pub

Fotografia: Nosh Work
Publicado a: 05/06/2023

De volta para causar estrondo e estrilho.

Kroniko: “Estou a cozinhar mais cenas. Tenho uma equipa de samurais and blade makers on this shit

Fotografia: Nosh Work
Publicado a: 05/06/2023

As ruas passam para primeiro plano no regresso de Kroniko. “John Gotti” é o novo tema do rapper e assenta num instrumental “sem cortes” providenciado por Il-Brutto.

Após um silêncio editorial que reinava há quatro anos, Kroniko voltou a abrir a sua banca no rap com uma faixa que põe qualquer soldado do game a bater continência. Produzido pelo homem que afia as lâminas dos bisturis em ESCALPE, “John Gotti” conta ainda com adds de Here’s Johnny (também responsável pela mistura e masterização), tendo sido gravado por Pablo no Estúdio Santa Catarina e apresentado no YouTube com recurso a um videoclipe dirigido pelo próprio artista — sob o histórico pseudónimo de LxCartel — em colaboração com Blurd.

Anteriormente conhecido como DonZoyde, o MC de Lisboa estreou-se enquanto Kroniko em 2016 com o álbum Retrxspectiva. Seguiu-se um novo LP, Estigma, em 2017 e, dois anos depois, o curta-duração Kronimil, tendo pelo meio editado o primeiro e segundo volumes para a saga de singles “Plata O Plomo”. Depois do seu nome se ter esfumado pela ausência de novidades, “John Gotti” reverte a situação com um disparo para o ar que, segundo apontou o autor ao Rimas e Batidas, não será caso isolado.



Andaste afastado dos lançamentos durante um período considerável e mesmo nas redes sociais a tua pegada digital no pós-Kronimil foi quase nula. O que te levou a ligar o modo off the grid e qual foi o clique que te fez voltar com um novo single?

A vida dá muitas voltas, umas que conseguimos ser nós a dar, outras que acabam por ser ela a dar-nos! Kronimil foi o terceiro disco consecutivo no espaço de 3 anos, espaço esse em que lidei com suicídios dentro de casa que, tive de lidar com N cenas muito complicadas que acabaram por me levar ao auge em termos de exaustão. Claro que a cabeça arrebentou, e com isso veio uma montanha russa de situações que me levaram a desligar completamente do game e de tudo o que andava a fazer. Inconscientemente ou conscientemente, foi a melhor coisa que fiz e hoje tenho a certeza que nada foi em vão. Este clique não sei se surgiu no dia que vi a minha mãe deitada na cama dum hospital a morrer, se surgiu quando bati os 40 anos e me fez pensar em N e determinadas cenas, mas a verdade é que surgiu natural, sem pensar muito, sem grandes articulações. E acho que o facto de ter surgido naturalmente acabou por fazer com que as cenas tivessem o resultado que estão a ter.

Durante esse tempo, afastaste-te do hip hop também enquanto ouvinte ou foste um espectador atento ao longo destes últimos anos? Aprendeste alguma lição ao teres estado mais resguardado, ao andar pelos bastidores ou mesmo numa posição de maior distanciamento?

Nunca deixei de ouvir hip hop. Acabei sempre por ir consumindo cenas que sempre curti! Rap tuga feito nos dias de hoje não ouço, chapéu mesmo. Ou posso dizer que os que ouço são tão “rua” que ninguém os conhece ahah. Tipo, a banda sonora lá em casa é Naughty Ganja, sem dúvida — sempre foi e continua a ser! Rapazes sabem lá quem era, quem foi ou quem é o Naughty ahahah. Mas explicação de não ouvir cenas tugas é porque ninguém traz nada de novo, preocupam-se muito em trazer sonoridades diferentes e acabam todos por soar ao mesmo. Shit sounds all the same. Das maiores lições que aprendi nestes tempos foi fazer para mim sem pensar se A ou B vai curtir, sem pensar se é isto que as ruas querem, se é isto que o pessoal quer ouvir! Tudo depende de nós. Aprendam a controlar isso, a descodificar essa fórmula e vão ver como o game muda. Por vezes é preciso morrer e renascer. Eu morri, tentei renascer muitas vezes, e renasci quando menos esperava!

Falas “directamente da Lisa [com] estrilho”, num rap que não vive de conceitos — apenas de relatos —, piscando ainda o olho a um grande chefe da máfia no título do tema. Que quadro é este que nos pintas na tua faixa de regresso?

