Esta madrugada, Nuno Barreiros, mais conhecido por X-Tense, disponibilizou o primeiro episódio de PABLO, web-série que foi antecipada por dois singles: “Así” e “Bolero”.
Entre humoristas, nomeadamente três membros do grupo Roda Bota Fora (Pedro Durão, Pedro Sousa e Duarte Correia da Silva) e Carlos Pereira (que esteve recentemente em destaque no Público), rappers (Uzzy, Raptruista e Smile) e o seu colaborador de longa data Hype Myke, o autor de Rosa Dragão acentuou o seu lado mais cómico evidenciado em videoclipes para criar uma obra que reflecte sobre a “hipocrisia” nos diferentes quadrantes da indústria musical.
O Rimas e Batidas foi falar com o cérebro deste projecto para saber mais sobre a personagem principal, o formato, o elenco e os “reais vilões” da história.
Vamos começar pelo nome: PABLO. Quem é esta personagem e como é que aparece na tua vida?
Tem vários ângulos de resposta esta pergunta. Quando damos por nós em momentos da vida que lidamos com circunstâncias adversas e sofrimento extremo, isso molda a elasticidade do nosso cérebro, por vezes enloquece-nos. O Pablo é uma postura, uma caricatura “Tarantinesca” de mim mesmo, com todos os traços de personalidade exagerados e sem filtros. É um homem que perdeu tudo, especialmente a vergonha na cara.
Lançaste dois singles e agora um episódio do que se supõe ser uma série no YouTube. Como é que isto se vai desenrolar? Quantos episódios vai ter e com que regularidade vamos poder ver isto?
Não quero revelar demais, mas sim, este é o meu novo formato por uns bons tempos. O que saiu foi a ponta do icebergue, como dizem. Este projecto está em execução desde Setembro de 2018, mal terminei o Rosa Dragão, e todas as faixas lançadas, já tinham o intuito de servir este propósito. Conto que a regularidade seja mensal, é a nossa intenção e vontade, mas, sendo um projecto novo, temo que ainda possamos ter alguns “roadblocks“. Fazendo figas.
Rodeias-te de uma série de humoristas de uma nova geração, mas também do Hype Mike, d’Os Primos e do Uzzy. Como é que chegaste a estas pessoas? Vamos ver mais caras conhecidas nos próximos episódios?
Acho que estas “caixas” podem ser redutoras. Eu vejo no humor uma plataforma de comunicação que permite elaborar qualquer discussão difícil, com um fundo positivo e que crie valor em vez de destruir. Acho que esse humor se tornou imagem de marca. Isso originou uma orgânica em que, por interesse mútuo, se criou uma amizade e ligação com muitos humoristas. Sinto que eles partilham mais dos mesmos problemas que eu do que a maioria dos músicos. Censura de conteúdo, etc. Os Primos são grandes amigos meus e uma escolha óbvia para qualquer projecto da minha autoria. O Uzzy é um artista com uma estética e uma ética muito própria, quis trabalhar com ele e o PABLO pareceu-me uma óptimo oportunidade. Sim, verão muitas mais caras conhecidas e desconhecidas. É uma benção estar rodeado de tanto talento, faz-me sentir pequeno. Mais ainda, isto é. [Risos]
Escreveste no Twitter: “o PABLO não será um projecto de ataque e escárnio gratuito. Todas as histórias têm 2 lados”. Porque é que fizeste questão de salientar isto? E que dois lados são esses?
Sim, na verdade o primeiro episódio era suposto ter três faixas e dar já um pouco desse outro lado, mas só ao executar percebemos que o melhor formato era este e tivemos que improvisar. Eu não quero que a minha música ou o meu sucesso seja a perda do próximo. Não quero que as minhas vitórias sejam as derrotas de ninguém. A verdade é que estou descontente com o estado da indústria musical, das editoras, aos promotores, aos músicos e à música em si. O foco de PABLO está na hipocrisia. O mumble rap é uma hipocrisia, as escolhas de quem faz as listas são hipócritas e eu próprio, tal como outros da minha geração, sou um hipócrita. “Todas as merdas que eu quero e que eu só pude olhar de longe” é a última linha do “Qué Passa”.
Vão ter de aguardar pelo desenrolar da história, mas *spoiler alert* os reais vilões não são Los Mambleros. Espero que haja estômago para lidar com isto porque gostava que o PABLOunificasse um pouco a comunidade acerca deste tópico.
Obviamente, para quem já viu o primeiro episódio, estás a reflectir sobre o actual panorama rap nacional. Isto é tudo inspirado em pessoas reais e em vivências que tiveste na (e com a) indústria?
Lá está. Todos temos circunstâncias. As minhas foram uma bela merda, peço desculpa pelo meu francês, como muitos croissants. [Risos] Não me queixo, acho que tudo tem uma razão de ser. As circunstâncias fizeram-me aprender a produzir, editar, promover, vender, tudo sozinho. Apesar das dores de crescimento, estou grato pela posição em que estou porque tenho um olhar aéreo sobre muita coisa. Eu conheço o negócio da droga desde a matéria-prima ao consumidor. [Risos] Esta indústria maltrata muita gente com talento e eu só apenas um dos tantos que de momento está a desfrutar de um pico ascendente de interesse e ouvintes.
Estou grato, muito grato. Se sou apenas mais um no baile de máscaras em busca de protagonismo, então vou aproveitar e fazer o meu tempo contar para que alguma coisa possa mudar e devolver a arte aos artistas.
O sucesso da série do Carlos Coutinho Vilhena foi, de alguma forma, um impulso para avançares com isto? Pergunto por uma razão muito simples: estiveste muito próximo do projecto, pelo que deu para perceber.
Nim. Eu conheci o Carlos através de um convite para participar no podcast dele. A empatia foi instantânea, revelei-lhe que estava a trabalhar no PABLO e descrevi-lhe, a título de segredo, a ideia. Ele, por sua vez, não me disse um carapau, mas já estava a bulir n’ O Resto da tua Vida. [Risos] Passado um mês ou dois saiu o primeiro episódio e eu adorei o conceito, identifiquei-me bastante. Essa identificação foi recíproca e foi-se formando uma amizade que deu origem a uma série de coisas. A mesma coisa com o João André. Quanto à semelhança de formatos, é uma coincidência feliz. Acho que o que o Carlos fez foi no mínimo brilhante. E há mais um projecto que aguardo, de outro grande Mestre. Estejam atentos!