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Fotografia: Pedro Roque
Publicado a: 01/12/2023

Religião como espectáculo.

William Basinski na Igreja St. George: a Pietà em neón

Fotografia: Pedro Roque
Publicado a: 01/12/2023

Acontecimento. William Basinski. Dois concertos na mesma noite. Pasme-se. Passado sábado, 25 de Novembro, na Igreja St. George, Lisboa, com curadoria da Galeria Zé dos Bois. Raríssimo por estas paragens. Acontecimento na sua dupla significância — transcendência e espectáculo. No músico nova-iorquino, coexistem. Nunca de forma equilibrada.

Entra no altar. Ligeiro gesto corporal. Uma rock star. Estatuto integralmente assumido pelo próprio. Elogio à beleza do lugar. Aparição e os crentes. Planos propositadamente distintos. Os crentes imergem na devoção. A um concerto de Basinski vai-se como a missa no Domingo. A interface social não é de somenos. Antes, pouco tempo depois e, principalmente, durante — as stories do Instagram e os posts convenientemente legendados. Cultivar gosto e alguma erudição não se faz sem exibição. Tempos [pós-]modernos. 

E as luzes! A eterna conjugação entre o som e a imagem. O sublinhado em linha dupla de uma sacralização do espaço. A aparição em tons de néon. As tonalidades da Senhora da Agonia. Basinski, imutável. Distante. Inacessível. E o altar. Distâncias intransponíveis. A realidade é e será sempre aquilo que queremos ver.

Uns devotos aos tons negros, ao arrastado do som, momento curto já próximo do final. Os introspetivos. Existencialistas e metafísicos. Religião. E espectáculo. Ou, simplesmente, religião como espectáculo. Basinski sabe-o. Domina os seus códigos. E nós, crentes. Deixamo-nos seduzir. Guiados. 

A comparação é o mais infrutífero e falacioso dos exercícios. Sabendo–o deveria ser convite à prudência. Basinski nos Jardins Efémeros [2017] está no Olimpo. A sobriedade. A frugalidade. O ecumenismo dos gestos e o momento celebratório inesperado. Elementos de arquivo. Memória viva.

No passado sábado, a alienação. O espectáculo amortalhou circunspecção. Lembrar Debord — “O conceito de espetáculo refere-se a um modo de reprodução da sociedade baseado na reprodução de bens, cada vez mais numerosos e cada vez mais semelhantes na sua variedade. Uma pseudo-vida ilusória que a sociedade capitalista nos impõe.”


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