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Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 18/07/2025

Agora em vinil.

LANA GASPARØTTI: “Agora quero passar mais tempo no estúdio a explorar produção e sound design

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 18/07/2025

Em 2024, LANA GASPARØTTI estreou-se a solo com Dimensions, um longa-duração em que as convenções do jazz são deixadas para trás. Sem limites de velocidade, de harmonia ou de textura, a artista luso-croata apresentou-nos uma sonoridade única — quase de outro planeta — onde a memória se cruza com o fascínio pelo digital e pela eletrónica.

Eleito um dos melhores discos nacionais do ano pelo Rimas e Batidas, Dimensions chega agora em formato vinil pela Now Jazz Agora com duas faixas bónus: “Purple Spiders” e “Goji Remix”. À boleia deste lançamento, o Rimas e Batidas sentou-se com LANA GASPARØTTI para uma conversa sobre esta edição especial e o que reserva o seu futuro artístico.



Qual é a tua relação com os discos de vinil?

Não tenho uma relação com discos de vinil. A minha mãe tinha alguns discos que trouxe da Croácia, de quando era mais nova, mas não tenho um gira-discos para os ouvir. Pelos menos para já. Tenho sim uma relação com os CDs. Ouço-os muito no meu carrinho de 1999. Costumava fazer as minhas compilações. Os meus CDs não estão dentro das caixas. Estão numa bolsa porta CDs. 

No entanto, agora com o lançamento do teu disco Dimensions em formato de vinil, com certeza que te aproximaste mais do objeto. Estiveste envolvida na produção do vinil? 

Estive e não estive. Estive durante o processo de criação do disco, mas depois o trabalho de masterização do digital para o formato de vinil ficou para o meu colega Hugo Santos. Ou seja, para mim, o processo não foi assim tão diferente. Em relação ao meu disco de vinil, temos uma capa diferente feita pelo designer e ilustrador Carlos Quitério, que trabalha diretamente com a editora Now Jazz Agora. O Carlos pegou na capa do Dimensions e adaptou-a através de uma ilustração para seguir a linha estética dos restantes discos da editora.

O disco em vinil tem a exclusividade de ter duas bonus track. Consegues-me falar um pouco delas? 

Uma é “Purple Spiders” e a outra é um remix da “Goji”. A “Purple Spiders” era para fazer parte do disco inicialmente, só que surgiu numa altura em que as restantes canções do álbum já estavam na fase de mistura e masterização. Então, já não fazia sentido e não havia tempo para esperar mais um ou dois meses para a incluir. Acabei por a deixar de lado, mas integrei-a nos meus concertos. E depois o Rui Miguel Abreu [responsável da editora Now Jazz Agora e diretor do Rimas e Batidas] quando me convidou para a editora e fazer a edição em vinil, desafiou-me para acrescentar umas bonus tracks. Foi a oportunidade certa para inserir a “Purple Spiders”, no entanto, ao acrescentar só uma bonus track o disco ficaria desequilibrado — idealmente o lado A e o lado B devem ter 20 minutos cada. Então decidi fazer um remix da “Goji”, e colocá-las em lados diferentes. A “Goji” é uma faixa longa, com 7 minutos, de jazz introspectivo, e destaca-se das outras. 

E porquê? 

Porque a “Goji” foi a primeira canção que compus. Criei-a na altura em que estava ainda a acabar a licenciatura na Universidade Lusíada em Jazz e Música Moderna e tinha de compor um tema para o recital de final de ano do curso. Curiosamente, toquei-a com os mesmos músicos que gravaram comigo o disco. Era uma versão mais jazz acústica e a estrutura do tema foi feita de uma maneira mais livre e orgânica, não exporei tanto a parte eletrónica. Tive poucas intervenções na produção, e por isso, o tema não sofreu grandes alterações desde a primeira versão. 

Ou seja, com este remix tentaste adaptar o tema ao resto do álbum? 

Senti que o próprio tema “Goji” tem, no fundo, três partes, sendo que a “Skit” é a terceira parte da “Goji”. O álbum está cheio de trocadilhos e easter eggs [risos]. Para este remix, peguei numa das partes para criar uma mudança. Por isso, escolhi o drum and bass. Este remix tem uma grande parte da “Goji”, mas há um momento que se torna um novo tema. Acrescentei uma letra, novas melodias e harmonias. 

É um remix que irá catapultar para outros projetos. 

Sim, não consegui resistir [risos]. Podemos dizer que é um remix, com muitas aspas. 

