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Ilustração: Direitos Reservados
Publicado a: 02/01/2020

O lado menos óbvio do DJing.

Diz Que Jogo: round #2 com Telma, Mãe Dela, A Boy Named Sue, Cigarra e Bunny O’Williams

Ilustração: Direitos Reservados
Publicado a: 02/01/2020

Neste Diz Que Jogo (o verbo e não o substantivo) vamos falar com vários DJs sobre as suas motivações atrás da cortina, ou neste caso, da cabine.

Após um primeiro round renhido, segue-se um segundo com outros cinco nomes: a nova coqueluche da electrónica Telma; uma das primeiras DJs femininas na capital Mãe Dela; a máquina do tempo do rock’n’roll A Boy Named Sue; do colectivo brasileiro Voodoohop, Cigarra; e a DJ sem lei Bunny O’Williams.


[TELMA]

INÍCIO – Comecei a tocar em inícios de 2016, num formato muito informal, entre pequenos eventos e salas de estar entre amigos. Numa ou outra dessas ocasiões, comecei por utilizar um computador. Mas era um meio que não me cativava. Ao mesmo tempo, ia começando a coleccionar discos e a aprender a misturar com material emprestado, até ter conseguido investir num setup para casa. Ambient, house, disco, soul, etc., tocava coisas que conhecia e que me davam prazer ouvir no geral, sem ter muito a “preocupação da pista”.

Sempre estive próxima da área da música, escrevi e a fotografei vários concertos e festivais, fui a muitas e promovi algumas festas e, um ano antes de tudo isto, estive duas semanas fora, as quais passei por Paris, Berlim e Amesterdão pela primeira vez, e deixei-me deslumbrar pelo universo do clubbing lá fora.

Por isso, pareceu-me uma transição natural, embora não planeada. Uma coisa nova, entusiasmante, que combinava na perfeição o lazer que eu já conhecia com a componente de trabalho, mas também por ser uma forma interessante de interagir com as pessoas.

FLEXIBILIDADE – Normalmente levo sempre coisas bastante diversificadas, sobretudo se for tocar toda a noite, em que tenho mais liberdade e sinto que posso variar mais. Depois, tenho em consideração também o horário e o tipo de espaço. Por exemplo, num bar em que vou começar cedo e as pessoas vão estar sentadas e à conversa, ou onde vão chegando aos poucos, gosto de começar com hip hop, funk, jazz ou electrónica mais lenta, e, a partir daí, ir testando coisas mais dançáveis. House, electro, breakbeat, etc. A luz também me influencia um pouco. Em ambientes mais escuros tenho sempre tendência, e maior à vontade, para tocar coisas mais estranhas e mais intensas. Se for tocar a uma discoteca e já forem duas da manhã, normalmente levo apenas música directa ao assunto, “pisteira”.

SHOPPING + SHIPPING – Para discos, gosto muito de visitar algumas lojas aqui em Lisboa, a Flur, a Peekaboo, a Carpet, etc., mas também gosto de “scrollar” pelo marketplace do Discogs para apanhar algumas pechinchas, sobretudo para coisas mais antigas, usadas.

Também compro muito digital, sobretudo no Bandcamp, que é um mundo de editoras e artistas novos e bons, mas também no Beatport, que é óptimo para coisas antigas que às vezes são difíceis de encontrar noutro formato.

ORGANIZAÇÃO – Quando toco com discos, muitas vezes organizo-os por momentos do set, se fizer sentido — início, meio e fim. Mas também por estilos, consoante esses momentos. Depois logo se vê. A minha pen, sem dúvida, sempre por estilos — acid, electro, techno, house assim, house assado, breaks. Gosto de saber o que tenho de cada um para poder introduzir elementos diferentes e variedade ao longo do set. Já tentei tocar com os ficheiros organizados por artista e também por BPM, mas não é para mim. Fico maluca e mais perdida porque nunca me lembro do nome de ninguém.

DIVULGAR vs ANIMAR – Acho que é uma mistura de ambos, mas talvez mais de divulgação. Normalmente os meus sets são um reflexo do que ando a ouvir mais e a comprar ultimamente, o que engloba sempre muita música de editoras recentes, EPs e produtores novos, se calhar até ainda menos conhecidos.

