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Texto: ReB Team
Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 30/01/2023

Música que nos prende à tela.

BOOMBOX: “Memórias? Arrepios? Vontade de cantar ou de saltar para dentro do filme? Será que o Google dá isto tudo?”

Texto: ReB Team
Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 30/01/2023

Arranca esta semana o ciclo BOOMBOX no Alvalade Cineclube, que vai trazer para o grande ecrã cinco filmes com ligação à música em quatro sessões diferentes. As exibições acontecem sempre às quintas-feiras (dias 2, 9, 16 e 23 de Fevereiro) pelas 21 horas.

Na programação da sala de cinema lisboeta surgem peças para todos os gostos: da exploração sónica nacional de SOA às coordenadas menos óbvias de When We Are Born e Grandma Lo-fi, passando ainda por nomes que mais facilmente se inserem no imaginário global dos portugueses, como são os casos de Os Doce Bárbaros (sobre Maria Bethânia, Gal Costa, Gilberto Gil e Caetano Veloso) e Moonage Daydream (sobre David Bowie), documentários que retratam a vida nos bastidores de algumas das maiores estrelas da música à escala planetária.

Depois de termos lançado um primeiro olhar a este cartaz no passado dia 10 de Janeiro, o Rimas e Batidas entrou em contacto com o programador do BOOMBOX, Bruno Castro, que aceitou responder-nos a algumas perguntas sobre o impacto que podem ter as obras reunidas neste cartaz.



Qual a ideia estruturante desta programação?

O programa BOOMBOX cumpre duas grandes premissas: dar a ver filmes pouco vistos em tela e criar experiências sonoras na sala de cinema. O que nos interessa, enquanto projecto de programação, está nisto, em encontrar filmes que criam experiências felizes e levá-los à sala de cinema. Há muito que queríamos programar cinema na sua relação com o som e a música, cinema que podemos ouvir tanto ou mais do que ver. A oportunidade são estes cinco filmes sonoros, que são absolutamente invulgares numa sala de cinema, pela dimensão que o som tem.

Quais diriam que são os públicos a que se destina este ciclo?

Qualquer espectador que goste de música e seja curioso pelos sons que nos rodeiam tem um Fevereiro em cheio. Isso pode significar ser excelente para universitários com os amigos e muito feliz para aquela reformada que sempre adorou a Gal Costa. Estamos habituados a ter públicos muito diversos, dependendo do foco em cada programa. E o público é sempre uma surpresa. Neste caso, estamos à espera de muitas idades, muitas motivações, e muita atenção também.

O que vos levou a escolher estes cinco filmes e não outros? Houve algum que gostassem muito de ter neste cartaz mas que, por algum motivo, não fosse possível?

Começando pelo fim: tentámos ter também o Summer of Soul, mas fica para uma oportunidade no futuro. E talvez o Berlin, com o Lou Reed. É impressionante a quantidade de filmes extraordinários sobre música e som que se fazem e nunca chegam às salas comerciais. Esta escolha tenta ser democrática, no sentido em que vai buscar sons e histórias a várias latitudes e estilos. E começa com o SOA, um filme maravilhoso realizado por uma das pessoas mais importantes no que toca a som em Portugal hoje em dia, a Raquel Castro. Na segunda semana, ver o Grandma Lo-fi (e falar com os realizadores) vai ser muito emocional, porque a história daquela velhinha que fazia música electrónica em casa toca qualquer coração. Correu centenas de festivais e possivelmente qualquer pessoa abaixo de 30 anos não sabe que ele existe. Interessaram-nos filmes que tenham densidade emocional para além do tema, e estes cinco cumprem isso em grande.

Na era das plataformas de streaming, como se defende um evento desta natureza?

Precisamente por causa das plataformas de streaming. É também por causa dessa experiência menor que faz sentido insistir em mostrar cinema a sério numa sala a sério. Cada vez mais programar em sala tem a ver com curadoria e com experiência. Só é possível ouvir e ver o David Bowie daquela forma no Moonage Daydream numa sala de cinema. As plataformas de streaming são canais de distribuição que têm o seu lugar, mas felizmente não reproduzem a experiência de ver um filme num cinema. Um programa destes afirma isso a cada minuto, cada som, cada imagem na tela gigante.

Se este ciclo desse origem a uma playlist que fosse além dos artistas já destacados nestas peças, que outros nomes poderíamos encontrar por lá?

Ui… Mum, Sigur Rós, Four Ten, Boards of Canada, Elis Regina, Elza Soares, Brian Eno, Iggy Pop, Talking Heads, Pixies, The Velvet Underground, Steve Reich… As possibilidades são enormes.

Numa época de informação em abundância, o que é que este tipo de cinema pode oferecer a um público habituado a procurar tudo através do Google?

Memórias? Arrepios? Vontade de cantar ou de saltar para dentro do filme? Será que o Google dá isto tudo? Programar cinema, da forma como fazemos, implica uma convicção e fé no trabalho de curadoria. Isso significa que é essa hiper-abundância de informação que abre um espaço de oportunidade para mostrar algo que está perdido nesse mar. Quanto tempo passamos a procurar coisas que depois não vemos ou lemos? Este tipo de cinema é claramente um assalto à confiança alheia. Confiem em quem programa cinema assim.

Pegando numa ideia que se diz ter sido enunciada pelo Frank Zappa, que achava que escrever sobre música era como dançar sobre arquitetura, fazer filmes sobre música não é como fazer pinturas sobre poesia?

Nós não fazemos filmes [risos]. Agora a sério, talvez o cinema sobre música seja mais fácil do que pintar sobre poesia. Pelo menos porque pode usar o próprio som! E essa batota já cria diferença. E depois há aquele problema da música ser uma expressão artística com um alcance tão massivo, de tal forma congregador, que é impossível à imagem em movimento furtar-se a olhar. Se calhar fazer filmes sobre música é como seguir o Osho na sua viagem fake-espiritual. Disclaimer: em Maio teremos um programa sobre como dançar sobre arquitectura, literalmente.

No futuro, podemos esperar mais ciclos como este?

A vontade existe, sim, mas não necessariamente o compromisso. Tentamos programar sem nos fixarmos numa determinada fórmula ou receita, porque isso pode significar converter programação regular em micro-festivais. E nós acreditamos verdadeiramente na descoberta, no trabalho de fundo, em arriscar muitas vezes. Para isso é preciso um espaço de liberdade que, por vezes, não é compatível com repetições. Mas a vontade existe e às vezes…


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