We’re All Alone In This Together surge de uma citação numa conversa entre o rapper londrino Dave e o compositor Hans Zimmer. O título do álbum facilmente remete para pensamentos acerca da dificuldade de persistir durante o período da pandemia: das questões de saúde mental e da depressão ao crescente desânimo que, no extremo, pode levar ao suicídio.
Entra-se no disco como dando entrada no começo de um filme, mais precisamente o documentário da actualidade do que é estar na pele de Dave e de como isto de estarmos sós, mas juntos, circula em torno da intensidade da sua relação com os fãs. Não é por acaso que o músico britânico registou a melhor semana de vendas no Reino Unido para um álbum rap desde 2010.
Este trabalho é a norma, a estética que confirma aquilo que já se presenciava no seu disco de estreia Psychodrama: ouvimos um músico com uma noção elevada de si, de um poder de observação transcrito para temas ricos em figuras de estilo, com jargão e cadência que reforça cada palavra final verso-a-verso, uma das características definidoras da cena britânica.
O local é Londres, claro, cercado de corrupção política, exclusão social ou egocentrismo com consequências bem visíveis (outras vezes não). O som é áspero, duro, de confronto (“Clash” com Stormzy e “Verdansk”) com a habitual presença do piano tocado por Dave em beats grimey, que adicionam um sentido melodramático. E porque assim tem de ser: do escândalo de Windrush, ao terror na torre Greenfell, o racismo continua presente, a gentrificação galga a olhos vistos e o classismo cria barreiras. Mas há festa para aliviar a dor (“System” com WizKid e “Lazarus” com Boj) e vulnerabilidades passadas e presentes que saem em sons sombrios (“Both Sides of a Smile” com James Blake e “Twenty to One”).
Dave é cativante nas mesmas quantidades que é angustiante — por vezes torna-se exaustivo escutar demasiadas referências. É um estado de espírito, contudo, de quem racionaliza imenso e vive a fama dia após dia quando ainda tem 23 anos. Se há fórmula para o sucesso, a ele lhe pertence: humanista num mundo capitalista, espelho da sua comunidade — jovens afro-britânicos das periferias de Londres –, que se reflecte em muitas vivências espalhadas pelo mundo. O disco termina com o reconhecimento da perseverança da mãe (momento mais emocional evocado pela própria em “Heart Attack”) como a base do “ser” de Dave; e a promessa consciente de se tornar a voz de muitas mais causas urgentes na sociedade (“Survivor’s Guilt”). Juntos pela mudança.