No fundo, não faço bem uma distinção entre coisas obscuras e hits. Gosto de tocar músicas mais fora e clássicos, e entre elas apanhar os elementos certos que as vão fazer resultar em conjunto. No fundo, procuro que os meus sets sejam variados e interessantes, que tenham elementos surpresa, e que espelhem da melhor forma as horas que dedico a pesquisar todas essas coisas.

MIXAR – Misturar é importante e necessário, claro. Para que a música flua e não haja grandes quebras ou ruído. Agora, penso que cabe a cada um perceber como se sente melhor a fazê-lo, e encontrar o seu jeito. Eu faço-o de forma intuitiva, vou confiando no que o meu ouvido foi aprendendo ao longo do tempo. Não tenho muitas noções técnicas, não conto barras nem nada disso. Atiro, ajusto, e, se soa bem, vamos embora.

FEEs – Acho que existe ainda uma grande disparidades entre cachets consoante os locais. Tanto vais tocar o mesmo número de horas por 60 euros, como por 200 euros. É um contraste gigante. Também, quando penso na proporção cachet-tamanho do espaço, acho que há por aí alguns grandes e com boa afluência que poderiam e deveriam aumentar o pagamento aos artistas.

De um modo geral, também sinto que os promotores e organizações vão ganhando mais a noção de que isto é um trabalho, de que comprar música — em qualquer formato — é um investimento considerável, a par de todas as horas “não-remuneradas” que se gastam a ouvir, pesquisar, preparar, sem contar com as horas presenciais no gig, deslocações… Tudo isto, a meu ver, deve entrar para o bolo.


https://www.mixcloud.com/eastsideradiolx/mãe-dela-24-jun-2019/

[MÃE DELA]

INÍCIO – Comecei a pôr música no final dos anos 90. Comecei em bares do Bairro Alto, primeiro com CDs e depois com vinil (não tinha gira-discos em casa, por isso a primeira vez foi “live and direct“). O interesse por música sempre esteve presente desde cedo. Mas o bichinho de “ser DJ” nasceu em Inglaterra, onde estudei durante um ano e onde absorvi toda aquela cultura. Consumia muita música, sentia vontade de partilhar esse conhecimento. Sobretudo géneros menos populares e subestimados na época. Queria mudar isso. Comecei por explorar o trip hop e garage/2step, clássicos de hip hop e r&b. Depois fui explorando outros universos. Aprendi muito com a cultura hip hop, foi a minha escola e influência como DJ. Comecei a tocar como DJ no bar Mexe Café e depois a convite do DJ Kronic, no Clube da Esquina, onde mantive uma residência semanal durante sete anos, alternando com a faculdade e com outras actividades. Entre essas actividades destaco a organização de festas, concertos, workshops de DJ, divulgação de novos talentos do rap — ex. na Galeria Zé dos Bois; Garage, Voz do Operário. Com isto pretendia contribuir para enaltecer a cultura hip hop em Lisboa e para reduzir o grande estigma e ignorância que havia em relação ao rap e à cultura que emergia nos bairros da periferia de Lisboa. Na verdade, já era uma experimentação e aproximação dos meus interesses académicos à musica.

Dentro do meio do hip hop/r&b/funk, fui das primeiras mulheres (antes de mim a Yen Sung), eventualmente mais uma ou outra que não conheci. É importante dizer isto porque, como mulher, antes era bem mais difícil penetrar e ganhar reconhecimento neste meio musical e como DJ.

FLEXIBILIDADE – Não uso nenhuma fórmula em particular, tem mais a ver com o meu estado de espírito e as minhas referências. A espinha dorsal é soul e funk, de resto é arquetípico. O ambiente é uma mistura de clássico/futurista, orgânico/electrónico, tentando descolar-me da barreira do tempo (há sempre soul, funk, jazz, disco, rap, boogie, r&b, ritmos latinos e africanos) . Eventualmente, num clube procuro ser mais sensível aos BPMs, groove, basslines, abusando da “sujidade” e rudeza natural. Num bar, o registo é (e sempre foi) livre e intuitivo.

