Senhoras e senhores, meninos e meninas, e todxs aqueles que não se encaixam nas normas de género impostas pela sociedade, aproximem-se, aproximem-se! Limpem os ouvidos e fechem os olhos, pois garanto-vos que não ficarão desapontadxs com a artista que em breve sobe ao palco desta modesta rubrica mensal! Sem mais demoras, façam o vosso scroll mais agitado para Lana Gasparøtti!
O nome lembra uma entertainer nata, e é também uma boa desculpa para o começo circense deste texto. Mas a verdade é que a artista natural de Lagos com ascendência croata está agora a dar os seus primeiros passos a solo. Depois de terminar os estudos em Piano Clássico e a licenciatura em Piano Jazz, Gasparøtti colaborou com várias bandas de inspirações musicais distintas, como Plasticine, Beatrice, Orfélia ou Outer Game. Esse último projecto junta Jazzafari na voz a Henrique Carvalhal na guitarra, António Carvalhal na bateria e Gasparøtti nos sintetizadores que conhece tão bem. Basta ouvirmos os primeiros segundos de “Alegre Mente” para reconhecermos a mão da artista a percorrer as teclas pretas e brancas com muito estilo.
Em 2020, começa a escrever as suas primeiras músicas no quarto e apresenta-se a solo. Em plena pandemia, Gasparøtti destilava grooves capazes de meter inveja a Chet Faker. “Something in my way”, o single que viria a lançar quase três anos depois, é uma música que tem tanto de descontraída como de complexa, com uma progressão cativante e uma acertada escolha de sintetizadores durante o pequeno solo. É também em 2020 que é escolhida pelo público para fazer parte do alinhamento do Festival Emergente. Alinhando com João Segurado no baixo e Sebastião Bergmann na bateria, esta equipa maravilha acabou mesmo por ser premiada com o galardão de Melhor Concerto Super Emergente dessa edição. É algo compreensível; o estilo de Gasparøtti abraça mundos de forma inclusiva e desprovida de julgamento.
Há artistas que nos surgem na mente quando ouvimos o seu (para já) curto output musical: Thundercat, BADBADNOTGOOD, as aventuras no planeta jazz de Flying Lotus. Mas há algo mais psicadélico e electrónico na viagem desta artista, uma curiosidade em fundir estéticas sonoras que a mostram como alguém que ouve, reflecte e absorve antes de compor. No seu single de apresentação oficial, “Mar”, a bateria acelerada quase que poderia fazer parte de um set de drum and bass, mas a multitude melódica, as progressões intrincadas e a aventurosa transição entre secções asseguram-nos que é o jazz a principal influência. Mas Gasparøtti vai mais longe: há uma manipulação sonora que se estende para além das notas que toca e das melodias que conjura: ouvimo-la brincar com sons de interferência de telemóvel, além de outros samples que se ouvem a flutuar pela música, enriquecendo o espaço sonoro com critério.
“Mar” acaba de forma repentina, parecendo desintegrar-se na recta final em direcção ao caos interior da estrela que a forjou. “Always leave them wanting more” é uma citação atribuída por vezes a P.T. Barnum, empreendedor norte-americano fundador do circo itinerante “The Greatest Show on Earth”. E sem dúvida que Lana Gasparøtti se rege por essa máxima. Cá estaremos todxs à espera da próxima fusão musical.