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Teyana Taylor

The Album

G.O.O.D. Music / Def Jam / 2020

Texto de Rita Matias dos Santos

Publicado a: 09/09/2020

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Teyana Taylor está longe de ser desconhecida: encontramo-la em passarelas, coreografias, telas, videoclipes e, mais importante, músicas. Em 2014, lançou VII sob a alçada da Def Jam Recordings e da G.O.O.D. Music, a mesma casa em que, em 2018, editou K.T.S.E.. O segundo álbum de estúdio da artista nova-iorquina revelou-se intenso e complexo, mas também limitador aos olhos da criatividade musical da mesma. É, então, em 2020 que Teyana decide ultrapassar as frustrações e desilusões do passado e “corrigir o que não funcionou da primeira vez” com The Album, colocado cá fora no passado mês de Junho. 

A data de lançamento coincidiu com as festividades do Juneteenth, realçando o lado activista da cantora. Contrariamente ao seu antecessor, The Album tem mais de uma hora dividida em 23 faixas encaixadas em cinco secções distintas (A, L, B, U e M) que recontextualizam o r&b contemporâneo, numa simbiose geracional através de colaborações e samples da década de ‘90 e do início deste milénio. Aspirando um maior controlo criativo sobre o seu trabalho, Taylor conta com a presença de lendas como Erykah Badu, Lauryn Hill e Missy Elliott e estrelas do presente como Kehlani, Quavo, Future, Big Sean e DaVido.

Em The Album, Taylor compila diversas temáticas – ainda que algumas sejam naturais do género em que se exprime – que relatam uma jornada pessoal através de um expurgar doseado de emoções. Apesar da componente sexual ser uma referência constante, assim como as relações amorosas, entre elas sublinha-se fortemente a questão da maternidade. “Intro”, para além de ser a primeira faixa do álbum e da secção A, retrata o momento do nascimento de Junie, a sua primeira filha, cujo parto aconteceu na casa de banho pelas mãos de Iman Shumpert, parceiro de Taylor e jogador profissional de basquetebol. Acompanhando a chamada telefónica que dá conta da história incomum, o beat inicial, que faz alusão ao batimento cardíaco, e que rapidamente é apanhado pela melodia angelical de um piano, transforma-se no mood central da composição do álbum.

Junie é igualmente uma das vozes na lista das colaborações deste álbum, juntamente com Rick Ross. “Come Back To Me” dá início à jornada amorosa que Taylor retrata e racionaliza: “Everything worth my heart and soul/ I’ma give it up and let it go/ Mama said, ‘If it’s really yours/ Boy, you’ll come back to me’”. Como Junie, outro nome que parece estranho na lista de créditos de um disco é o de Iman Shumpert, em “Wake Up Love”. Entre ritmos certos e sedutores, que se juntam à chamada sensual de atenção da voz de Teyana, há espaço ainda para uma referência a Indie.Arie entre pedidos de reconforto e de construção de algo maior: “I’m like India when I’m not / fixed on you / Know how to keep me sane, it’s you”. 

Taylor justificou as suas colaborações como uma vontade de homenagear artistas r&b: por exemplo, “Lowkey, para além de ter Erykah Badu presente em alguns versos, é uma homenagem a “Next Lifetime”.

Os prazeres da carne, sem nunca se tornarem fugazes ao longo do álbum, intensificam-se na secção L, em “1800-One-Night” e em “Morning”: o carnal e o íntimo são sensações fortemente retratadas. Na última, Kehlani junta-se a Taylor para relatar explicitamente a experiência sensorial de uma relação entre duas mulheres. A associação geracional defendida pela artista neste trabalho vinca-se em “Boomin”, na qual Future e Missy Elliott se aliam à nova-iorquina, usando o sample “808” de Blaque, à qual se segue “69” com a mesma volúpia e ousadia das precedentes.