SHOPPING + SHIPPING – Até há 10 anos, comprava discos em lojas e feiras. A Godzilla, a Kingsize e a Supafly foram uma verdadeira escola para mim. Mais do que comprar discos passava lá muitas horas a conversar com colegas DJs e outros amantes e coleccionadores de música. Mr Cheeks foi uma pessoa importante nessa época, foi ele que me introduziu verdadeiramente ao funk. Hoje em dia, por razões económicas e também por falta de tempo, pondero mais as minhas compras. Compro sobretudo online e sempre que posso faço diggingem feiras e mercados de rua. Sempre que viajo, tento fazer o mesmo. Pontualmente, vou a lojas como a Groovie Records, Flur, Peekaboo.

ORGANIZAÇÃO – Antes levava discos de vinil e CDs (às vezes só discos). Actualmente levo vinil e pen. Antes era mais fundamentalista em relação aos formatos que usava. Sempre defendi a cultura do vinil. Mudei um pouco a minha opinião em relação a isso por várias razões: primeiro porque os discos se desgastam com o tempo — a tocar em clubs, com o manuseamento, diferenças de temperatura, viagens, etc. Segundo, porque o vinil se tornou num verdadeiro objecto de luxo e negócio. Acho abusivo e entristece-me este “comeback” do vinil porque é dominado pela lógica do negócio e do consumo, sem grande lucro directo para os artistas. Não me vou alongar nesta discussão mas acho que é importante reflectirmos sobre a diferença entre sede de cultura/sede de consumo. Terceiro, porque o que pagam aos DJs é, na maioria dos casos, absurdo, comparativamente ao preço dos discos. Por isso, acho que só vale a pena tocar com discos se aqueles que nos contratam respeitam a nossa luta (dentro dos limites possíveis) e contribuem para dignificar a verdadeira cultura do DJing.

MIXAR – Corto e colo quando acho que é o momento, às vezes abruptamente de propósito. Faço as minhas pequenas brincadeiras. Quando acho que é interessante fazer uma passagem mais suave ou acertar batidas também o faço. Arranho pouco. Dou mais importância à sequência, à melodia e ritmo (se tem aquele boom bap, se tem violinos, congas, linhas de baixo ou um refrão, gosto de os enfatizar nas passagens).  É importante conhecer as músicas e ter “skills“, ou seja, saber misturar e manusear o equipamento, o resto é liberdade para experimentar consoante a vibração do momento.

FEEs – Como já disse anteriormente, considero que os cachets praticados por cá são, na maioria dos casos, incompatíveis para quem quer viver só da actividade de DJ. Depois com a banalização da profissão e o digital as coisas pioraram (toda a gente acha que pode ser DJ; alguns passam música de graça; a maioria tem que aceitar as ofertas, numa lógica de sobrevivência; os bares e clubes também tiram proveito disso). O DJ tornou-se indispensável (dizem) mas é tratado como acessório (na prática). Não quero generalizar, é um comentário pessoal que tem por base a minha experiência e conversas que vou tendo com alguns colegas.


https://www.mixcloud.com/eastsideradiolx/cafe-mondo-10-dec-2019/

[DJ A BOY NAMED SUE]

INÍCIO – Comecei a passar música em 2001, na altura estava a descobrir um mundo de música nova e apercebi-me que na minha cidade (em Coimbra) era tudo demasiado aborrecido, comercial e cliché e não passava a música que eu queria ouvir (rock’n’roll, punk rock, new wave). Com cerca de 20 CDs e 20 LPs comecei a organizar festas com amigos com música diferente e com decorações dos espaços muito do it yourself na esperança que houvesse mais gente como eu (e havia).

FLEXIBILIDADE – Sou muito flexível musicalmente, tanto em géneros musicais como no registo de ambiente que vou “musicar”. Como os meus gostos variam muito, tanto posso passar música num Baile Tropicante como numa noite psicadélica de blues, soul e rock’n’roll ou num festival gótico. Todas as semanas preparo os discos tendo em conta os locais, as cidades e o tipo de eventos a que vou no próximo fim-de-semana.

SHOPPING + SHIPPING – Compro música das mais variadas maneiras, em lojas específicas em Lisboa e no Porto, em feiras ou na Internet (Discogs/ Bandcamp/ sites de lojas específicas..). Como trabalho com o The Legendary Tigerman viajo imenso e tento sempre procurar lojas e feiras nos sítios onde vou, onde muitas vezes encontro coisas mais difíceis de encontrar em Portugal.

