pub

Fotografia: Pedro Mkk
Publicado a: 26/06/2019

O músico brasileiro actuou na edição deste ano do NOS Primavera Sound, no Porto.

Jorge Ben Jor: “Eu sou mais um da música brasileira que resiste”

Fotografia: Pedro Mkk
Publicado a: 26/06/2019

Com uma pequena alteração no género do pronome pessoal, “Oba, Lá Vem Ela” podia muito bem ser essa a banda sonora de uma entrevista a Jorge Ben Jor, que tardou a aterrar em terras portuguesas. Com o Parque da Cidade, no Porto, bem cheio, o “dinossauro da música brasileira”, como o próprio assume, não se acanhou perante um público na maioria mais jovem que os seus primeiros álbuns. A reportagem do concerto de dia 8 de Junho no NOS Primavera Sound pode ser lida por aqui, mas por agora vamos ao gingado do “poeta urbano” e aos segredos da sua longevidade.

Nos bastidores da festa e rodeados de camarins com nomes fortes do alinhamento do dia, como Rosalía e Erykah Badu, Ben Jor conversou com a imprensa nacional e contou histórias das músicas em que canta à sua outra paixão, o futebol, relembrou os músicos a quem deu a mão e, sobretudo, como bem lhe notámos, traçou com um sorriso o presente e o futuro da música. Ansioso por ver “essa menina”, Rosalía, o músico confessou que “adora” quando samplam a sua música para fazer algo novo: “A música fica florescendo sempre e eu gosto de ver.”



[A renovação do público]

“Eu sou mais um da música brasileira que resiste. Eu procuro seguir sempre o caminho da boa música, da boa poesia porque eu sou um poeta urbano, suburbano. Tenho o meu público e “graça” a Deus que no Brasil o meu público vai renovando. Tenho um público [que vai] de adolescentes ao pai e de tios aos adolescentes. São o meu público. Sou hoje assim considerado como um dinossauro da música brasileira, mas estou bem, me sinto bem.”

[Tocar no NOS Primavera Sound]

“Esse é um segredo que eu não sei contar. Os próprios adolescentes que vão aos meus shows pedem músicas bem mais antigas, do meu primeiro disco. Do Tábua de Esmeralda então, que é um disco que tem quase 40 anos, tenho de tocar várias músicas de que eles gostam, que eles curtem. Procuro fazer o meu trabalho em cima desse, mas de uma maneira bem moderna, actual e bem digital. Fiz novos arranjos para ficar ligeiro e a música ficar nova. Não através de mim, mas das pessoas que re-gravaram a minha música. [É daí que] vem o renascimento. Prova disso no Brasil tem Fernandinha Abreu, que gravou ‘Torcer pela Paz’. Ela renovou a música. E vários outras cantoras do Brasil e outros músicos. Pessoal do hip hop que usa a minha música.”

[Os samples]

“Adoro, adoro. Toco com eles. Agora estou a fazer dois trabalhos lá no Brasil, um novamente com o filho do Fábio Jr., o Fiuk, uma nova versão de samba rock. Romântico e dançante. No hip hop estou a fazer um trabalho com o Emicida. Acabei agora um trabalho com o Rappin’ Hood. O primeiro trabalho foi com o Mano Brown. E há outros, estou aberto a isso.

O meu contributo é instrumental ou alguma coisa que eles gostam que eu faça com a guitarra e pedem para mexer na letra, às vezes para adocicar um pouquinho. Com o meu lado de poeta vejo como se pode transformar.”

[Ser mentor]

“Chamam-me muito para fazer workshops. Ainda recentemente chega um rapaz de 15 anos com uma banda que queria uma formação. ‘O que é que eu faço?’. Primeiro eu quis ouvi-los. O que me chega de demo é muito demo, tem coisas boas e razoáveis e eu mesmo ajudo a organizar. Os primeiros com quem colaborei foram um sucesso, os Skank. Quando eles chegaram até mim não tinham nada, queriam gravar uma música em parceria. E eu disse que parceria não podia fazer naquele momento, mas que tinha uma música que iam gostar. ‘Cadê o Pênalti’, sobre uma história no Maracanã. Recentemente fiz uma canção com a Céu para uma promoção da Nívea, foi muito bacana esse trabalho.”

[Samba Esquema Novo]

“Quando saiu o Samba Esquema Novo, o que a gente ouvia no Brasil na época era muita música americana, os clássicos. Mas o que eu gostava era de rock’n’roll. Elvis Presley, Little Richard, de quem eu gosto até hoje. E o meu ídolo até hoje, que estava em ascensão na altura: João Gilberto. Foi essa mistura toda e por isso é que quando saiu o meu primeiro disco eles não sabiam o que é que eu estava fazendo, que ritmo, porque não era um samba tradicional, não era bossa nova, e então chamaram samba esquema novo. As harmonias eram simples mas fortes, e no texto das minhas canções eu já falava de um samba que está aí até hoje. Era diferente de todos os ritmos que existiam no Brasil, principalmente no Rio de Janeiro.”

[Profissionalismo em novos tempos]

“Eu não sou totalmente perfeito, mas sempre procurei ser profissional, apresentar-me bem. Para mim, acho que foi isso que deu certo. Apresentava-me sempre bem em todos os lugares, mesmo naqueles em que não era bom de ir, e as pessoas ficavam a falar de mim. Hoje há mais música que antigamente, qualquer um pode gravar até em casa. Antigamente para gravar uma música tinha que se ter o estúdio, ter um convite.

Estou com um projecto que está atrasado 10 anos, de fazer uma coisa nova semelhante aos movimentos como o tropicália, essa mistura. No meu tempo os presidentes das gravadoras gostavam de música, só deixavam entrar no estúdio quando estivesse pronto. Agora mudou. Querem algo rápido e se não resulta à primeira acabam por perder bons músicos e projectos.”

[O Flamengo]

“Eu sou Flamengo desde garotinho. O meu pai não era Flamengo, eu contrariei ele. Me incentivou a alegria da banda para alegrar a torcida e as outras equipas não tinham isso. Foi no estádio que decidi compor músicas como ‘Fio Maravilha’, que tem uma história incrível. Foi num torneio de Verão que faziam com os melhores clubes. De Portugal foi o Benfica. O Racing da Argentina. Do Brasil era o Vasco da Gama e o Flamengo. Era um quadrangular de Verão, todo o ano tinha. Na final ficou o Flamengo e o Benfica que jogava pelo empate. O Flamengo tinha de ganhar. O Benfica estava a ser campeão até aos 33 minutos do segundo tempo, mas um jogador, Fio, marcou e o Flamengo ganhou. Agora canto ‘Filho’, apesar de ter ganhado o processo em tribunal. ‘Umbabarauma’ é a história do primeiro jogador africano que vi na Europa. Ele tinha a camisa 10. Ele jogava de uma maneira estilo tropical, jogava bem. Tenho várias que falam de futebol, ficava aqui até amanhã.”


pub

Últimos da categoria: Entrevistas

RBTV

Últimos artigos