Isto é uma peça das ruas. É uma pintura nua e crua do que se passa neste lado da tela, o lado do struggle, o lado escuro da sociedade em que poucos metem os olhos! Rap, rua, barras e barras — como o que se fazia antigamente e se perdeu. Deixaram bazar isto e é suposto ser como é — raw, dirty, nasty. Sujo e cru, tal e qual como o descrevo aqui. Não há refrões bonitos ou dicas fofas! Isto é para quem ’tá nas ruas a bulir, é para quem tem de se fazer à pista todos os dias! Deixaram morrer a dica. I’m about to bring the game back and shake it down de uma maneira que não estão preparados! Gotti revolucionou a cidade de Nova Iorque, eu vou revolucionar a Lisa. Essa Lisa mesmo, a do estrilho, onde a próxima geração que chegar não vai querer fazer outra coisa se não rap nu e cru! ‘Tá na hora de pôr as ruas a brilhar e de cortar as fontes a esse hip hop bonito e fofo!

A escolha do Il-Brutto para orquestrar este “John Gotti” foi um tiro certeiro e cria um contraste de gerações muito interessante. O que é que viste nele enquanto produtor e como surgiu a oportunidade de trabalharem juntos?

O Brutto é um young chef on a fucking big kitchen. Acho que Portugal não está preparado para esta nova geração de lâmina. A primeira vez que ouvi alguma cena do Brutto foi com o Blasph e o Nerve (“Bonasera“) e disse logo, “dope!” Não conhecia nada, nem a pessoa em si. Há uns tempos mostrei o “John Gotti” ao Kaps e disse-lhe que ia apanhar aí um beat. O Kaps disse logo, “Népia, este som pedia um beat do Brutto”, e fez o connect acontecer. A verdade é que às vezes é tão complicado escolher um beat, tipo ser aquele beat-chave. Produtores mandam-me 20 beats e sinto 1, mais ou menos. O fucking Il mandou-me 2 e o segundo foi logo automático, casámos mesmo. E hoje eu ’tou numa fase em que se o beat não é “o beat“, não vou fazer só por fazer. E desde que isto aconteceu assim, ui! We been cooking boy, for real. We been cooking! “John Gotti” é só um cartão de visita. Esperem pelo resto!

O videoclipe volta ainda a colocar em evidência a tua visão enquanto realizador. Além da “fome” que se presume que já tinhas das rimas, também havia essa vontade de recuperar a tua faceta enquanto LxCartel, que tanto ajudou a documentar o street rap no nosso país ao longo da década passada?

LxCartel faz parte dos livros da história do hip hop tuga, a verdadeira história! Não é aquela que vendem aí ao pessoal todos os anos, sem tirar crédito a nenhum dos que la está, mas aquilo ’tá muito mal contado. Da mesma maneira que lá falta LxCartel, faltam lá X de cenas que foram major importantes no game que corre hoje em dia. Sem nós não havia game hoje, mas pronto, mandem os foguetes à vontade, que fogo na zona não é de artifício. LxCartel vai sempre estar aí e, claro, depois de ter feito quase 200 clipes, I know how to direct my shit. Aliás, mesmo em trabalhos feitos antes com outras equipas, sempre tiveram a minha mão na direção!

Não posso deixar de reparar no destaque que dás a’O 36 ao longo de grande parte da peça visual. Por mais voltas que a vida dê, dá a ideia de que este é um local que tem feito sempre parte do teu roteiro, não é? Uma espécie de ponto-de-encontro, ou até mesmo um “porto seguro”…

O 36 é casa. É a minha casa e a casa de muitos mais. Foi o tecto para muita gente. Aquelas paredes suam hip hop, suam rap! Aquela esquina já viu mais rappers do que muita esquina de Portugal! Foi esquecido por muita gente e agora ’tá aí para ficar lembrado para a história. ‘Nuff love and respect ao Cabrita por continuar a meter suor naquilo ao final de não sei quantos anos, por não desistir e, acima de tudo, por não deixar perder a essência que aquela casa tem!

Já tens ideias quanto ao teu futuro artístico? “John Gotti” é apenas uma ponta solta ou faz parte de um plano maior?

Chegar depois de 4 anos com uma faixa só para dizer “Olá ainda aqui estou” não faria muito sentido ehehe. Estou a cozinhar mais cenas. Tenho uma equipa de samurais and blade makers on this shit. Vou revirar a banca com a missão de trazer a essência de volta. De John Gotti a Nicky Barnes, tenho várias personalidades na gaveta!


pub

Últimos da categoria: Curtas

RBTV

Últimos artigos