ORGANIZAÇÃO – Tenho sempre a mesma organização em todas as malas (CDs/ 7’’/ 12’’). É uma ordem um bocado própria num misto de temporal com estilos (com associações e secções que só eu entendo mas que fazem algum sentido (blues/ rock’n’roll > surf 50s > soul > world  > garage 60s > glam > punk 70s > new Wave 80s > moderno/ 2000 para frente > electrónico). Todas as semanas refaço as malas tendo em conta os sítios e eventos a que vou, nos 3 formatos que uso, CDs, 7’’ e 12’’.

DIVULGAR VS ANIMAR – Acho que tem que haver um equilíbrio entre os dois, entendo que estou ali para entreter as pessoas e fazê-las divertir, mas tenho que o fazer com personalidade e surpreendê-las, tanto mostrar-lhes coisas que não conhecem como passar umhit quando não estão à espera. Em qualquer dos casos estou a passar música para as pessoas e não para mim.

MIXAR – Sendo que sou um DJ maioritariamente de rock, mixar é algo que não faz muito sentido, costumo dizer que sou mais um selector que um DJ, passo músicas e encarrilo-as de maneira que faça sentido e com uma certa dinâmica. É claro que às vezes posso acertar melhor uma passagem para colar algumas músicas e só ganho com isso, mas não acho que nos estilos que passo seja algo fundamental.

FEES – Acho que há um grande discrepância entre géneros musicais e também dentro do mesmo género entre uma pequena minoria e o resto dos DJs. Acho que em geral há uma subvalorização da maior parte dos DJs (DJs propriamente ditos), se compararmos o fee com o que o DJ faz ganhar a um clube/ festival. Além disso se repararmos bem, os valores dos fees que grande parte dos clubes pratica estão congelados há uma boa série de anos, enquanto o custo de vida (e dos discos) tem vindo sempre a aumentar.

TARAS E RITUAIS – Não tenho grandes manias. Estou habituado a quase o todo o tipo de situações. Quando faço uma noite inteira de cinco/seis horas gosto de chegar cedo para ter tempo de “aquecer” e ter tudo pronto (tenho um setup que demora algum tempo), depois até posso estar uma hora a passar música ambiente, mas prefiro isso do que estar a stressar a montar coisas, abrir malas e já ter a pista com gente. Tenho várias músicas para terminar a noite, mas depende sempre de cada noite, das horas e do feeling com que quero terminar.


[CIGARRA]

INÍCIO – Foi há uns 13 anos, quando eu escrevia resenhas sobre shows e lançamentos de discos numa revista Online no Brasil chamada Banana Mecânica, nesta fase toda a minha relação etérea com como a música me construiu como pessoa veio transbordar na prática. Eu queria falar de música e cultura de todas as formas que pudesse e a juventude me deixasse. Daí em diante muita história e luta!

FLEXIBILIDADE – Eu vou pelo senso de oportunidade, percebendo em quais espaços terei um público que vai degustar mais um tipo de música do que outros. “Ali posso aproveitar para pesar a mão”, “nesta noite posso ser muito lenta que vão me entender”, “aqui vai ser no ativismo!”. Confesso que as vezes perco o chão quando percebo alguém que admiro muito me está ouvindo, mas às vezes isso pode ser combustível também. E em geral, com o tempo, fui tendo a mesma personalidade e unidade em qualquer lugar.

SHOPPING + SHIPPING – Eu não lembro da última vez que comprei música, e os poucos materiais físicos que tenho ganhei de presente. Na minha label eu distribuo gratuitamente e aceitamos somente doações, é mesmo onde aplico minha militância sobre a música livre. Para tocar tem ainda coisas que não encontro em lado nenhum e baixo direto do youtube, pasme! Aí uso trechos. Em geral coisas de artistas que não vivem nem dependem da venda especificamente. E olha que nesse papo de soar bem, de 320kbps, de wave vs. mp3, tenho muitas tracks oficiais que não batem e outras de copyleft que kickam que é uma beleza. Entre registros antigos ou longínquos, trechos de falas, sons extraídos de vídeos, a estética das minhas próprias músicas são baseadas nisso.

