desdobrável – percorrer a estrada de Benfica, do centro para a periferia, ah – sempre a contradição, olhar à esquerda. Primeira bandeira no mapa – Balalaika, confeitaria, como se impõe. Que néon! Com o desenho do instrumento e tudo. Meia dúzia de metros e o Califa, o clássico burguês de prato confecionado e pastelaria fina. Não há néon significativo. Passar a linha – Amadora. Babilónia – quem não o conhece ou ao menos ouviu falar dele? Por fim, numa aproximação sorrateira, como convém quando se vai a um festival de jazz, Bogotá. Prelúdio perfeito – Bogotá & Amadora.

O bulício de quem acaba de ver o concerto de John Scofield e se prepara para assistir a Luke Stewart e o seu Silt Trio no âmbito da mais recente edição do Amadora Jazz. Como funciona tão bem dois concertos por noite. O intervalar ganha todo um outro significado. Maior ainda num corredor longo de longo e um balcão que o acompanha em todo o comprimento. As cervejas rolam, os pregos devoram-se. Há uma comunidade local que bem conhece Bogotá e outra nova que se junta entre músicos e editores que, movidos por uma leveza suprema, se deslocam para a sala dos Recreios da Amadora. Nome encantatório no tempo e nos actos desse tempo com Luke Stewart (contrabaixo), Warren Crudup III (bateria) e Brian Settles (saxofone tenor) a darem-nos recreio. Se há marca distintiva neste trio é precisamente o prazer com que tocam. Divertem-se. Um piscar de olho a Las Vegas de Venturi? Duvidamos. A cada nota que se solta há uma resposta certeira. Luke ocupa o palco, abraça-o para sermos mais exactos. A estatura do músico ajuda, mas é de quem sabe que o protagonismo é negação do ego. Entender que qualquer formação nas suas diferentes nomenclaturas – trio, quarteto ou outro é espaço comum. Abertura para ouvir é nesga para pequeno despique. Solos, interpelações, solos, fraseado escorreito. É bom de se ouvir. O jazz que nunca deixou de ser jazz, mas que se transforma. O jazz é música de hoje. É música da partilha, da não hierarquia. O jazz é nosso. Luke relembra-o em cada concerto – aqui, na Trafaria, na Gulbenkian, na ZDB. Um corta fronteiras com tesoura grande. 

Uma noite na Amadora. Periferia somente como categorização teórica. Comunidade(s) que resiste(m). Vivem.


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