Em “Let’s Build”, Quavo sai da sua zona de conforto, deixando o trap de lado para se converter à sensualidade que o r&b consegue ter, e à qual Taylor acrescenta o seu tom romântico e esperançoso. DaVido acompanha-a no refrão de “Killa”, que concede o desfecho à temática sexual, para celebrar o empoderamento feminino e, então, iniciar a secção B com “Bad”, que a nível musical atira-se para o reggae. Ainda no enunciado da valorização da mulher, “Wrong Bitch” visa sublinhar a independência emocional perante qualquer homem que não seja digno de amor. Mas a recaída é fácil e inevitável em “Shoot It Up”. Ao lado de Big Sean, as vulnerabilidades e as necessidades tornam-se mais salientes e ainda mais exigentes em “Bare Wit Me”.



Tal como foi previamente dito, este álbum trata de corrigir coisas que não funcionaram à primeira e, em “Lose Each Other”, que inicia a penúltima secção, Taylor prende-se à melancolia de um sentimento ingerível: “Baby, we don’t have to lose each other/ I’m the only one that knows you/ What am I supposed to do if I can’t hit you when I need you?/ Just ‘cause I can’t handle love don’t mean I wanna leave you”.

Apesar de todo o hedonismo, o lado emocional começa a ganhar uma maior importância, principalmente em “Concrete”. A faixa não desvaloriza o que o físico tem de íntimo e importante, mas encontra por objectivo o desenvolvimento emocional, a dois, como um motor de uma relação que só assim se pode solidificar. 

Ainda numa tentativa de recuperar o irrecuperável de um passado que já lá vai, a esperança é algo presente em “Still”: “Just the thought of you/ Makes me weak in my knees, baby/ No matter what you do/ No matter what you do/ I still believe, still believe/ We have more to see, more to us”. Contudo, a sujeição a paixões arrebatadoras, que ultrapassam o superficial, tem aspetos emocionais que nos roubam toda a ilusão de controlo: “Got no control still/ Over you/ I can’t fight back, I don’t want to, babe/ I can’t fight back, babe/ ‘Cause I’m always too late/ Chillin’ with some shit from the past/ Tryna get what I never had”. E, mesmo quando um ciclo se crê terminado, a ressaca é intoxicante, quase que viciante, como se a dor do fim fosse as cinzas de um novo princípio, ou uma mera ilusão de trauma partilhado, tal como descreve em “Ever Ever”: “And I question the things I do for you/ Like if you would or you wouldn’t do the same/ There’s really no difference between bein’ in love and bein’ too dismissive / But I’d do it all over again, if I had to, in one instant”.

Mas tudo leva à questão fulcral da secção final, sublinhada em “Try Again”: “I said things that I don’t mean/ You did things you can’t take back/ Maybe we should let this go/ Or maybe we should try again?”. Porque, no final de contas, o que Teyana nos leva a crer é que não existem novos princípios, apenas um debate interno entre o racional e o irracional, de onde só restam consequências: “Now, I ain’t tryna erase history/ We’ll be enemies with memories”.

Por momentos, a frustração leva a melhor no embate com as expectativas, criando fogos momentâneos que desvalorizam todo o esforço feito, da mesma maneira que “Friends” realça as dúvidas, os “ses”: “Sometimes, I wish that I never let you hit this/ Sometimes, I wish that I let you finish your hit list/ You fold under pressure, get your shit together/ You want me to settle, but I cannot settle/ ‘Cause I’m too rich to settle, you gotta do better, babe”. Mas a vantagem de uma quebra é a reconciliação, a sensualidade do conflito, a cedência de partes que levam a “How You Want It”, que conta com os versos sugestivos de King Combs. 

A jornada acaba com  “Made it” e “We Got Love”, que sampla a faixa homónima dos The Younghearts. Um fim celebratório que recapitula todo o percurso de Taylor enquanto mulher, congratulando-se do seu esforço e sentido de satisfação. Conta com o especial interlúdio de Lauryn Hill: “Happiness, you know, um/ A lot of people define success differently/ You know, for me, you can have everything/ You can have all the money in the world/ But if it’s not enjoyable, if it’s not sustainable, know what I mean?/ If you can’t be a person of integrity while having all of these things/ What does it matter? What does it mean?/ The value is internal/ Your value is internal”.

Numa retrospectiva de cinco capítulos, Teyana Taylor partilha as suas frustrações e desilusões, experiências e luxúria. The Album é um trabalho que confirma o seu lugar à mesa com os grandes, tanto em termos de composição como de interpretação. À terceira é de vez, fica mais uma vez assegurado…


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