ORGANIZAÇÃO – São em torno de 10 fucking kg pra lá e pra cá. Eu trabalho com Ableton mesclando varias tracks e loops então carrego laptop e uma controladora maior que ele, além de placa, cabos, phones. O trampo é só conferir tudo e preparar as costas. Ah! E uma bolsinha de maquiagem vai sempre junto, mesmo com tempo em casa me maquiar nos transportes é parte do ritual.

DIVULGAR vs ANIMAR – Eu misturo as duas coisas, ao mesmo tempo muitas vezes. Se quero tocar algo para cantarem na pista, faço ali uma versão mixada com outras referências para dar um brilho criativo além do hit. A resposta do público é muito importante para eu desenvolver o set, eu piso em ovos se não ouço as reações então gosto de me repetir em algumas malhas e fazer umas catarses sempre que caiba, desde a identificação até o “WTF ela está fazendo ali?!”.

MIXAR – Envolver o público é a arte do DJ, se ele faz isso numa selecta, ótimo! Amo quando ouço uma sequência de músicas que fazem tanto sentido e não me fazem parar por isso, não somente pelo flow do beat constante. No meu set eu sempre mixo muito, pois isso faz parte da minha brincadeira, é meu puzzle preferido na vida! Mas não da pra ser só isso, a história ainda é o mais importante.

FEEs – A remuneração pelo trabalho em Portugal é toda coerente! Ganha-se pouco em qualquer serviço. Só não faz o mínimo sentido com a grana que entra do turismo, do mercado imobiliário e das empresas que vêm aos montes para cá. A falta de investimento na cultura é gritante e nos falta um pouco de união para não praticarmos esses pisos mais, pois é difícil se negar sozinha a um fee enquanto tantos outros DJs aceitam tocar pela metade.

TARAS E RITUAIS – Pois é eu sempre lembro horas antes de tocar que eu tinha uma listinha de coisas no Shazam pra experimentar! E lá vou eu ver se acho pra baixar e preparar tudo no Ableton correndo. Confesso que levo o mesmo tempo fazendo isso que gasto nos rituais de figurino do dia em que vou tocar. E uma vez na festa, é aquele shot de tequila antes do play! Pronto, energia construída.


[BUNNY O’WILLIAMS]

INÍCIO – Tudo começou em 2010. Vivia com a minha melhor amiga Cátia (Cherie LoveAffair) em Horrivelas e trabalhava num bar de rock chamado Boca do Inferno no Bairro Alto. Na altura saíamos muito, sempre fomos e continuamos a ir a muitos concertos mas fora isso não havia nenhum espaço onde pudéssemos ouvir a música que gostamos fora de casa. Decidimos então criar a dupla de DJs Twisted Sisters para que nós e os nossos amigos nos pudéssemos regozijar com o melhor e o pior do classic rock e do hard n’heavy dos setentas e oitentas em espaços exteriores ao nosso lar! O primeiro evento foi um ESTRONDO tendo em conta que rebentámos logo com o amplificador do bar. Ao fim de quase 10 anos, continua a não haver um espaço para ouvir este tipo de som mas nós continuamos a ser bem recebidas onde quer que vamos <3

FLEXIBILIDADE – Sempre nos adaptámos muito bem a diferentes tipos de público, pois mesmo que não fosse o tipo de música que o público estivesse habituado a ouvir, acho que se deixavam contagiar pela nossa energia, paixão e “show off“! Somos as maiores fiteiras e os nossos DJ sets têm uma componente performativa muito forte *risos*. Para além disso, o peso da nossa selecção musical é contrabalançado pela magia dos “guilty pleasures“. De Wicked Lady a Kate Bush é um pulinho!