E porque o álbum Dimensions é composto por temas que têm a sua particularidade, o que é que fazem a “Goji Remix” e a “Purple Spiders” serem únicas? 

Todos os temas têm uma particularidade, como na “Goji” original tem um sample meu em criança a rir e a dizer: “Podemos comprar uma Barbie com 200 escudos”. O remix da “Goji” tem o som da câmara do estúdio. Quando acionávamos o sistema do estúdio ele dizia: “System starting up”. Esse sample faz a transição da primeira para a segunda parte da música. Na “Purple Spiders”, colocámos alguns sons da Xbox, porque quando era miúda tive uma Xbox e passei muitas horas da minha vida a jogar. Em todos os temas existe sempre um lado introspectivo que vai à procura de momentos nostálgicos da minha infância.

O que jogavas?

Jogava um jogo incrível chamado Jet Set Radio Future.

Um jogo com uma soundtrack incrível.

E também é drum and bass. Mas o tema é muito interessante porque, enquanto que os outros surgiram em casa e só depois é que os trabalho com a banda em estúdio, este surgiu de uma jam gravada. Normalmente costumamos fazer improvisos gravados e tentar selecionar um ou dois minutos interessantes para irmos depois para a composição. E “Purple Spiders” foi assim. Outra coisa interessante desta faixa é que é tocada sempre com acordes maiores, porém são super ambíguos porque não têm a terceira [nota]. Esta faixa acaba por se distinguir das outras em termos harmónicos. Além de todos esses pormenores, o tema também tem letra, que também surgiu num ensaio. Houve uma altura em que me apetecia cantar qualquer coisa, mas não me saiam palavras. Letras não são o meu forte. Sou a pessoa da mensagem. Nem me vejo como cantora, nem faço letras. Defendo-me com outras qualidades. Porém a letra é o seguinte: “Purple spiders / Purple spiders / Salty flowers”.

O que significa?

O Sebastião Bergmann, meu baterista, disse que tinha visto a aranha, Saitis barbipes e tirou foto para nos mostrar. O problema é que eu tenho fobia a aranhas. Hoje já lido melhor com as pequeninas, mas ainda me custa. Ele tirou fotos e mostrou-me. E eu comecei a cantar “Spiders, spiders…”, e de seguida “purple”, porque me lembrei da cor roxa. “Salty flowers”, referente às flores das dunas da praia, surgiram porque eu comia uma ou outra quando era miúda. Em todos os temas, existe sempre este meu lado introspectivo que quer ir buscar elementos que me definem. 

Trabalhas muito à volta da tua infância, não é?

Sim. Trabalho muito a partir de memórias. Gosto de viver o meu passado. Aproximo ou aumento uma coisa pessoal na música. Mesmo que ninguém saiba. Faço a música também para mim.

Onde é que foram colocadas as bonus track? Decidiste separar a “Goji Remix”? 

Não. No disco de vinil está tudo seguido, ou seja: “Goji”, “Skit” e “Goji Remix” — isto no lado B. A “Purple Spiders” está como última faixa do lado A. 

Faz um ano desde que lançaste o Dimensions: quais são os teus planos para o futuro? O que tens explorado?

Tenho tocado muito, ouvido coisas novas e pensado no que vem a seguir. Este disco fechou um ciclo da minha vida. Agora, já estou a pensar num 2.0. Neste momento, estou a tentar perceber onde estou e o que quero e o que procuro, porque eu sempre crio música consoante aquilo que gostaria de ouvir enquanto ouvinte, e isso leva-me a experimentar géneros que nunca abordei. É sempre esse o motor. 

E esse 2.0 é uma continuação conceptual do álbum?

Não. É um 2.0 no sentido de ser uma nova fase daquilo que estou a ouvir e a querer explorar agora. Vou acumulando ideias e sons. Tenho já dois temas que podem fazer parte do próximo trabalho: um mais mellow e outro mais upbeat. Estou à procura de um equilíbrio entre os dois, algo que possa dar coerência a um novo álbum. Gosto que os álbuns tenham um conceito, um fio condutor. O Dimensions, por exemplo, tem elementos recorrentes — tons que se ligam, sons que se repetem de forma subtil. Quero manter esse tipo de detalhe no que vier a seguir. Mas, ao mesmo tempo, quero evoluir. Agora quero explorar algo mais eletrónico, mais dançável e passar mais tempo no estúdio a explorar produção e sound design.


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