Talvez a mais bela alquimia de 2021. Honest Labour revelou-se, a cada escuta, um imenso mundo debaixo da superfície das coisas. Um daqueles discos que alcança o pequeno grande milagre de se confundir com o nosso quotidiano, fazendo dele parte. Essa capacidade sinestésica que o duo de Manchester detém ficou bem patente num álbum que certamente se tornará um clássico desta época.

Do som e da palavra, os Space Afrika encontraram uma narrativa fragmentária, de espírito irremediavelmente urbano e melancólico. Torna-se meio inevitável não traçar um paralelo sociopolítico com os tempos actuais; afinal, a carga emocional é latente, reconhecível a que com ela se cruza por tão real que é. 

Enquanto espécie de instalação sonora, Honest Labour move-se por várias dimensões e possibilidades. Cada detalhe tem direito ao seu lugar – e dessa composição consciente e livre, nasce, acima de tudo, uma vibração balsâmica que percorre o disco ponta a ponta. Embora a natureza downtempo (sem qualquer prejuízo na escolha da expressão) seja estrutural, a visão futurista dos Space Afrika cultiva o nervo suficiente para, tema atrás de tema, existir espaço para o fascínio.

Um requiem imaginário para ruas vazias e as histórias que dela surgiram e surgirão. O elemento temporal em Honest Labour é, então, efectivamente abstracto, e só assim poderia ser. Um disco do seu tempo, sim, mas capaz de dele se libertar. E a existir mensagem subliminar nestas peças seria, por ventura, essa mesma: libertação. Se já na mixtape hybtwibt essa seria uma proposta a alcançar, aqui fica claro a intenção do duo em abrir caminho à (re)descoberta individual – e colectiva, claro. No fundo, tão essencial quanto isso.