SHOPPING + SHIPPING – Quando começámos isto usávamos CDs, os nossos e os dos nossos pais! Ha! Ha! Nunca quisemos ser DJs mas foi acontecendo… Também nunca tirámos os vinis de casa, pois nos bares onde passávamos música na altura não havia gira-discos… Às vezes nem leitores de CDs (já chegámos a passar música com dois leitores de DVD *facepalm*). Entretanto duas coisas aconteceram… primeira, numa fatídica noite de Caos do Sodré roubaram-nos os CDs (colecção que entretanto cresceu com muito suor e trabalho) e segunda, começámos a fazer parte do cartaz de festivais como o Hellfest em França e a passar música em salas como a Apollo em Barcelona! Decidimos então investir no vinil, mágico e intemporal. Não fazemos compras online, o digging é uma das nossas formas de terapia <3

Sítios favoritos para adquirir os melhores discos: em concertos, comprando directamente às bandas (personal favorite); Groovie Records, Megastore & Monolith Records, Louie Louie, Flur, Carbono, Glam-O-Rama (Lisboa); Matéria Prima, Black Mamba (Porto), Platten Pedro (Berlim), Melomane (Nantes).

ORGANIZAÇÃO – Entretanto, a melhor metade das Twisted Sisters mudou-se para Berlim e fiquei aqui eu, sozinha, em Lisboa, cidade que tem vindo a fechar cada vez mais portas à cultura underground… ou à cultura (ponto). Esta “luta” tornou-se ainda mais pessoal. A Rádio Quântica ajudou, abrindo-me as portas para um mundo diferente do meu e foi esplendoroso. As portas da minha mente também se abriram e decidi começar o Bode Respiratório! Evento cujo conceito musical muda de noite para noite ou de matiné para matiné. Cada Bode tem um tema musical, desde o psicadélico turco à electrónica obscura, tudo vale! Como diz o DJ A Boy Named Sue “não existem guilty pleasures, tudo é prazer”. Vejo-me deparada com o desafio de comprar e preparar música nova para cada DJ set e dá-me um gozo tremendo. Horas e horas de pesquisa, horas e horas de picar os discos todos que tenho, horas e horas de digging nas lojas acima referidas e de chatear os donos das mesmas para me darem sugestões (grata para sempre).

DIVULGAR VS ANIMAR – O principal objectivo do Bode é divulgar a música e a arte no geral. Para além dos DJ sets com vários convidados diferentes, o bode conta também com música ao vivo e artes performativas. Sendo o objectivo o de não deixar morrer a cultura alternativa que ainda conta com tantos seguidores sequiosos e apaixonados e fazer com que mais se juntem a nós! So far, so good :) Quanto a animar, a música tem o dom de provocar sensações diferentes de tema para tema e de indivíduo para indivíduo. Há quem dance, há quem tenha experiências transcendentais, há quem sinta o espaço onde está e há quem viaje… o que faz o Bode é a capacidade que cada indivíduo tem de se deixar levar, de mente aberta. Cada vez somos mais a querer experiências diferentes mas cada vez há menos espaços com abertura para este tipo de eventos. Bem… não tenciono desistir!

FEEs – Mais uma parte complicada de organizar eventos em Portugal é encontrar casas que possam suportar os custos para estes eventos. Só o consegui fazer porque a união fez a força e encheu espaços. Sinto uma grande discrepância entre o que ganha um DJ/produtor por noite em Portugal e o que ganha noutros pontos da Europa mas é igual em vários campos profissionais. Este não é, simplesmente, o país certo para ser “criativo”. Mas tem o sol mais lindo, a gastronomia mais deliciosa e as minhas pessoas favoritas… não me imagino a viver noutro. Portanto, há que lutar!

MIXAR + TARAS e RITUAIS – Só me lembro de algo que tinha com a Cherie LoveAffair e que continuo a ter sozinha que é escolher uma música como tom da noite, aquela música que ouvimos em loop várias vezes nessa semana (aposto que isto acontece a todos, muitas vezes), aquela música que eleva o teu estado de espírito e que muda o tom da festa do “warm-up” para o “a pista está aberta”, ou pelo menos que significa isso, dentro de ti. Tara e mania é pegar nessa mesma música e passá-la as vezes que quisermos nessa noite! Sem limites e sem culpa, esta é permitida rodar sempre quisermos! Twisted Sisters SEM LEI, para sempre <3 Sozinha, não sou a rainha da mixagem, mas como uso alguma música electrónica nos meus sets, aprendi a safar-me. Preocupa-me mais a selecção e o êxtase que sinto enquanto me deixo embriagar pela música, é bastante orgânico, fluido e natural.

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