[TEXTO] Moisés Regalado
Antes da Universal apresentar Valas ao país, o rapper já se tinha destacado como promessa do underground alentejano, ao lado da Matilha 401, mas, numa altura em que a ascensão do hip hop português soava a utopia, o seu nome não seria um dos mais óbvios quando se discutia a sucessão de Boss AC ou dos Mind Da Gap como rappers e músicos profissionais. Daí que Check-In, suposto disco de apresentação, ou, pelo menos, consolidação, possa parecer, para uma pequena mas exigente fatia dos ouvintes, um projecto incompleto ou pouco representativo do potencial de Valas. Talvez por isso, e por mais estranho ou contraditório que isso seja, a facilidade com que se ouve Check-In dificulta o trabalho de o avaliar.
O objectivo de Check-In não é provar que Valas sabe rimar. A aposta de uma editora major no seu talento será prova mais do que suficiente, restando-lhe elevar a fasquia e assumir novos desafios. O artista tentou, parece, destacar-se como MC e intérprete/compositor de música pop em medida iguais. Assim faz pensar a produção, que, embora tenha sido maioritariamente assumida por nomes próximos do hip hop, foi tão polida quanto possível, bem como as temáticas que preenchem a fatia mais larga do disco. A música rap, por definição, não é mais profunda que qualquer outra, e há até quem construa discografias brilhantes sem abandonar o registo freestyle, só que Check-In é leve como a pop é, e não vago como o rap pode ser.
Sentimentos como o amor, seja por uma mulher, pelos “seus” ou pela música, como faz crer “Terapia”, significam, regra geral, mais para quem faz — e para os visados — do que para quem ouve, por muito que o público se identifique, o que acaba por complicar a tarefa de quem assume um guião romântico ou introspectivo. Não há como apontar fraquezas a Valas, à excepção dessa. Temas como “Presente” ou “Alma Velha” têm lugar em qualquer disco ou palco possível e imaginável, mas, num universo tão concorrido e com raízes tão profundas como o da música ligeira, é ingrato tentar sobressair como um dos melhores. Por muito que os “números”, felizmente, continuem a provar o o contrário.
Agora que o rap é um veículo, mais do que aceitável, desejável, certamente que Valas ainda terá espaço para finalmente mostrar a sua evolução como rapper, sem os limites impostos pelo “formato canção”, não significando isso que o estilo livre ou as questões mundanas voltem a ocupar-lhe a maior parte da escrita. Mas, agora que provou ser capaz de trabalhar no núcleo do mercado sem perder o foco, começa a ser tempo de conquistar o público com o seu rap, e não só com a sua música. Porque Valas, sendo quem é, e vindo de onde vem, nunca terá deixado de afiar e melhorar a sua escrita, a sua métrica e a sua entrega, atributos fundamentais por que sempre se regeu e que “El Dorado”, faixa introdutória, provou estarem em dia.
Ainda assim, a proposta contida em Check-In, clássica ou não, só pode ser considerada promissora e funciona para que Valas consolide as suas diferentes valências. E a viagem, diz-nos o título, ainda nem sequer começou. Esquecendo as óbvias diferenças, sobretudo orçamentais, entre este disco, a mixtape da Matilha 401 ou o álbum Sementes de Pedra, chega a ser óbvio que Check-In é, como qualquer um dos seus antecessores, parte do verdadeiro início do percurso de Valas, que só agora, graças ao novo álbum, conseguiu reunir todas as condições para, finalmente, projectar e apresentar o seu melhor.